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GABARITO: LETRA E
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) previu, de forma expressa, que os conselhos nacional, estaduais e municipais da criança e do adolescente devem assegurar a participação popular paritária por meio de organizações representativas.
Ocorreu, contudo, que o Presidente da República editou decretos que alteram a composição e a forma de escolha dos membros do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
Houve uma redução no número de assentos no conselho e, ainda, se possibilitou a destituição desmotivada de todos os atuais membros, previamente eleitos por processo eleitoral legítimo e com mandato ainda em vigor.
O STF, em sede cautelar, entendeu que as novas regras que disciplinam o funcionamento do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente - Conanda, a pretexto de regular, frustram a participação das entidades da sociedade civil na formulação de políticas públicas e no controle da sua execução, como exigido pela Constituição. Tais regras colocam em risco a proteção integral e prioritária da infância e da juventude (art. 227, caput e §7º, e art. 204, II, CF).
Por outro lado, foi mantida a validade da norma que confere ao presidente do Conanda voto de qualidade em caso de empate e a que impede a recondução de representantes da sociedade civil. De acordo com o relator, não ficou demonstrada, nesse caso, a conexão entre as normas e a fragilização da participação da sociedade civil.
- (...). 1. Importância de evitar os riscos do constitucionalismo abusivo: prática que promove a interpretação ou a alteração do ordenamento jurídico, de forma a concentrar poderes no Chefe do Executivo e a desabilitar agentes que exercem controle sobre a sua atuação. Instrumento associado, na ordem internacional, ao retrocesso democrático e à violação a direitos fundamentais. 2. A estruturação da administração pública federal insere-se na competência discricionária do Chefe do Executivo federal. Entretanto, essa competência encontra limites na Constituição e nas leis e deve respeitá-las. 3. As novas regras que disciplinam o funcionamento do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente - Conanda, a pretexto de regular, frustram a participação das entidades da sociedade civil na formulação de políticas públicas e no controle da sua execução, como exigido pela Constituição. Tais regras colocam em risco a proteção integral e prioritária da infância e da juventude (art. 227, caput e §7º, e art. 204, II, CF). 4. Destituição imotivada dos membros do Conanda, no curso dos seus mandatos. Ato que impediu o adequado funcionamento do Conselho, por falta de membros. Comportamento que, se admitido, possibilitaria o comprometimento das funções exercidas pelo órgão, dentre as quais se encontra o controle de execução de políticas públicas. (...) STF. Plenário. ADPF 622/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 27/2/2021 (Info 1007).
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A respeito da alternativa A (que foi a mais assinalada até aqui):
LEI Nº 1697, DE 22 DE AGOSTO DE 1990.
REGULA O CONSELHO ESTADUAL DE DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Art. 4º - O CEDCA, vinculado ao Gabinete Civil da Governadoria do Estado do Rio de Janeiro, será constituído por 20 (vinte) membros efetivos e respectivos suplentes indicados paritariamente, conforme o parágrafo único do art. 51 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição do Estado do Rio de Janeiro.
Art. 51 dos Atos das Disposições Transitórias da CE/RJ - Fica criado o Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente, como órgãos normativo, consultivo, deliberativo e controlador da política integrada de assistência à infância e à juventude.
Parágrafo único - A lei disporá sobre a organização, composição e funcionamento do Conselho, garantindo a participação de representantes do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, órgãos públicos encarregados da execução da política de atendimento à infância e à juventude, assim como, em igual número, de representantes de organizações populares de defesa dos direitos da criança e do adolescente, legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
No entanto, o STF apreciou a constitucionalidade desse dispositivo e extirpou o Poder Judiciário da participação do aludido Conselho. Como o enunciado ressalvou a jurisprudência (e não cobrou apenas a literalidade da lei), alternativa incorreta. Veja-se:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 51 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. CONSELHO ESTADUAL DE DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. (...) 3. Inconstitucionalidade da expressão “Poder Judiciário”, porquanto a participação de membro do Poder Judicante em Conselho administrativo tem a potencialidade de quebrantar a necessária garantia de imparcialidade do julgador. 4. Ação que se julga parcialmente procedente para: a) conferir interpretação conforme à Constituição ao parágrafo único do art. 51 do ADCT da Constituição do Estado do Rio de Janeiro a fim de assentar que a participação do Ministério Público no Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente deve se dar na condição de membro convidado sem direito a voto; b) declarar a inconstitucionalidade da expressão “Poder Judiciário” (ADI 3463, Relator(a): AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 27/10/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-110 DIVULG 05-06-2012 PUBLIC 06-06-2012)
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A questão em comento requer
conhecimento de julgado do STF exposto no Informativo 1007:
“ Conselho Nacional da Criança e
do Adolescente e Decreto 10.003/2019 – ADPF 622/DF
Tese Fixada:
“É inconstitucional norma que, a
pretexto de regulamentar, dificulta a participação da sociedade civil em
conselhos deliberativos".
Resumo:
São incompatíveis com a
Constituição Federal (CF) as regras previstas no Decreto 10.003/2019, que, a
pretexto de regular o funcionamento do Conselho Nacional da Criança e do
Adolescente (Conanda), frustram a participação das entidades da sociedade civil
na formulação e no controle da execução de políticas públicas em favor de
crianças e adolescentes. Não bastasse isso, essas normas violam o princípio da
legalidade.
Tais regras contrariam norma
constitucional expressa, que exige a participação, e colocam em risco a
proteção integral e prioritária da infância e da juventude (CF, art. 204, II,
c/c o art. 227, § 7º) (1). Vale, ainda, esclarecer que a Lei 8.242/1991
assegura a paridade na representação do Poder Público e da sociedade civil no
Conanda, bem assim entrega ao próprio Conselho a atribuição de dispor sobre seu
funcionamento, nela incluídos os critérios de escolha de seu presidente e a
seleção dos representantes das entidades da sociedade civil.
De fato, as alterações sugerem
que, diante da impossibilidade, constitucional e legal, de rejeitar ou reduzir
a participação das mencionadas entidades, foi editado o Decreto 10.003/2019,
que, na prática, esvazia e inviabiliza essa atuação. Elas acabam por conferir
ao Poder Executivo o controle da composição e das decisões do Conanda, a
neutralizar o órgão como instância crítica de controle. Ademais, o decreto
impugnado ofende o princípio da legalidade ao desrespeitar as normas que regem
o Conselho e, ao procurar modificar o funcionamento do Conanda mediante
decreto, quando necessário lei, exclui a presença do Congresso Nacional em
debate de extrema relevância para o País.
Na espécie, cuida-se de arguição
de descumprimento de preceito fundamental em face do Decreto 10.003/2019, que
promoveu alterações no Decreto 9.579/2018, relativas à constituição e ao
funcionamento do Conanda, e destituiu seus membros no curso dos mandatos.
O Plenário, por maioria,
ratificou a cautelar anteriormente concedida e, no mérito, julgou procedente,
em parte, o pedido formulado na ação para declarar a inconstitucionalidade: (i)
dos arts. 79; 80, caput e § 3º; e 81 do Decreto 9.579/2018, com a redação dada
pelo Decreto 10.003/2019 (2); bem como (ii) do art. 2º do Decreto 10.003/2019
(3). Em razão disso, restabeleceu: (i) o mandato dos antigos conselheiros até o
seu termo final; (ii) a eleição dos representantes das entidades da sociedade
civil em assembleia específica, disciplinada pelo Regimento Interno do Conanda
(Resolução 127/2018); (iii) a realização de reuniões mensais pelo órgão; (iv) o
custeio do deslocamento dos conselheiros que não residem no Distrito Federal; e
(v) a eleição do Presidente do Conselho por seus pares, na forma prevista em
seu Regimento Interno. Igualmente em votação majoritária, o colegiado deixou de
acolher a pretensão deduzida no tocante: (i) à redução paritária do número de
representantes do Poder Público e da sociedade civil, que, contudo, valerá
apenas a partir do início dos novos mandatos; (ii) ao voto de qualidade do
presidente do Conanda, critério aparentemente razoável de solução de impasse;
(iii) à impossibilidade de recondução de representantes da sociedade civil.
Isso porque restabelecidos os demais preceitos, não ficou demonstrada a conexão
entre os dispositivos correspondentes e a fragilização da participação da
sociedade civil. Por fim, advertiu que o reconhecimento da
inconstitucionalidade da redação dada — pelo Decreto 10.003/2019 — ao art. 79
do Decreto 9.579/2018 não implica repristinação do texto original de seu § 3º
(4). Vencido o ministro Marco Aurélio.
(1) CF: “Art. 204. As ações
governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do
orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e
organizadas com base nas seguintes diretrizes: (…) II – participação da
população, por meio de organizações representativas, na formulação das
políticas e no controle das ações em todos os níveis. (…) Art. 227. É dever da
família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao
jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,
à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo
de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão. (…) § 7º No atendimento dos direitos da criança e do adolescente
levar-se- á em consideração o disposto no art. 204."
(2) Decreto 9.579/2018: “Art. 79.
O regulamento do processo seletivo das entidades referidas no inciso VII do
caput do art. 78 será elaborado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos e divulgado por meio de edital público com antecedência mínima
de noventa dias da data prevista para a posse dos membros do Conanda. Art. 80.
O Conanda se reunirá em caráter ordinário trimestralmente e, em caráter
extraordinário, sempre que convocado pelo Ministro de Estado da Mulher, da
Família e dos Direitos Humanos. (…) § 3º Os membros do Conanda que se
encontrarem no Distrito Federal se reunirão presencialmente e os membros que se
encontrem em outros entes federativos participarão da reunião por meio de
videoconferência. Art. 81. O Presidente da República designará o Presidente do
Conanda, que será escolhido dentre os seus membros. § 1º A forma de indicação
do Presidente do Conanda será definida no regimento interno do Conanda. § 2º O
representante da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos substituirá o
Presidente do Conanda em suas ausências e seus impedimentos." (todos com a
redação dada pelo Decreto 10.003/2019)
(3) Decreto 10.003/2019: “Art. 2º
Ficam dispensados todos os membros do Conanda na data de entrada em vigor deste
Decreto."
(4) Decreto 9.579/2018: “Art. 79.
As organizações da sociedade civil de que trata o inciso II do caput do art. 78
serão eleitas em assembleia específica, convocada especialmente para essa
finalidade. (…) § 3º Dentre as vinte e oito entidades mais votadas, as quatorze
primeiras serão eleitas como titulares, das quais as quatorze restantes serão
as suplentes."
Em resumo:
I-
São inconstitucionais normas que reduzam
participação da sociedade civil em Conselhos Deliberativos sobre políticas
públicas acerca de criança e adolescentes;
II-
Não é inconstitucional norma que reduz o número
de representantes do Poder Público, estabelecendo participação paritária,
valendo tal redução somente para as futuras eleições;
III-
Não é inconstitucional norma que estabelece voto
de qualidade ao Presidente do CONANADA;
IV-
Não é inconstitucional norma que proíbe em tais
Conselhos recondução de representante da sociedade civil.
Feitas tais ponderações, nos cabe
comentar as alternativas da questão.
LETRA A- INCORRETA. Contraria o
art. 5º da Lei 1697/90, do Estado do Rio de Janeiro. Diz tal artigo:
“Art. 5º - O Conselho Estadual de
Defesa da Criança e do Adolescente (CEDCA) será composto pelos representantes
do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e Ordem dos
Advogados do Brasil, como previsto no artigo 51, parágrafo único, do ADCT da
Constituição Estadual e por 7 (sete) representantes de órgãos públicos
estaduais encarregados da política de atendimento à infância e à juventude,
nomeados pelo Poder Executivo."
Ora, não há previsão de
participação de representantes de órgãos da sociedade civil.
LETRA B- INCORRETA. A seleção de
representantes da sociedade civil se dá com base na lei e não em Decretos ou
fixações do Poder Executivo. A decisão do Informativo 1007 foi clara neste
sentido, inclusive apontando que decreto não pode ir além da lei, sob pena de
ofensa ao princípio da legalidade.
LETRA C- INCORRETA. Existem
decisões judiciais determinando a recomposição de valores retirados
indevidamente de Conselhos alusivos à Criança e Adolescente. Mesmo em um
cenário de crise econômica do Estado do Rio de Janeiro, lembremos do melhor
interesse da criança como norma a balizar a leitura do tema.
LETRA D- INCORRETA. Restaria sem
sentido a existência de Conselhos se a Administração Pública não estivesse
adstrita ao deliberado em tais Conselhos.
LETRA E- CORRETA. Com efeito, no
Informativo 1007 do STF, restou claro que não é inconstitucional a previsão em
decreto de voto de qualidade do Presidente do CONANDA.
GABARITO
DO PROFESSOR: LETRA E
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Sobre a alternativa B
Tese: “É inconstitucional norma que, a pretexto de regulamentar, dificulta a participação da sociedade civil em conselhos deliberativos”. (ADPF 622. Pleno, julgado em 01/03/2021)
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STF. Plenário. ADPF 622/DF - São incompatíveis com a Constituição Federal as regras previstas no Decreto nº 10.003/2019, que, a pretexto de regular o funcionamento do Conselho Nacional da Criança e do Adolescente (Conanda), frustram a participação das entidades da sociedade civil na formulação e no controle da execução de políticas públicas em favor de crianças e adolescentes. Não bastasse isso, essas normas violam o princípio da legalidade. Por outro lado, foi mantida a validade da norma que confere ao presidente do Conanda voto de qualidade em caso de empate e a que impede a recondução de representantes da sociedade civil. De acordo com o relator, não ficou demonstrada, nesse caso, a conexão entre as normas e a fragilização da participação da sociedade civil.
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Assertiva "C" INCORRETA:
É vedado as Estados-membros se apropriarem de Fundos Especiais, criados por lei para atingir determinada finalidade especial, tal qual o Fundo da Infância e da Adolescência (FIA), criado pela Lei 1.697/90.
O STF na ADI 553/RJ decidiu que “são inconstitucionais as normas que estabelecem vinculação de parcelas das receitas tributárias a órgãos, fundos ou despesas, por desrespeitarem a vedação contida no art. 167, IV, da Constituição Federal” (ADI 553/RJ).
Assertiva "D" INCORRETA:
Não sei se a banca buscou a fundamentação na resolução 170/2014 do CONANDA, mas foi lá que encontrei uma fundamentação. (https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/conselho-nacional-dos-direitos-da-crianca-e-do-adolescente-conanda/resolucoes/resolucao-no-139.pdf)
Art. 51. As deliberações do CONANDA, no seu âmbito de competência para elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, são vinculantes e obrigatórias para a Administração Pública, respeitando-se os princípios constitucionais da prevenção, prioridade absoluta, razoabilidade e legalidade.
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Essa DPE-RJ nessa parte do ECA foi pra detonar todo mundo, vai te danar.