SóProvas


ID
2171926
Banca
MPE-PR
Órgão
MPE-PR
Ano
2016
Provas
Disciplina
Filosofia do Direito

Sobre a aplicação do direito aos hard cases (casos difíceis) e considerando a defendida distinção entre o discurso de fundamentação da norma e o discurso de aplicação da norma, analise a seguinte hipótese: “‘A’ promete ir ao aniversário de Pedro, mas, ao mesmo tempo, seu amigo João precisa de ajuda (essa é a situação S). Duas normas são aplicáveis: N1, promessas devem ser cumpridas; N2, amigos em necessidade devem ser ajudados. Se aplicarmos essas normas a S, chegaremos a duas normas singulares ou individuais que podem ser aplicadas ao mesmo tempo à situação S. Assim, o caso pode ter duas soluções: I - “A” tem obrigação de ir à festa de Pedro; II – “A” tem obrigação de ajudar João. II possui uma estrutura mais complexa que I. As considerações levam a duas conclusões: (1) a aplicação de normas também pode ser considerada justificação de normas; (2) o problema no presente caso não está na aplicação de N1 e N2, mas, sim, na relação de aplicação de ambas, pois vistas individualmente não oferecem dificuldades. Trata-se, pois, de um ‘problema de colisão’, resolvida pela teoria da argumentação jurídica por três hipóteses: (1) a colisão permanece não resolvida, é o chamado ‘modelo trágico’; (2) ambas as obrigações perdem a validade, é o modelo oposto ao trágico; (3) apenas uma das obrigações permanece válida, este considerado pela teoria o modelo correto”.

Levando em conta as críticas formuladas ao raciocínio acima, avalie as afirmações abaixo e assinale a alternativa correta:

I - Pensar que é o discurso de aplicação que, isoladamente, responderá à questão é tão equivocado quanto pensar que tudo se resume ao discurso de justificação (validade) ou que, na medida que se está diante de uma “colisão” de normas (ou princípios), apenas uma permanece válida.

II - As normas não se sustentam em si e por si, pois não abarcam as diversas hipóteses de aplicação tais como: graus de amizade, o sentido de “amigo”, o grau de assistência requerido pelo amigo, a importância da festa – aniversário – que Pedro ofereceu, qual o sentido da obrigação de cumprir promessas, o que são promessas, e assim por diante.

III - As singularidades que conformam a resposta estão dadas a partir da pré-compreensão de “A”, sendo que essa pré-compreensão é condição da possibilidade da resposta que “A” dará ao problema, isto é, da decisão que tomará: ajudar o amigo ou ir à festa. 

IV - Não é possível, a partir do paradigma da intersubjetividade, isolar nem a situação concreta, sobre a qual serão construídos discursos de aplicação, nem discursos de justificação prévia, independizados das particularidades da situação concreta.

V - É inadequado afirmar que se estaria diante de colisão de princípios ou normas (promessas devem ser cumpridas versus amigos devem ser ajudados), pois hermeneuticamente não haverá essa colisão, uma vez que a reconstrução integrativa, o modelo prático de ser-no-mundo e a consciência dos efeitos da história é que apontarão para a resposta, que pode até ser – dependendo do caso concreto – a mesma da teoria da argumentação, mas também pode dar azo a outra resposta, sem que se altere a validade de qualquer das duas normas.

Alternativas
Comentários
  • Pessoal, vamos indicar para comentário!

  • acertei, porque só achei a II estranha e não havia alternativa para sua exclusão. 

  • Somente na sorte para acertar.

  • Depois de retorsões cognitivas, do questionamento da minha própria existência e de devaneios introspectivos ... Acertei a respectiva questão.  

  • Doutrina:

    Referências Bibliográficas: 

    DUTRA, Delamar José Volpato. A Teoria Discursiva da Aplicação do Direito: O modelo de Habermas. In: Veritas. Vol. 51, n.1. Porto Alegre, março 2006. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/veritas/article/view/1 880/1401. Acesso em: 06 jul. 2011.

    DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007. ________. O Império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. ________. Uma Questão de Princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 

    GUEST, Stephen. Ronald Dworkin. Rio de Janeiro: Elsevier Editora toda. (Campus jurídico), 2010. GÜNTHER, Klaus. Teoria da Argumentação no Direito e na Moral: justificação e aplicação. Tradução de Cláudio Molz. São Paulo: Landy Editora, 2004. 

    HARE, Richard. A Linguagem da Moral. São Paulo: Martins Editora, 1996.

    MARTINS, Argemiro Cardoso Moreira; OLIVEIRA, Cláudio Ladeira. A Contribuição de Klaus Günther ao debate acerca da distinção entre regras e princípios. In: Revista Direito GV. Vol. 2, n. 1. pp.241-254, jan.-jun. 2006. Disponível em: http://www.di reitogv.com.br/subportais/publica%C3%A7%C3%B5e/RDGV_03_p241_2 54.pdf. Acesso em: 06 jul. 2011.

    Resumo: introduziremos a contribuição de Klaus Günther à Filosofia do Direito contemporânea, situando-a relativamente às posições de Ronald Dworkin. Primeiramente, apresentaremos a diferença entre discursos de fundamentação e discursos de aplicação de normas, caracterizando-os. Após, demonstraremos as conseqüências de tal distinção para o debate sobre princípios e regras. Ao final, proporemos uma crítica ao conceito de hard case de Dworkin a partir da teoria de Günther.

  • eu pensei um pouco e achei que todas eram razoavelmente corretas. logo, marquei todas corretas.

  • A questão em comento demanda bastante refino no conhecimento de Hermenêutica, princípios, ponderação de interesses, casos difíceis.

    Vamos analisar cada uma das assertivas.

    A assertiva I está CORRETA.

    Com efeito, não é o discurso de aplicação que, isoladamente, responderá a questão. Isto é um erro.

    Também é um erro crer que tudo se resume ao discurso de justificação.

    Ainda é preciso dizer que, de fato, na colisão de princípios, também não é escorreito pensar que usamos a regra do “tudo ou nada"  e só uma regra é válida, sendo necessária a harmonização de interesses.

    A assertiva II está CORRETA.

    De fato, o sentido da norma não se esgota em si mesma. Há muitas possibilidades de sentidos na exegese de uma norma. Dizer que é amigo de alguém traz, consigo, mais indagações: qual o grau de amizade? Trata-se de uma amizade que gera hipótese de renúncia a outro compromisso? Há como conjugar normas contraditórias? É possível cumprir todas as promessas? As possibilidades semânticas são infinitas.

    A assertiva III está CORRETA.

    De fato, a pré-compreensão traz sentidos prévios que condicionam a forma como normas são lidas e interpretadas. A pré-compreensão é crucial para escolha, dentre normas contraditórias, sobre qual será seguida.

    A assertiva IV está CORRETA.

    De certa forma, repete a linha de raciocínio da assertiva III. Nem os discursos de justificação, nem os discursos de aplicação podem ser isolados. Particularidades do caso concreto devem ser levadas em conta.

    A assertiva V está CORRETA.

    É possível equacionar normas sem que uma norma anule a validade da outra norma. Não há, de fato, uma colisão de normas. Há outros elementos informativos para dirimir a questão.

    Todas as assertivas estão CORRETAS.

    Logo, é possível analisar todas as alternativas da questão.

    LETRA A- INCORRETA. Todas as assertivas estão corretas.

    LETRA B- INCORRETA. Todas as assertivas estão corretas.

    LETRA C- INCORRETA. Todas as assertivas estão corretas.

    LETRA D- INCORRETA. Todas as assertivas estão corretas.

    LETRA E- CORRETA. Todas as assertivas estão corretas.

    GABARITO DO PROFESSOR: LETRA E