A questão versa
sobre responsabilização de gestores públicos à luz do
Código Civil, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei
n.º 4.657/1942), Lei de Improbidade Administrativa e Constituição Federal de
1988.
Vamos
então analisar cada alternativa.
A) INCORRETA. De início, cumpre esclarecer que um
relatório de auditoria interna no âmbito de um órgão público municipal
possui natureza administrativa. Dito isso, caso o
relatório de auditoria aponte irregularidades na gestão de recursos públicos, o
referido órgão poderá instaurar processo administrativo com
vistas à responsabilização e/ou ressarcimento de dano ao erário (caso haja),
onde será respeitado o contraditório e à ampla defesa.
Ademais, por exemplo,
na hipótese de dano ao erário e caso as medidas administrativas adotas pelo
órgão não sejam suficientes para a elisão do dano, e caso subsistam os
pressupostos para instauração de Tomada de Contas Especial (TCE), conforme
disposto em regulamento do respectivo Tribunal de Contas (TC) competente, o
órgão deverá instaurar TCE e encaminhar, posteriormente, ao TC competente.
Ressalta-se ainda
que, mesmo sem a ocorrência de dano, quando a conduta dos gestores públicos
puder resultar em sanção pelo Tribunal de Contas, entende-se ser possível
que a Auditoria Interna do referido Órgão Público encaminhe o
relatório para o TC como uma representação, a fim de que a Corte de Contas adote as providências que julgar cabíveis.
Além disso, na esfera cível, a partir do relatório de auditoria
interna, o Ministério Público competente poderá ser acionado, caso hajam
elementos para uma ajuizar uma ação de improbidade
administrativa.
Dito isso, a questão
está incorreta, pois, na esfera cível e administrativa, para fins de
responsabilização, condutas culposas também são
puníveis.
Vejamos
o que diz o art. 28 da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro
(LINDB):
“Art. 28. O agente
público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas
em caso de dolo ou erro grosseiro."
Logo, alternativa incorreta.
B) INCORRETA. A responsabilidade do agente público é SUBJETIVA, logo, além do dano jurídico e
nexo causal, faz-se necessária a análise de culpabilidade (Dolo ou
Culpa). Lembrando que, com a redação do art. 28, no caso de
condutas culposas, exigiu-se a comprovação de erro
grosseiro do agente público.
Cumpre ressaltar ainda
que uma conduta omissiva, caso ela seja considerada apta a
evitar a produção do dano jurídico, é entendida como negligência, uma conduta culposa [1].
Nessa
direção, entende-se negligência como a omissão de conduta considerada apta a
evitar a produção do dano, vale dizer, a inobservância de normas que requerem
atuação atenta e cuidadosa. (Tepedino, Gustavo; Terra, Aline de Miranda
Valverde; Guedes, Gisela Sampaio da Cruz. Fundamentos do Direito Civil (p.
206). Forense. Edição do Kindle.)
Logo, alternativa incorreta.
C) INCORRETA. Conforme exposto na alternativa
anterior, a responsabilidade do agente público é
SUBJETIVA, logo, além do dano jurídico e nexo causal, faz-se necessária a análise de culpabilidade (Dolo ou Culpa).
D) CORRETA. Conforme o caput do art. 28 da LINDB,
o agente público somente responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões
técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.
Já os arts. 9º, 10 e
11 da Lei de Improbidade Administrativa assim versaram:
“Art. 9° Constitui
ato de improbidade administrativa importando enriquecimento
ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em
razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas
entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:
Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa
lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda
patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou
haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
Art. 11. Constitui
ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e
lealdade às instituições, e notadamente:"
Além disso, para fins de análise de culpabilidade por Tribunais de Contas, transcreve-se
abaixo trechos da Lei Orgânica do TCU:
“Art. 16.
As contas serão julgadas:
I - regulares, quando
expressarem, de forma clara e objetiva, a exatidão dos demonstrativos
contábeis, a legalidade, a legitimidade e a economicidade dos atos de gestão do
responsável;
II - regulares com ressalva, quando evidenciarem impropriedade ou
qualquer outra falta de natureza formal de que não resulte dano ao Erário;
III - irregulares,
quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências:
a) omissão no dever
de prestar contas;
b) prática de ato de
gestão ilegal, ilegítimo, antieconômico, ou infração à norma legal ou
regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou
patrimonial;
c) dano ao Erário
decorrente de ato de gestão ilegítimo ao antieconômico;
d) desfalque ou
desvio de dinheiros, bens ou valores públicos.
(...)
Art. 58. O Tribunal poderá aplicar multa de Cr$
42.000.000,00 (quarenta e dois milhões de cruzeiros), ou valor equivalente em
outra moeda que venha a ser adotada como moeda nacional, aos responsáveis por:
I - contas julgadas
irregulares de que não resulte débito, nos termos do parágrafo único do art. 19
desta Lei;
II - ato praticado com grave infração à
norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial;
III - ato de gestão ilegítimo ou
antieconômico de que resulte injustificado dano ao Erário;
IV - não atendimento,
no prazo fixado, sem causa justificada, a diligência do Relator ou a decisão do
Tribunal;
V - obstrução ao
livre exercício das inspeções e auditorias determinadas;
VI - sonegação de
processo, documento ou informação, em inspeções ou auditorias realizadas pelo
Tribunal;
VII - reincidência no
descumprimento de determinação do Tribunal.
(...)
Art. 60. Sem prejuízo
das sanções previstas na seção anterior e das penalidades administrativas,
aplicáveis pelas autoridades competentes, por irregularidades constatadas pelo
Tribunal de Contas da União, sempre que este, por
maioria absoluta de seus membros, considerar grave a infração cometida, o
responsável ficará inabilitado, por um período que variará de cinco a oito
anos, para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança no
âmbito da Administração Pública."
Pessoal, de acordo
com enunciado da alternativa, a irregularidade identificada
na auditoria seria meramente formal, não possuiria reflexo financeiro ou
patrimonial, tampouco teria causado prejuízo ao erário, ao contratado, a
terceiros ou ao interesse público.
Logo, conforme
excertos de legislação transcritos acima, apesar da irregularidade, sendo
essa MERAMENTE FORMAL, sem reflexo financeiro ou patrimonial, e que não
causou prejuízo ao erário, ao contratado, a terceiros ou ao interesse público,
não há de se falar em responsabilização pessoal do agente, seja
na esfera administrativa, cível ou ainda na seara penal.
Em breve síntese,
conforme ensinamentos de Tepedino, Terra e Guedes (2021) [1], essa lesão
jurídica, por ser meramente formal, não seria um interesse jurídico
digno de tutela, por conseguinte, não se enquadrando com o
conceito normativo de Dano.
Desse
modo, ausente o Dano, não há de se falar em
responsabilização.
Logo, este é o nosso gabarito.
E) INCORRETA. Cumpre destacar
que as esferas cível, administrativa e
penal são independentes. Logo, a desaprovação do relatório de auditoria
interna pelo Tribunal de Contas não
impede uma possível sanção cível e penal.
Alternativa errada.
Adicionalmente, em
relação à independência da responsabilidade civil e criminal, cumpre fazer um
seguinte adendo, o Código Civil Brasileiro assim dispõe:
“Art. 935. A
responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar
mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal."
Fonte:
[1] TEPEDINO,
Gustavo; Terra, Aline de Miranda Valverde; Guedes, Gisela Sampaio da
Cruz. Fundamentos do Direito Civil, volume 4. Forense, 2021.
Edição do Kindle.
Gabarito do Professor: Letra D.