SóProvas


ID
1511263
Banca
CEPERJ
Órgão
SEDUC-RJ
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

COMO LER NAS “ENTRELINHAS”?

As conhecidas “entrelinhas” são uma boa metáfora visual para aquilo que poderíamos designar, de maneira mais apropriada, como o “não-dito” de um texto. Entre uma linha e outra não há supostamente nada exceto o branco da página, da mesma maneira que o não-dito obviamente não foi escrito, logo, não pode ser lido.

Entretanto, lembremos que a linguagem humana é simultaneamente pletórica e insu?ciente: sempre se diz mais e menos do que se queria dizer. Até mesmo um texto prosaico e informativo esconde algumas informações e sugere outras, que se nos revelam se soubermos ler... nas entrelinhas. Ora, um texto de ?cção amplia conscientemente o espaço das suas entrelinhas, justamente para poder tanto esconder quanto sugerir mais informações. Desse modo, ele desa?a o seu leitor a decifrá-lo, vale dizer, a escavar as suas entrelinhas.

Nos dois parágrafos acima, por exemplo.
O que se encontra nas entrelinhas?
O que eu não disse?
O que estou escondendo?

Quando digo que “um texto de ficção amplia conscientemente o espaço das suas entrelinhas” e “desafia o seu leitor a decifrá-lo”, vejo-me escondendo nada menos do que o próprio autor do texto, porque empresto consciência e vontade a uma coisa, isto é, a um texto. Se o meu leitor percebe que fiz isto, ou seja, se o meu leitor lê nas entrelinhas do meu texto, ele pode me interpretar ou de um modo conservador ou de um modo mais ousado.

O meu leitor conservador pode entender que apenas recorri a uma metonímia elegante, dizendo “texto” no lugar de “autor do texto” por economia de palavras e para dar estilo ao que escrevo. O meu leitor ousado já pode especular que sobreponho o texto ao seu autor para sugerir que a própria escrita modifica quem escreve, e o faz no momento mesmo do gesto de escrever.

Ambas as interpretações me parecem válidas, embora eu goste mais da segunda. Talvez haja outras leituras igualmente válidas, embora nem tudo se possa enfiar impunemente nas entrelinhas alheias. Em todo caso, creio que achei um bom exemplo de leitura de entrelinhas no próprio texto que fala das entrelinhas...

Se posso ler nas entrelinhas de textos teóricos ou informativos como este que vos fala, o que não dizer de textos de ficção? Este meu texto não se quer propositalmente ambíguo ou plurissignificativo, mas o acaba sendo de algum modo, por força das condições internas de toda a linguagem, o que abre espaço para suas entrelinhas, isto é, para seus não-ditos.

Um texto de ficção, entretanto, já se quer ambíguo e plurissignificativo, assumindo orgulhosamente suas entrelinhas. Estas entrelinhas são maiores ou menores, mais ou menos carregadas de sentido, dependendo, é claro, do texto que contornam. Textos menores e mais densos, por exemplo, tendem a conter entrelinhas às vezes maiores do que eles mesmos.

É o caso do menor conto do mundo, do hondurenho Augusto Monterroso, intitulado “O Dinossauro”. O conto tem apenas sete palavras e cabe em apenas uma linha: “quando acordou, o dinossauro ainda estava ali”.
As entrelinhas cercam este conto, provocando muitas perguntas, como, por exemplo:

1. Quem acordou?
2. Quem fala?
3. Onde é ali?
4. O dinossauro ainda estava ali porque também se encontrava lá antes de a tal pessoa dormir, ou porque ela sonhara com o dinossauro e ele saiu do sonho para a sua realidade?
5. O dinossauro que ainda estava ali é o animal extinto ou um símbolo?
6. Se for o animal extinto e supondo que o conto se passa na nossa época, como ele chegou ali?
7. Se não se passa na nossa época, então em que época se passa a história?
8. Se, todavia, o dinossauro é um símbolo, o que simboliza?

Na verdade, as entrelinhas contêm as perguntas que um texto nos sugere, muito mais do que as respostas que ele porventura esconde. A nossa habilidade de ler nas entrelinhas se desenvolve junto com a nossa habilidade de seguir as sugestões do texto e de formular perguntas a respeito dele e mesmo contra ele, para explorá-las sem necessariamente respondê-las de uma vez para sempre.

Gustavo Bernardo (Adaptado de: revista.vestibular.uerj.br/coluna/)

No sétimo parágrafo, a análise de estruturas presentes no próprio texto revela o emprego de:

Alternativas
Comentários
  • Quando a preocupação do emissor está voltada para o próprio código, ou seja, para a própria linguagem, temos então o que chamamos de função metalinguística.

    Podemos observar a metalinguagem no poema de João Cabral de Melo Neto chamado “Poema de desintoxicação”. Nele, o poeta realiza o que chamamos de metapoesia,ou seja, a poesia fala sobre ela mesma.

    http://www.brasilescola.com/gramatica/funcao-metalinguistica.htm

    Ou seja, quando autor explica suas próprias palavras que foram ditas anteriormente.

  • Função metalinguística é um tipo textual: Dicionários, gramática, são exemplos de metalinguagem. Uma música que fala sobre a música também o é. O emissor falar do próprio código ou linguagem.

  • GABARITO: LETRA E

    Função Metalinguística está presente no discurso que utiliza o código para explicar o próprio código.

    O que melhor define e caracteriza essa função é o uso da metalinguagem.

    Ela pode ser encontrada num vídeo que tenha como tema filmes, uma música ou um poema que fale sobre música ou poema, respectivamente. Entre tantos outros exemplos, podemos citar gramáticas e dicionários.

    Exemplos:

    1) No dicionário

    "di.ci.o.ná.rio

    sm (lat dictione) Coleção de vocábulos de uma língua, de uma ciência ou arte, dispostos em ordem alfabética, com o seu significado ou equivalente na mesma ou em outra língua. Sin: léxico, vocabulário, glossário. D. vivo: indivíduo muito erudito ou de grande memória."

    (Definição retirada do Dicionário Michaelis)

    2) Numa frase

    Frase é um enunciado, com ou sem verbo, que tem sentido completo.

    3) Numa música

    "Minha música quer estar

    Além do gosto

    Não quer ter rosto

    Não quer ser cultura...

    Minha música quer ser

    De categoria nenhuma

    Minha música quer

    Só ser música

    Minha música

    Não quer pouco…"

    (Trecho de Minha Música, de Adriana Calcanhoto)

    FONTE: Função Metalinguística - Toda Matéria (todamateria.com.br)