Podemos afirmar que a referida questão também tem forte influência aristotélica, uma que, na obra Ética a Nicômaco, citada na questão anterior, há a distinção de sabedoria e virtudes intelectuais ( virtudes do pensamento) como episteme, techne, phronesis, sophis e nois.
A episteme cuida realmente do conhecimento científico, e portanto, de cunho teórico e não prático, enquanto a techne está relacionada ao ofício ou arte, embora no conhecimento da prática-teórica. Para Aristóteles, a phronesis vai além do conhecimento científico analítico (episteme) e do conhecimento técnico ou como-conhecer (techne) e que envolve o que tem sido chamado de “a arte de julgamento”, isto é, as decisões phronesis e vai além, o conhecimento científico analítico (episteme) e conhecimento técnico ou sabe como (techne) e envolve o que ele chamou de “a arte do julgamento”, isto é, as decisões tomadas na forma de um ator social virtuoso.
Notamos que os conceitos trazidos pela Banca podem ser considerados como corretos, mas devem ser vistos conforme o eqüestre foi solicitado: a ideia de direito, segundo a razão prática.
Retomando assim os conceitos clássicos dos Gregos, a opinião (doxa) está relacionada ao conhecimento imperfeito e oscilante e a certeza (episteme), como conhecimento certo e seguro. A phronesis é normalmente traduzida como “sabedoria prática”.
Daí, pessoal, nessa interpretação difícil, o gabarito preliminar está correto ao afirmar que “A capacidade de bem deliberar (phronesis) a respeito de bens ou questões humanas”.
O que pode ser questionado é que a Banca ao utilizar a expressão “Boa parte da doutrina jusfilosófica contemporânea” poderia ter induzido o candidato ao erro, quando traz um conceito eminentemente aristotélico, e portanto, clássico, sendo que na contemporaneidade é retrabalhado por Gadamer, sendo a phronesis como “prudência”, conhecimento prático.
A alternativa correta encontra-se na
letra “d”. O melhor autor a ser utilizado para responder os “anseios” desta questão é
Immanuel Kant. Kant estudou detalhadamente duas formas de manifestação da
razão: a razão teórica e a razão prática.
A razão teórica pura
permitiria ao sujeito (epistêmico) elaborar o conhecimento do mundo da
natureza. A razão prática pura, por sua vez, abriria o caminho para o
conhecimento do mundo social (System der Sitten), ou seja, da sociedade. Essa
distinção era essencial em Kant na medida em que este atribuía uma diferença
qualitativa à natureza e à sociedade, os dois mundos em que atuaria a razão,
conhecendo as leis matemáticas e físicas do mundo natural e fazendo as leis que
regeriam o mundo social ou dos costumes.
Na doutrina moral de Kant, tem um lugar
central o princípio de autonomia da vontade (Wille), cujo poder de
autodeterminação se manifesta nas máximas do ‘dever-ser’ (distanciando-se,
portanto, do “ser”).
A condição para que o sujeito seja livre é que possa dar um
fim a si mesmo, que oriente suas ações morais. E este reconhecimento do fim da
ação é um produto puro de sua razão —uma razão prática pura—, sem qualquer
apreensão sensível de qualquer objeto. Kant estabelece, portanto, uma distinção
entre a autonomia da vontade livre, e heteronomia da dependência de princípios
externos.
Há outra noção importante, distinta da de vontade, a de arbítrio
(Willkür) ou capacidade de escolha, que é corrompida quando se escolhem fins e
ações de acordo com máximas de origem sensível. Enquanto o arbítrio se empenha
sobretudo pela ação e consecução dos fins, a vontade se relaciona mais com o
estabelecimento dos fundamentos da ação. Kant afirma que quando a vontade
determina a capacidade de escolha, de modo autônomo, é a própria razão prática
que fornece as máximas escolhidas para serem leis universais, prescritas como
imperativos da ação.
A questão da moralidade somente surge em
decorrência da “indeterminação” do “dever ser” ou do mundo social, onde os homens têm a liberdade de
fazer valer as suas vontades, fixar os seus próprios objetivos ou fins. É por
isso que nesse mundo a ação dos homens pode ser julgada segundo os critérios do
bem e do mal, do certo e do errado, do justo e do injusto. Os critérios do
julgamento encontram-se arraigados na razão prática pura; seu instrumento
privilegiado é o “imperativo categórico”. Este se resume na seguinte sentença: “Age
de tal modo que a máxima de tua vontade possa sempre valer simultaneamente como
um princípio para uma legislação geral.”
FONTES:
FREITAG, Barbara. A QUESTÃO DA
MORALIDADE: da razão prática de Kant à ética discursiva de Habermas. Revista
Social, São Paulo, v. 1, n. 2, p.1-17, jul. 1989. Semestral.
KANT. Immanuel (1788). Kritik der praktischen
Vernunft. Frankfurt/M, Suhrkarnp Verlag, 1977a, Werkausgabe VII.
SILVA, Roger Michael Miller. Fins e
meios: uma discussão sobre a phronesis na Ética Nicomaquéia. 2005. 145 f. Dissertação
(Mestrado) - Curso de Filosofia, Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. Cap. 7.