TEXTO 5
TODO PIONEIRO É UM FORTE, pensava
Bambico. Acredita nos sonhos. Se não fosse por ele, o
mundo ainda estaria no tempo das cavernas... Quanto
mais pensava nisso, mais se fortalecia.
Bambico chegara à Amazônia com as mãos
vazias, vindo do Sul. Mas tinha na cabeça projetos
grandiosos. Queria extrair da natureza toda a riqueza
intacta, como o garimpeiro faz. Não desejava, entretanto,
cavar rio e terra para achar pepitas de ouro.
Não tinha vocação para tatu. Não faria como os garimpeiros:
quando não havia mais nada, eles se mudavam,
atrás de outros garimpos.
— Garimpeiro vive de ilusões. Eu gosto de projetos!
Que projetos grandiosos eram? Cortar árvores,
exportar madeiras preciosas para a casa e a mobília
dos ricos. Em seguida, semear capim, povoando os
campos com as boiadas de nelore brilhando de tanta
saúde. A riqueza estava acima do chão. A imensidão
verde desaparecia no horizonte. Só de olhar para uma
árvore, sabia quantos dólares cairia em seus bolsos.
Quando ouvia os roncos das motosserras, costumava
dizer, orgulhoso:
— Eis o barulho da fortuna!
Montes de serragem eram avistados de longe
quando o visitante chegava às pequenas comunidades.
Os caminhões de toras gemiam nas estradas
esburacadas. Índios e caboclos eram afugentados à
bala. A floresta se transformava num pó fino, que
logo apodrecia. Quando os montes de serragem não
apodreciam, eram queimados, sempre apressadamente.
Por dias, os canudos negros de fumaça subindo
pesadamente ao céu. Havia o medo dos fiscais.
Quando apareciam, quase nunca eram vistos, era
conveniente que houvesse pouca serragem...
Que história, a de Bambico! Teria muita coisa a
contar para os netos que haveriam de chegar.
Em seu escritório, fumando um Havana, que
um importador americano lhe presenteara, estufou
o peito, vaidoso.
— Sim, muitas coisas! Quem te viu, quem te vê!
[...]
Sentia prazer com seus projetos grandiosos.
Toda manhã se levantava para conquistar o mundo.
Vereança era merreca. Não se rastejava em pequenos
projetos. Muito menos desejava ser deputado... Ambicionava
altos voos. Todo deputado era pau-mandado
dos ricos. O Senado, sim, era o grande alvo. Lá,
ele poderia afrontar esses “falsos profetas protetores
da natureza". Essas ONGs de fachada... Lá, o seu cajado
cairia sem dó, como um verdugo, sobre o costado
dessa gente tola. Enquanto isso, ele poderia continuar
seus projetos grandiosos. Cortar árvores, exportar
madeiras preciosas para a casa e a mobília dos ricos,
e semear capim.
Sonhara em ter uma dúzia de filhos, mas o
destino lhe dera apenas dois. Sua mulher, após o segundo
parto, ficara impossibilitada de procriar. Não
queria fêmea entre os seus descendentes, mas logo
no primeiro parto veio a decepção. Uma menina.
Decepcionado, nada comentou com a esposa. No segundo,
depois de uma gravidez tumultuada, veio o
varão. Encheu-se de alegria. Com certeza, mais varões
estavam para vir... [...]
(GONÇALVES, David. Sangue verde. São Paulo:
Sucesso Pocket, 2014. p. 114-115.)
Em Sangue verde (Texto 5), o narrador retrata os
pensamentos e conhecimentos de Bambico. Com base na
leitura do livro, analise as afirmações a seguir:
I- A personagem entende que o garimpo é, para ela,
apenas um ponto para se estabelecer a relação com
Brasília, onde o enriquecimento não dependeria do
trabalho insano de se extrair pepitas da terra.
II- Bambico demonstra ser ambicioso a partir do momento
que realiza o oposto daqueles que buscam o
ouro, pois deseja extrair da Amazônia a verdadeira
riqueza – aquilo que estava acima do chão – para
mais rapidamente poder ascender a um cargo.
III- A personagem prega a moral e os bons costumes,
mas age inteiramente ao contrário, já que assassina
índios, grila terras, sustenta amantes e elimina de
seu caminho o Senador Justino, principal empecilho
à sua candidatura ao Senado.
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