A respeito dos argumentos utilizados pelo autor do texto, em relação ao ser “aluno" e ao ser “estudante",
analise as afirmativas.
I - Os argumentos arrolados no texto tendem a criar um perfil para o estudante, mamífero em “extinção", ao
mesmo tempo em que desqualificam o indivíduo com perfil de aluno.
II - Na visão do autor, a tecnologia a que o jovem tem acesso hoje é parceira na falta de seu crescimento
intelectual, no desenvolvimento autônomo, na aquisição de conhecimento superficial e passageiro e no
comportamento individualista.
III - Segundo o texto, a presença da tecnologia na escola torna o ensino anacrônico, porque tenta ainda
domesticar um público do século XXI com métodos e conteúdos do século XIX.
IV - Ao afirmar no final do texto que “aprender cansa", o autor sugere que as escolas se adaptem às novas
tecnologias para facilitar o aprendizado.
Está correto o que se afirma em
Procuram-se estudantes
Além do mico-leão-dourado e do lobo-guará, outro mamífero tropical parece caminhar para a extinção
Diz-se que uma espécie encontra-se ameaçada quando a população decresce a ponto de situá-la em condição de
extinção. Tal processo é fruto da exploração econômica e do desenvolvimento material, e atinge aves e
mamíferos em todo o planeta. Nos trópicos, esse pode ser o caso dos estudantes. Curiosamente, enquanto a
população de alunos aumenta, a de estudantes parece diminuir. Paradoxo? Parece, mas talvez não seja.
Aluno é aquele que atende regularmente a um curso, de qualquer nível, duração ou especialidade, com a
suposta finalidade de adquirir conhecimento ou ter direito a um título. Já o estudante é um ser autônomo, que
busca uma nova competência e pretende exercê-la, para o seu benefício e da sociedade. O aluno recebe. O
estudante busca. Quando o sistema funciona, todos os alunos tendem a se tornar estudantes. Quando o sistema
falha, eles se divorciam. É o que parece ocorrer entre nós: enquanto o número de alunos nos ensinos
fundamental, médio e superior cresce, assombram-nos sinais do desaparecimento de estudantes entre as massas
discentes.
Alguns grupos de estudantes sobrevivem, aqui e acolá, preservados em escolas movidas por nobres ideais e
boas práticas, verdadeiros santuários ecológicos. Sabe-se da existência de tais grupos nos mais diversos
recantos do planeta: na Coreia do Sul, na Finlândia e até mesmo no Piauí. Entretanto, no mais das vezes, o que
se veem são alunos, a agir como espectadores passivos de um processo no qual deveriam atuar como
protagonistas, como agentes do aprendizado e do próprio destino.
Alunos entram e saem da sala de aula em bandos malemolentes, sentam-se nas carteiras escolares como no sofá
de suas casas, diante da tevê, a aguardar que o show tenha início. Após 20 minutos, se tanto, vêm o tédio e o
sono. Incapazes de se concentrar, eles espreguiçam e bocejam. Então, recorrem ao iPhone, à internet e às mídias
sociais. Mergulhados nos fragmentos comunicativos do penico digital, lambuzam-se de interrogações,
exclamações e interjeições. Ali o mundo gira e o tempo voa. Saem de cena deduções matemáticas, descobertas
científicas, fatos históricos e o que mais o plantonista da lousa estiver recitando. Ocupam seu lugar o resultado
do futebol, o programa de quinta-feira e a praia do fim de semana.
As razões para o aumento do número de alunos são conhecidas: a expansão dos ensinos fundamental, médio e
superior, ocorrida aos trancos e barrancos, nas últimas décadas. A qualidade caminhando trôpega, na sombra da
quantidade. Já o processo de extinção dos estudantes suscita muitas especulações e poucas certezas. Colegas
professores, frustrados e desanimados, apontam para o espírito da época: para eles, o desaparecimento dos
estudantes seria o fruto amargo de uma sociedade doente, que festeja o consumismo e o prazer raso e imediato,
que despreza o conhecimento e celebra a ignorância, e que prefere a imagem à substância.
Especialistas de índole crítica advogam que os estudantes estão em extinção porque a própria escola tornou-se
anacrônica, tentando ainda domesticar um público do século XXI com métodos e conteúdos do século XIX.
Múltiplos grupos de interesse, em ação na educação e cercanias, garantem a fossilização, resistindo a
mudanças, por ideologia de outra era ou pura preguiça. Aqui e acolá, disfarçam o conservadorismo com aulas-shows,
tablets e pedagogia pop. Mudam para que tudo fique como está.
Outros observadores apontam um fenômeno que pode ser causa-raiz do processo de extinção dos estudantes:
trata-se da dificuldade que os jovens de hoje enfrentam para amadurecer e desenvolver-se intelectualmente. A
permissividade criou uma geração mimada, infantilizada e egocêntrica, incapaz de sair da própria pele e de
transcender o próprio umbigo. São crianças eternas, a tomarem o mundo ao redor como extensão delas próprias,
que não conseguem perceber o outro, mergulhar em outros sistemas de pensamento e articular novas ideias.
Repetem clichês. Tomam como argumentos o que copiam e colam de entradas da Wikipédia e do que mais
encontram nas primeiras linhas do Google. E criticam seus mestres, incapazes de diverti-los e de fazê-los se
sentir bem com eles próprios. Aprender cansa. Pensar dói.
(Por Thomaz Wood Jr. — publicado 10/04/2014 04:52, Revista Carta Capital, http://www.cartacapital.com.br/revista/794/procuram-se-estudantes-7060.html.
Acesso em 16/04/2014.)