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ID
1626631
Banca
CESPE / CEBRASPE
Órgão
Instituto Rio Branco
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

        Em setembro de 1916, Fernando Pessoa pensava que o n.º 3 da revista Orpheu ainda poderia vir à luz. E, de fato, chega a entrar no prelo, imprimindo-se apenas algumas folhas. No sumário, como se depreende da carta a Cortes Rodrigues de 4 desse mês, deveriam figurar poemas ingleses do profeta do “supra-Camões” e “colaboração variada” do seu “velho e infeliz amigo Álvaro de Campos”. Vale a pena reparar nos adjetivos deploradores que o poeta junta, nessa data, ao nome do seu heterônimo dileto. Parece-me ser-nos lícito pensar que nesta altura já Álvaro de Campos dá indícios de “velhice” e “infelicidade”, ou seja, que Álvaro de Campos começa a despir a pele que lhe vestiram e, pelo menos como poeta, a tomar consciência de que a mistificação “sensacionisto-futurista” lhe não assenta bem. Daí que ao Fernando Pessoa não de todo desenganado dos “ismos” e ao mesmo Álvaro de Campos doutrinário, o Álvaro de Campos poeta se lhes entremostre “velho” e “infeliz”.

      Seja como for, o certo é que em setembro de 1916, Pessoa, que se tem por “reconstruído” nessa altura, parece decidido a “fazer uma grande alteração na (sua) vida” como confidencia ao amigo micaelense: “vou tirar o acento circunflexo do meu apelido”. Realmente, “Pessôa” aparecera sempre, até então, ortografado com acento circunflexo. Grande alteração na vida: “Pessoa” iria passar a ser ortografado sem esse inútil apêndice! Sempre à beira do paradoxo e da boutade, Fernando Pessoa não perde a ocasião de ir além de si mesmo — de se mistificar a si próprio. Era então o momento de tomar tão grave medida. Com efeito, tendo apenas publicado com o seu verdadeiro nome, a esta data, além das Impressões do Crepúsculo, uns versos mais, o fato de ir publicar agora na Orpheu dois poemas ingleses — “muito indecentes, e, portanto, impublicáveis em Inglaterra” — levava-o a achar melhor “desadaptar-se” de uma partícula que lhe prejudicava a projeção cosmopolita do nome.

    Como a Orpheu 3 não chega, porém, a vir à luz, Fernando Pessoa sem circunflexo tem de esperar pela publicação da revista Centauro, lançada em fins de 1916 (Outubro–Novembro–Dezembro), para aparecer, de fato, como autor dos Passos da Cruz.

    Pormenor chistoso, boutade do incansável mistificador Fernando Pessoa, esta “desadaptação” ao circunflexo corresponde, todavia, a qualquer coisa mais importante do que parece. O poeta de Gládio atinge por esta altura a sua maioridade poética.

João Gaspar Simões. Vida e obra de Fernando Pessoa. Lisboa: Livraria Bertrand, 1981, 5.ª edição, p. 393-4 (com adaptações).

A respeito das ideias desenvolvidas no texto acima, julgue (C ou E) o item subsecutivo.

Do texto, cujo autor afirma que Fernando Pessoa não conseguiu ver impressos os seus poemas no número 3 da revista Orpheu, mesmo porque aquela edição acabou não sendo publicada, não se pode inferir o motivo da não publicação da revista.

Alternativas
Comentários
  • Segundo o texto, o Orpheu nº 3 chegou a ser impresso algumas folhas, mas não chegou a vir à luz. Portanto, gabarito Correto

  • Correta. "...Fernando Pessoa sem circunflexo tem de esperar pela publicação da revista Centauro...".

    .

    Não se sabe o motivo da não impressão da revista Orpheu. Pode ter sido por falta de tinta, por que a mulher do dono da gráfica descobriu que ele estava a traindo e o matou, pode ser qualquer coisa, o texto não fala.

  • Fiquei com dúvida. Não deveria ser ERRADO

     

    A questão diz que a edição número 3 da revista Orpheu acabou não sendo publicada. Mas não está claro no texto se esta revista foi ou não publicada. 

    No terceiro paragrafo, por exemplo, diz que Fernando Pessoa teve de esperar pela publicação da revista Centauro porque a Orpheu 3 não chega. Ou seja, a Orpheu 3 poderia ter sido publicada em um momento posterior.

    Dizer que ela não foi publicada não seria uma extrapolação? 

      

  • Nessa passagem do texto, da para inferir que a edição não foi publicada: "Em setembro de 1916, Fernando Pessoa pensava que o n.º 3 da revista Orpheu ainda poderia vir à luz"

     

    Nessa outra passagem, fica claro que FP não viu impresso seus poemas " Como a Orpheu 3 não chega, porém, a vir à luz, Fernando Pessoa sem circunflexo tem de esperar pela publicação da revista Centauro"

     

    Por fim, não se pode inferir o motivo da não publicação da revista, porque o texto é silente neste sentido.

  • Fiquei na dúvida quanto à parte de "inferir". Segundo o texto : "o fato de ir publicar agora na Orpheu dois poemas ingleses — “muito indecentes, e, portanto, impublicáveis em Inglaterra” ". Inferi que por serem muito indecentes para a Inglaterra, acabaram tb não sendo publicados na Orpheu...

  • Tem texto que só por Deus viu...