CERTA. FIQUEI NA DÚVIDA SE NO CASO NÃO SERIA UM INCIDENTE DE RELEVÂNCIA?
DIFERENCIAÇÃO DE OUTROS INSTITUTOS
O incidente de uniformização se assemelha, pelo menos na sua finalidade, a outros institutos delineados pelo CPC. Um deles é o incidente de relevância (também chamado de delegação de competência [45] ou de uniformização de jurisprudência preventiva [46]), previsto no art. 555, § 1º, do CPC. Este dispositivo diz que, ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor divergência entre câmaras ou turmas do tribunal, poderá o relator propor seja o recurso julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar. Reconhecendo o interesse público na assunção de competência, esse órgão colegiado julgará o recurso.
SOUZA (2009:379), ao tratar do incidente de relevância preleciona que:
Se o recurso versar sobre questão de direito já controvertida no tribunal, o relator pode sugerir a transferência da competência para colegiado "ad quem". O mesmo pode ocorrer para prevenir futura divergência "intra murus". Aliás, não só o relator, mas qualquer magistrado da turma ou da câmara pode suscitar o incidente do § 1º do art. 555. Também as partes e o Ministério Público têm legitimidade para arguição. A previsão legal explícita em favor do relator ocorre apenas em razão da maior probabilidade de o incidente poder ser suscitado pelo magistrado responsável pelo processamento do recurso no tribunal, além da redação do relatório.
Se a conveniência da afetação for declarada pela maioria da turma ou câmara, os autos são remetidos ao órgão coletivo "ad quem". Se igualmente reconhecida a existência de controvérsia acerca da questão de direito, ocorre o julgamento imediato do próprio recurso pelo colegiado maior, com participação dos respectivos magistrados. Com efeito, se o incidente de transferência de competência for deferido nos colegiados originários e superior, o próprio recurso é julgado desde logo pelo órgão coletivo "ad quem". Em contraposição, se o incidente de afetação de competência for rejeitado, o recurso é julgado na própria turma ou câmara, mas apenas com a participação dos respectivos magistrados.
O incidente de relevância não se confunde com o de uniformização [47], primeiramente, porque a sua finalidade é prevenir a divergência jurisprudencial, enquanto que o incidente de uniformização a harmoniza. Outra, porque, se for reconhecida a relevância da questão jurídica, o órgão competente para decidir o incidente de relevância (órgão plenário) é o mesmo que julgará o recurso [48]. Enquanto isso, no incidente de uniformização, há uma cisão no julgamento: o órgão plenário tem a função de definir a tese jurídica "correta" a ser aplicada, enquanto que o órgão fracionário de origem julga o caso concreto [49].
O incidente de uniformização, igualmente, não se confunde com os embargos de divergência [50], que é espécie recursal[51] admissível perante STF e STJ e se presta a eliminar divergência jurisprudencial interna causada por turma do respectivo tribunal (com sua interposição, a parte recorrente objetiva, em consequência da uniformização jurisprudencial proporcionada, o alcance da pretensão deduzida em sede de recurso extraordinário ou especial).
Os embargos de divergência têm natureza recursal, enquanto que o instrumento em estudo é incidente processual. O recurso tem finalidade corretiva, enquanto que o incidente, preventiva (pelo menos à luz do caso concreto). Além disso, o recurso só é cabível para atacar decisão proferida pelos órgãos fracionários do STJ ou do STF, enquanto que o incidente pode ser interposto quando do julgamento de recurso, reexame necessário e ação originária em trâmite nos tribunais locais. Outro ponto de diferenciação: de acordo com copiosos precedentes jurisprudenciais [52], não cabe a instauração do incidente de uniformização perante o Supremo Tribunal Federal (face ao silêncio do seu regimento interno e à existência de outros institutos que alcançam a mesma finalidade) sendo lá, ao contrário, possível a interposição de embargos de divergência.
Acerca deste último ponto de diferenciação (impossibilidade instauração do incidente de uniformização perante o Supremo Tribunal Federal), serão tecidas considerações específicas no item "Novas reflexões acerca do velho instituto". No momento presente, serão identificados e analisados os pressupostos de admissibilidade do incidente de uniformização.
SILVA, Rinaldo Mouzalas de Souza e; MOUZALAS, Ilcléia Cruz de Souza Neves. O incidente de uniformização dos arts. 476 a 479 do Código de Processo Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2879, 20maio2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/19155>. Acesso em: 11 mar. 2014.