- ID
- 1910941
- Banca
- FGV
- Órgão
- FGV
- Ano
- 2015
- Provas
- Disciplina
- Literatura
- Assuntos
(...) Um dia, passado muito tempo, Pedro Bala ia com o Sem-Pernas pelas ruas. Entraram numa igreja da Piedade, gostavam de ver as coisas de ouro, mesmo era fácil bater uma bolsa de uma senhora que rezasse. Mas não havia nenhuma senhora na igreja àquela hora. Somente um grupo de meninos pobres e um capuchinho que lhes ensinava catecismo.
— É Pirulito... — disse Sem-Pernas.
Pedro Bala ficou olhando. Encolheu os ombros:
— Que adianta?
Sem-Pernas olhou:
— Não dá de comer...
— Um dia vai ser padre também. Tem que ser é tudo junto.
Sem-Pernas disse:
— A bondade não basta.
Completou:
— Só o ódio...
Pirulito não os via. Com uma paciência e uma bondade extremas ensinava às crianças buliçosas as lições de catecismo. Os dois Capitães da Areia saíram balançando a cabeça. Pedro Bala botou a mão no ombro do Sem-Pernas.
— Nem o ódio, nem a bondade. Só a luta. A voz bondosa de Pirulito atravessa a igreja.
A voz de ódio do Sem-Pernas estava junto de Pedro Bala. Mas ele não ouvia nenhuma. Ouvia era a voz de João de Adão, o doqueiro, a voz de seu pai morrendo na luta.
Jorge Amado, Capitães da Areia.
Comparando-se as características de Capitães da Areia (1937), bastante visíveis no excerto, às características mais notórias de Macunaíma (1928), pode-se identificar corretamente uma transformação ocorrida na transição do primeiro Modernismo, da década de 1920, ao qual pertence Macunaíma, para a segunda fase modernista, posterior a 1930, período em que surge Capitães da Areia. Nessa transição, deu-se a passagem de uma