SóProvas


ID
1457053
Banca
FCC
Órgão
TRE-RR
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                          Conselhos ao candidato

    Certa vez um enamorado da Academia, homem ilustre e aliás perfeitamente digno de pertencer a ela, escreveu-me sondando-me sobre as suas possibilidades como candidato. Não pude deixar de sentir o bem conhecido calefrio aquerôntico, porque então éramos quarenta na Casa de Machado de Assis e falar de candidatura aos acadêmicos sem que haja vaga é um pouco desejar secretamente a morte de um deles. O consultado poderá dizer consigo que “praga de urubu não mata cavalo". Mas, que diabo, sempre impressiona. Não impressionou ao conde Afonso Celso, de quem contam que respondeu assim a um sujeito que lhe foi pedir o voto para uma futura vaga:

    -Não posso empenhar a minha palavra. Primeiro porque o voto é secreto; segundo porque não há vaga; terceiro porque a futura vaga pode ser a minha, o que me poria na posição de não poder cumprir com a minha palavra, coisa a que jamais faltei em minha vida.

    Se eu tivesse alguma autoridade para dar conselhos ao meu eminente patrício, dir-lhe-ia que o primeiro dever de um candidato é não temer a derrota, não encará-la como uma capitis diminutio, não enfezar com ela. Porque muitos dos que se sentam hoje nas poltronas azuis do Trianon, lá entraram a duras penas, depois de uma ou duas derrotas. Afinal a entrada para a Academia depende muito da oportunidade e de uma coisa bastante indefinível que se chama “ambiente". Fulano? Não tem ambiente. [...]

    Sempre ponderei aos medrosos ou despeitados da derrota que é preciso considerar a Academia com certo senso de humour. Não tomá-la como o mais alto sodalício intelectual do país. Sobretudo nunca se servir da palavra “sodalício", a que muitos acadêmicos são alérgicos. Em mim, por exemplo, provoca sempre urticária.
    
    No mais, é desconfiar sempre dos acadêmicos que prometem: “Dou-lhe o meu voto e posso arranjar-lhe mais um". Nenhum acadêmico tem força para arranjar o voto de um colega. Mas vou parar, que não pretendi nesta crônica escrever um manual do perfeito candidato.

     (BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1993, vol. único, p. 683-684)

*aquerôntico =relativo ou pertencente a Aqueronte, um dos rios do Inferno, atravessado pelos mortos na embarcação conduzida pelo barqueiro Caronte.

*capitis diminutio:expressão latina de caráter jurídico empregada para designar a diminuição de capacidade legal.

No desenvolvimento do texto, o autor deixa transparecer

Alternativas
Comentários
  • Alternativa A: Errado. Não foi com seriedade (“é preciso considerar a Academia com certo senso de humour”).

    Alternativa B: Errado. Não houve indecisão quanto aos meios eficazes de orientação. Pelo contrário, o narrador é categórico e claro nas suas sugestões, como se observa no 3 o e 4 o parágrafos.

    Alternativa C: Errado. Não se aconselha a desistir, mas, sim, a concorrer (dir-lhe-ia que o primeiro dever de um candidato é não temer a derrota).

    Alternativa D: Gabarito.

    Alternativa E: Errado. (“e falar de candidatura aos acadêmicos sem que haja vaga é um pouco desejar secretamente a morte de um deles”, "nunca se servir da palavra ‘sodalício’, a que muitos acadêmicos são alérgicos. Em mim, por exemplo, provoca sempre urticária”).

  • d: ironia ????? onde que eu nao vi

  • A dúvida paira sobre a B e D. Não consegui perceber nem indecisão nem tratamento irônico no texto, então fui impelido a procurar algum indício da resposta certa. A ironia de Manoel Bandeira é muito sutil, porque eu também não consegui detectar com certeza, a não ser pelo "calafrio aquerôntico", mas que já era alguma coisa. Deveria ter ido na D. U_U

  • A ironia está no fato de o autor dizer implicitamente ao candidato que não tem vaga. Assim, a vaga seria possível se ele( o autor) morresse. Então, para não deixar o candidato ao vácuo, disse-lhe algumas palavras de afirmação.

  • A ironia pode ser percebida nesta parte do texto:

    Se eu tivesse alguma autoridade para dar conselhos ao meu eminente patrício, dir-lhe-ia que o primeiro dever de um candidato é não temer a derrota,
    não encará-la como uma capitis diminutio, não enfezar com ela. Porque muitos dos que se sentam hoje nas poltronas azuis do Trianon, lá entraram a duras penas.

    Se ele está numa situação superior e mais experiente, como não pode dar conselho?

  • melhor texto para interpretação impossivel! fazer uma prova lendo um texto desses é incrivel, primeiro por ser do Manuel Bandeira, segundo pelo grau encantador de ironia!

  • ótimo como literatura, mas na hora da prova na tensão absurda ia gerar mto desespero! força!

  • É realmente absurda uma questão dessas. um poema  em interpretação de texto?

  • Tô igual a colega ali: Ironia? Cadê! 

  • Sinceramente... não vi ironia

  • difícil! se teve ironia era bom o autor declamar na hora da prova pra gente poder perceber melhor.

  • Tb não vi ironia... mas tb as outras alternativas eram ruins... complicado

  • Achei que a Ironia foi nesse trecho: "Afinal a entrada para a Academia depende muito da oportunidade e de uma coisa bastante indefinível que se chama “ambiente". Fulano? Não tem ambiente. [...]"



    Se eu estiver errado me corrijam!!!
  • Quanto a irônia:

    "terceiro porque a futura vaga pode ser a minha, o que me poria na posição de não poder cumprir com a minha palavra, coisa a que jamais faltei em minha vida." (vamos traduzir o pensamento do autor para nordestinez ; BONITINHO PARA VC ENTRAR ALGUÉM TEM QUE MORRER, SE EU MORRER E LHE PERMITIR SEU PLEITO POR UMA VAGA, ENTÃO COMO VOTARIA EM VC MEU FILHO RS)


  • A C E tá fora!

    A dúvida é quanto B e D.

    Mas vamos lá...

    b) indecisão sobre se haverá meios eficazes para orientar um candidato, já que o próprio autor é um dos escritores que fazem parte do quadro da Academia.


    Indecisão quanto a meios eficazes ???   Negativo, Manuel Bandeira conhece meios eficazes de orientar o acadêmico, tanto é que expos alguns poucos ao longo do texto.  Se houve alguma INDECISÃO, ou melhor, eu diria HESITAÇÃO, foi quanto a possibilidade de fazer ou não, a tal orientação, já que ''falar de candidatura aos acadêmicos sem que haja vaga é um pouco desejar secretamente a morte de um deles''


    d) tratamento irônico a respeito das pretensões de um candidato a vaga na Academia, pretensão extemporânea, pois o quadro está completo.


    Ao tratar das pretensões do candidato, Manuel assim diz: ''Se eu tivesse alguma autoridade para dar conselhos ao meu eminente patrício [...]''

    Será que Manuel Bandeira, um dos quarenta integrantes do quadro da academia, não possui autoridade para orientar um dos acadêmicos, digo UM e não O, nem sequer sabemos quem é este acadêmico.

  • Questão difícil!E se há ironia, está muito sutil!

  • Afff...sempre fico com dúvida entre uma questão e outra. É a letra E e marquei a B ..;)

  • Na minha humilde opinião, tem um caráter muito subjetivo para ser colocada em uma prova objetiva.