SóProvas


ID
1404136
Banca
FUNCAB
Órgão
INCA
Ano
2014
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

O Livro da Solidão

Os senhores todos conhecem a pergunta famosa universalmente repetida: “Que livro escolheria para levar consigo, se tivesse de partir para uma ilha deserta...?"

Vêm os que acreditam em exemplos célebres e dizem naturalmente: “Uma história de Napoleão.” Mas uma ilha deserta nem sempre é um exílio... Pode ser um passatempo...

Os que nunca tiveram tempo para fazer leituras grandes, pensam em obras de muitos volumes. É certo que numa ilha deserta é preciso encher o tempo... E lembram-se das “Vidas” de Plutarco, dos “Ensaios” de Montaigne, ou, se são mais cientistas que filósofos, da obra completa de Pasteur. Se são uma boa mescla de vida e sonho, pensam em toda a produção de Goethe, de Dostoievski, de Ibsen. Ou na Bíblia. Ou nas “Mil e uma noites”.

Pois eu creio que todos esses livros, embora esplêndidos, acabariam fatigando; e, se Deus me concedesse a mercê de morar numa ilha deserta (deserta, mas com relativo conforto, está claro - poltronas, chá, luz elétrica, ar condicionado) o que levava comigo era um Dicionário. Dicionário de qualquer língua, até com algumas folhas soltas; mas um Dicionário.

Não sei se muita gente haverá reparado nisso - mas o Dicionário é um dos livros mais poéticos, se não mesmo o mais poético dos livros. O Dicionário tem dentro de si o Universo completo

Logo que uma noção humana toma forma de palavra - que é o que dá existência às noções - vai habitar o Dicionário. As noções velhas vão ficando, com seus sestros de gente antiga, suas rugas, seus vestidos fora de moda; as noções novas vão chegando, com suas petulâncias, seus arrebiques, às vezes, sua rusticidade, sua grosseria. E tudo se vai arrumando direitinho, não pela ordem de chegada, como os candidatos a lugares nos ônibus, mas pela ordem alfabética, como nas listas de pessoas importantes, quando não se quer magoar ninguém...

O Dicionário é o mais democrático dos livros. Muito recomendável, portanto, na atualidade. Ali, o que governa é a disciplina das letras. Barão vem antes de conde, conde antes de duque, duque antes de rei. Sem falar que antes do rei também está o presidente.

O Dicionár io r esponde a todas as curiosidades, e tem caminhos para todas as filosofias. Vemos as famílias de palavras, longas,acomodadas na sua semelhança, - e de repente os vizinhos tão diversos! Nem sempre elegantes, nem sempre decentes, - mas obedecendo à lei das letras, cabalística como a dos números..

O Dicionário explica a alma dos vocábulos: a sua hereditariedade e as suas mutações.
E as surpresas de palavras que nunca se tinham visto nem ouvido! Raridades, horrores, maravilhas...

Tudo isto num dicionário barato - porque os outros têm exemplos, frases que se podem decorar, para empregar nos artigos ou nas conversas eruditas, e assombrar os ouvintes e os leitores...

A minha pena é que não ensinem as crianças a amar o Dicionário. Ele contém todos os gêneros literários, pois cada palavra tem seu halo e seu destino - umas vão para aventuras, outras para viagens, outras para novelas, outras para poesia, umas para a história, outras para o teatro.

E como o bom uso das palavras e o bom uso do pensamento são uma coisa só e a mesma coisa, conhecer o sentido de cada uma é conduzir-se entre claridades, é construir mundos tendo como laboratório o Dicionário, onde jazem, catalogados, todos os necessários elementos.

Eu levaria o Dicionário para a ilha deserta. O tempo passaria docemente, enquanto eu passeasse por entre nomes conhecidos e desconhecidos, nomes, sementes e pensamentos e sementes das flores de retórica.

Poderia louvar melhor os amigos, e melhor perdoar os inimigos, porque o mecanismo da minha linguagem estaria mais ajustado nas suas molas complicadíssimas. E, sobretudo, sabendo que germes pode conter uma palavra, cultivaria o silêncio, privilégio dos deuses, e ventura suprema dos homens.

(MEIRELES, Cecília. O Livro da Solidão.Folha da Manhã , Caderno Único. São Paulo: 11 jul.1948, p. 6.

“... que é o que dá existência às noções...” (§ 6)

Das alterações feitas a seguir na redação do enunciado transcrito acima, é facultativo empregar o acento indicativo de crase em:

Alternativas
Comentários
  • Casos em que a ocorrência da crase é FACULTATIVA:

    Diante de nomes próprios femininos: Entreguei o cartão a Paula/ Entreguei o cartão à Paula.

    Diante de PRONOME POSSESSIVO FEMININO: Cedi o lugar a minha avó/ Cedi o lugar à minha avó.

    Depois da preposição até: Fui até a praia/ Fui até à praia.

    Letra: B - "que é o que dá existência à NOSSA noção preferida."

  • Só não entendi o porque a letra E está errada também, alguém poderia me explicar? 

  • pela explicação da isa eu acho que é somente quando estiver no singular... se plural passa a ser obrigatório. alguém pra confimar ?

  • Na letra E, "até"  denota inclusão, sentido de "inclusive".

    Ex.: Na formatura a plateia prestou homenagens à mãe, às professoras, até (inclusive) à diretora. 

    Nesse caso a crase é obrigatória.

    Na letra B, se o pronome possessivo estiver no plural, existirão apenas duas formas para se construir a estrutura.

    Ex.:Ninguém ofendeu a vossas irmãs ou Ninguém ofendeu às vossas irmãs.

  • se houver a preposição a diante de um pronome possessivo adjetivo singular, o emprego do acento grave indicador de crase será facultativo. Se houver a preposição a diante de um pronome possessivo adjetivo plural, o emprego do acento grave indicador de crase só ocorrerá se houver as; caso oa aparecer no singular, haverá somente a preposição: ou às.

  • Letra 'E"

     

    que é o que dá existência até às noções menos representativas.

     

    É preciso pensar de duas formas

    Que é o que dá existência,chegou até as noções menos representativas e parou;

    ou que é o que dá existência, dá inclusive as noções menos representativas..(inclusive = até)

     

    Se a primeira opção for a verdadeira, até é preposição; se for a segunda, advérbio. Caso a verdadeira seja a primeira opção, recomenda-se o uso da preposição a em combinação com até, evitando, assim, o duplo sentido: "que é o que dá existência até às noções menos represenativas"

    Caso a verdadeira seja a segunda opção, recomenda-se o uso de inclusive: "que é o que dá existência inclusive as noções menos represenativas".

     

    Na realidade a banca usou um termo não recomendado para confudir o candidato.

     

    http://vestibular.uol.com.br/duvidas-de-portugues/ate-as-22h-ou-ate-as-22h.htm

  •  a)que é o que dá existência às suas noções preferidas. (ÀS SUAS....no plural o uso da crase é obrigatório).

     b)que é o que dá existência à nossa noção preferida. (À NOSSA...Pronome pocessivo no singular, uso da crase facultativo).

     c)que é o que dá existência àquelas noções indispensáveis ao conhecimento (ÀQUELAS...Pronome demonstrativo no plural, crase obrigatória).

     d)que é o que dá existência à considerada mais importante das noções (Quem dá...dá algo (existência) a alguém (à considerada mais importante das nações)).

     e)que é o que dá existência até às noções menos representativas. (ATÉ ÀS...No plural, obrigatório o uso da crase).

     

    FOCO...FORÇA...FÉ...

  • Confesso que ainda não entendi o erro da letra e!

  • e)  que é o que dá existência até às noções menos representativas.

     

    LETRA E – ERRADA – O termo até está sendo usado com o sentido de inclusive. Dessa forma, a crase é obrigatória. Nesse sentido:

     

    “Não confunda as preposições “até / até a”, as quais indicam “deslocamento, movimento, ação”, com a palavra denotativa de inclusão “até”, a qual tem o sentido de “inclusive”. Veja:

     

    Exemplo:

     

    Na formatura, foi até ( “a” ou “à”) plateia e prestou homenagens à mãe, às professoras, à diretora, até (inclusive – case obrigatória) à zeladora.

     

    FONTE: PROFESSOR RODRIGO BEZERRA