SóProvas


ID
1058878
Banca
FAURGS
Órgão
TJ-RS
Ano
2013
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

          Devo educar meus filhos para serem éticos?

01          Quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, saí de casa para
02   a escola numa manhã fria de inverno. Chegando ___
03   portaria, meu pai interfonou, perguntando se eu estava
04   levando um agasalho. Disse que sim. Ele me perguntou
05   qual. “O moletom amarelo”, respondi. Era mentira.
06   Não estava levando agasalho nenhum, mas estava
07   com pressa, não queria me atrasar.
08          Voltei do colégio e fui ao armário procurar o tal
09   moletom. Não estava lá, nem em nenhum lugar da
10   casa, e eu imaginava _ _ _ _. Gelei. À noite, meu pai
11   chegou de cara amarrada. Ao me ver, tirou de sua
12   pasta o moletom e me disse: “Eu não me importo que
13   tu não te agasalhes. Mas, nesta casa, nesta família,
14   ninguém mente. Tá claro?”. Sim, claríssimo. Esse foi
15   apenas um episódio memorável de algo que foi o
16   leitmotiv da minha formação familiar. Meu pai era um
17   obcecado por retidão, palavra, ética, pontualidade,
18   honestidade, código de conduta, escala de valores,
19   menschkeit (firmeza de caráter, decência fundamental,
20   em iídiche) e outros termos que eram repetitiva e
21   exaustivamente martelados na minha cabeça. Deu
22   certo. Quer dizer, não sei. No Brasil atual, eu me sinto
23   deslocado.
24         Até hoje chego pontualmente aos meus compro-
25   missos e, na maioria das vezes, fico esperando por
26   interlocutores que se atrasam e nem se desculpam
27   (quinze minutos parece constituir uma “margem de
28   erro” tolerável). Até hoje acredito quando um prestador
29   de serviço promete entregar o trabalho em uma data,
30   apenas para ficar exasperado pelo seu atraso. Fico
31   revoltado sempre que pego um táxi em uma cidade
32   que não conheço e o motorista tenta me roubar.
33   Detesto os colegas de trabalho que fazem corpo mole,
34   que arranjam um jeitinho de fazer menos que o devido.
35   Isso sem falar nas quase úlceras que me surgem ao
36   ler o noticiário e saber que, entre os governantes,
37   viceja um grupo de imorais que roubam com criativi-
38   dade e desfaçatez.
39         Sócrates, via Platão, defende que o homem que
40   pratica o mal é o mais infeliz e escravizado de todos,
41   pois está em conflito interno, em desarmonia consigo
42   mesmo, perenemente acossado e paralisado por
43   medos, remorsos e apetites incontroláveis, tendo uma
44   existência desprezível, para sempre amarrado ___
45   algo (sua própria consciência!) onisciente que o
46   condena. Com o devido respeito ao filósofo de Atenas,
47   nesse caso acredito que ele foi excessivamente
48   otimista. Hannah Arendt me parece ter chegado mais
49   perto da compreensão da perversidade humana ao
50   notar que esse desconforto interior do “pecador”
51   pressupõe um diálogo interno, de cada pessoa com a
52   sua consciência, que na verdade não ocorre com a
53   frequência desejada por Sócrates. Para aqueles que
54   cometem o mal em uma escala menor e o confrontam,
55   Arendt relembra Kant, que sabia que “o desprezo por
56   si próprio, ou melhor, o medo de ter de desprezar a si
57   próprio, muitas vezes não funcionava, e a sua explicação
58   era que o homem pode mentir para si mesmo”. Todo
59   corrupto ou sonegador tem uma explicação, uma lógica
60   para os seus atos, algo que justifique o _ _ _ _ de uma
61   determinada lei dever se aplicar a todos, sempre, mas
62   não a ele, pelo menos não naquele momento em que
63   está cometendo o seu delito.
64          Cai por terra, assim, um dos poucos consolos das
65   pessoas honestas: “Ah, mas pelo menos eu durmo
66   tranquilo”. Os escroques também! Se eles tivessem
67   dramas de consciência, se travassem um diálogo
68   verdadeiro consigo e seu travesseiro, ou não teriam
69   optado por sua “carreira” ou já teriam se suicidado.
70   Esse diálogo consigo mesmo é fruto do que Freud
71   chamou de superego: seguimos um comportamento
72   moral _ _ _ _ ele nos foi inculcado por nossos pais, e
73   renegá-lo seria correr o risco da perda do amor paterno.
74          Na minha visão, só existem, assim, dois cenários
75   em que é objetivamente melhor ser ético do que não.
76   O primeiro é se você é uma pessoa religiosa e acredita
77   que os pecados deste mundo serão punidos no próximo.
78   Não é o meu caso. O segundo é se você vive em uma
79   sociedade ética em que os desvios de comportamento
80   são punidos pela coletividade, quer na forma de sanções
81   penais, quer na forma de ostracismo social. O que
82   não é o caso do Brasil. Não se sabe se De Gaulle disse
83   ou não a frase, mas ela é verdadeira: o Brasil não é
84   um país sério.
85          Assim é que, criando filhos brasileiros morando no
86   Brasil, estou ___ voltas com um deprimente dilema:
87   acredito que o papel de um pai é preparar o seu filho
88   para a vida. Esta é a nossa responsabilidade: dar a
89   nossos filhos os instrumentos para que naveguem,
90   com segurança e destreza, pelas dificuldades do mundo
91   real. E acredito que a ética e a honestidade são valores
92   axiomáticos. Eis aí o dilema: será que o melhor que
93   poderia fazer para preparar meus filhos para viver no
94   Brasil seria não os aprisionar na cela da consciência,
95   do diálogo consigo mesmos, da preocupação com a
96   integridade? Tenho certeza de que nunca chegaria a
97   ponto de incentivá-los a serem escroques, mas poderia,
98   como pai, simplesmente ser mais omisso quanto a essas
99   questões. Tolerar algumas mentiras, não me importar
100  com atrasos, não insistir para que não colem na escola,
101  não instruir para que devolvam o troco recebido a
102  mais...
103         O fato de pensar ___ respeito do assunto e de viver
104  em um país em que existe um dilema entre o ensino
105  da ética e o bom exercício da paternidade já é causa
106  para tristeza. Em última análise, decidi dar a meus
107  filhos a mesma educação que recebi de meu pai. Não
108  porque ache que eles serão mais felizes assim – pelo
109  contrário –, nem porque acredite que, no fim, o bem
110  compensa. Mas _ _ _ _, em primeiro lugar, não conse-
111  guiria conviver comigo mesmo – e com a memória de
112  meu pai – se criasse meus filhos para serem pessoas
113  do tipo que ele me ensinou a desprezar. Além disso,
114  porque acredito que sociedades e culturas mudam.
115  Muitos dos países hoje desenvolvidos e honestos eram
116  antros de corrupção e sordidez 100 anos atrás. Um
117  dia o Brasil há de seguir o mesmo caminho, e aí a
118  retidão que espero inculcar em meus filhos há de ser
119  uma vantagem (não um fardo). Oxalá.

Adaptado de: Devo educar meus filhos para serem éticos?
http://veja.abril.com.br/noticia/educacao/gustavo-ioschpe-devo-educar-meus-filhos-para-serem-eticos
Acessado em 21/10/2013.

Assinale a alternativa que preenche, correta e respectivamente, as lacunas das linhas 10, 60, 72 e 110.

Alternativas
Comentários
  • RESPOSTA letra C

    Na Língua Portuguesa, há quatro maneiras diferentes de se grafar o porquê:


    1) Porquê (junto, com acento): É um substantivo, portanto deverá ser usado, quando surgir, antes dele, uma palavra modificadora – artigo (o, os, um, uns), pronome adjetivo (meu, esse, quanto) ou numeral (um, dois, três, quatro). Como é um substantivo, admite plural: porquês. Exemplos:

    — Ninguém sabe o porquê de tanto desdém.
    — Quantos porquês! Pare de fazer-me perguntas.


    2) Por quê (separado, com acento): É a junção da preposição por com o substantivo quê, que só é usado em final de frase. Aliás, sempre que a palavra "que" for usada em final de frase, deverá ser acentuada, independentemente do elemento que surja antes. Exemplos:

    — Você não me telefonou ontem por quê?
    — Nem eu sei por quê.
    — Você está rindo de quê?
    — Você procurou-me para quê?

    Nota 1: A palavra "que" será acentuada, quando estiver antecedida por uma palavra modificadora, ou quando for uma interjeição que designa espanto. Exemplos:

    — Ela tem um quê de mistério.
    — Quê? Ela esteve aqui, e você não me avisou?
    Nota 2: Quando, anteriormente ao "que", surgir a palavra "o", "a", "os" ou "as", teremos pronome demonstrativo (o, a, os, as), com o mesmo valor de "aquele, aquela, aquilo", e pronome relativo (que). No caso de "a que", também pode ser a preposição "a". Exemplos:

    — Não entendi o que você falou = Não entendi aquilo que você falou.
    — Dos concorrentes, o vencedor será o que mais votos obtiver = Dos concorrentes, o vencedor será aquele que mais votos obtiver.
    — A peça a que assisti é maravilhosa. (Esse "a" é preposição)

    3) Por que (separado, sem acento):

    a) É a junção da preposição por com o pronome interrogativo que; significa por que motivo, por qual razão. Exemplos:

    — Por que o professor faltou hoje? = Por qual razão o professor faltou?
    — Não sei por que o professor faltou hoje = Não sei por qual motivo o professor faltou hoje.
    b) É a junção da preposição por com o pronome relativo que; pode ser substituído por pelo qual, pelos quais, pela qual, pelas quais ou por qual. Exemplos:

    —O aperto por que passei foi terrível = O aperto pelo qual passei foi terrível.
    — A causa por que luto é nobilíssima = A causa pela qual luto é nobilíssima.

    4) Porque (junto, sem acento): É uma conjunção, portanto estará ligando duas orações, indicando causa (= já que), explicação (= pois) ou finalidade (= para que). Exemplos:

    — O espetáculo não ocorreu, porque o cantor estava gripado = O espetáculo não ocorreu já que o cantor estava gripado.
    — Estudem, porque consigam a aprovação = Estudem para que consigam a aprovação.
    — Pare de falar, porque está atrapalhando-me = Pare de falar, pois está atrapalhando-me.

    COMENTARIO DE RAQUEL TRINDADE,ESPERO QUE AJUDE 

    Fonte:http://www1.folha.uol.com.br/folha/fovest/usodoporque.shtml

  • 1- Porque: é uma conjunção casual ou explicativa e quase sempre pode ser substituída por pois.


    2- Porquê: pode ser substituída por motivo e é substantivado, pois é antecedido por um artigo, pronome ou numeral.


    3- Por quê: Usado sempre em final de frase.


    4- Por que: Usado em início de pergunta e pode ser substituída por "pela qual".

  • Lacuna 10: Usa-se por quê pois além de representar o sentido de motivo ele está no final da frase.

    Lacuna 60: Utiliza-se porquê devido a presença do artigo além da necessidade de ser aplicado para expressar CAUSA OU MOTIVO.

    Lacuna 72: Foi usado o porque pois ele está equivalente ao sentido das expressões: "pois", "uma vez que", "pelo fato".

    Lacuna 110: Mesmo motivo.

  • Na linha 100 o uso do por quê estaria próximo ao uso da vírgula que levaria o acento. Não entendi?

  • linha  10: Por quê : (casa, e eu imaginava _ _ _ _) final de frase, existe uma interrogativa.

    lina  60: Porquê :  (para os seus atos, algo que justifique o _ _ _ _ de uma) pode ser substituído pelo o motivo ou a razão.

    linha 72: porque: (moral _ _ _ _ ele nos foi inculcado por nossos pais, e) pode ser substituído por visto que ou uma vez que.

    linha 110: porque: (compensa. Mas _ _ _ _, em primeiro lugar, não conse-) pode ser substituído por visto que ou uma vez que.

  • Jurava que na linha 110 haveria acento....

  • Obrigada Soraia pelo seu comentário !

  • O Porque (junto sem acento) tem uma dica, ele poderá ser usado quando for possível a sua substituição por:  pois, como ou para que.

    Bons estudos galera! 

  • Alguém pode explicar o porquê de na linha 110 o "porque" não ter sido acentuado?

  • Por que = por qual motivo, razão, pela qual.

    Por quê = junto de pontuações.

    Porque = pois

    Porquê = substantivo

  • linha  10: Por quê : (casa, e eu imaginava _ _ _ _) final de frase, existe uma interrogativa.

    lina  60: Porquê : (para os seus atos, algo que justifique o _ _ _ _ de uma) pode ser substituído pelo o motivo ou a razão.

    linha 72: porque: (moral _ _ _ _ ele nos foi inculcado por nossos pais, e) pode ser substituído por visto que ou uma vez que.

    linha 110: porque: (compensa. Mas _ _ _ _, em primeiro lugar, não conse-) pode ser substituído por visto que ou uma vez que.

  • 1. POR QUE

    Pode significar:

    a) POR QUE RAZÃO 

    ex.1 Por que você viajará? (= por que razão)

    ex.2 Não sei por que ela saiu. (=por que razão)

    b) PELO QUAL / PELOS QUAIS / PELA QUAL / PELAS QUAIS

    ex.1 Esta é a razão por que  lutamos (= pela qual)

     

    2. POR QUÊ

    Também siginifica POR QUE RAZÃO, mas:

    - Aparece no final de frases

    - Encontra pontuação de qualquer tipo (vírgula, ponto e vírgula, dois pontos, exclamação, interrogação)

    ex. Você viajará, por quê?

     

    3. PORQUE 

    = conjunção explicativa ou causal

    ex. Ela não veio porque estava doente.

     

    ATENÇÃO: Também pode aparecer em perguntas, mas apenas quando apresenta uma justificativa, como no segundo caso do exemplo a seguir:

    ex.: Por que (= por que razão) você sairá? PORQUE João chegou?

    Neste exemplo, a segunda pergunta é uma justificativa para sair, logo, o "PORQUE" da pergunta deve permanecer junto e sem acento.

    Outro exemplo que retrata o caso: Porque brigaste com Ana estás triste? (justificativa para estar triste).

     

    4. PORQUÊ

    = substantivo (vem acompanhado de algum determinante - o(s), seu(s), aquele(s), um(ns), este(s).

    ex. Não sei o porquê.

    ex. Seu porquê é este?

  • Não entendi o porquê de na linha 110 o " por quê" não levou acento já que existe uma vírgula após a palavra. 

  • Marcos Silva, a vírgula foi posta em vista da intercalação do adjunto adverbial, o que pode ser retirada facilmente.

  • Marcos Silva, a palavra `porque` da linha 110 equivale a pois, já que,visto que e dessa maneira escreve-se junto e sem acento.

  • O porquê da linha 110, como já explicou Zambeli, também pode ser trocado por "por causa que". 

  • POR QUE: equivale a “pelo qual”, ou quando se pode acrescer as palavras “razão” ou “motivo”, ou seja “por qual motivo”. É o de início de pergunta,  mas essa não é a única hipótese! Irá ocorrer pela Regra do Itaú (que é pronome relativo (a qual) e por é preposição, então se o verbo pedir a preposição, ela volta e fica na frente do pronome relativo).

    POR QUÊequivale também a “por qual motivo”. Sempre estará próximo a um ponto de encerramento (interrogação, ponto final, ponto de exclamação, vírgulas marcando deslocamento). Nem sempre será pergunta, pode ser qualquer ponto.

    PORQUEé uma conjunção, equivale a “pois”. É uma explicação. “Por causa que” (não existe,  mas o porque equivale a essa errônea expressão).Também no caso de pergunta retórica (pergunta já sabendo a resposta). Ex.: Tu não vieste na aula ontem porque ficou em casa dormindo?.

    PORQUÊ: é um substantivo, equivalendo a “razão”, “motivo” e normalmente aparece antecedido de uma palavra determinante (artigo, numeral ou pronome). Ex.¹: Dê-me ao menos um porquê para sua atitude. (uma razão). 

  • Texto bacana!