Em 40 anos, nunca vi alguém se curar com a força do pensamento.
Para mim, se Maomé não for à montanha, a montanha
vir a Maomé é tão improvável quanto o Everest aparecer na
janela da minha casa. A fé nas propriedades curativas da assim
chamada energia mental tem raízes seculares. Quantos
católicos foram canonizados porque lhes foi atribuído o poder
espiritual de curar cegueiras, paraplegias, hanseníase e
até esterilidade feminina? Quantos pastores evangélicos convencem
milhões de fiéis a pagar-lhes os dízimos ao realizar
façanhas semelhantes diante das câmeras de TV? Por que a
energia emanada do pensamento positivo serve apenas para
curar doenças, jamais para fazer um carro andar dez metros
ou um avião levantar voo sem combustível? No passado, a
hanseníase foi considerada apanágio dos ímpios; a tuberculose,
consequência da vida desregrada; a AIDS, maldição
divina para castigar os promíscuos. Coube à ciência demonstrar
que duas bactérias e um vírus indiferentes às virtudes dos
hospedeiros eram os agentes etiológicos dessas enfermidades.
Acreditar na força milagrosa do pensamento pode servir ao
sonho humano de dominar a morte. Mas, atribuir a ela tal
poder é um desrespeito aos doentes graves e à memória dos
que já se foram.
(Drauzio Varella. Folha de S.Paulo, 09.06.2007. Adaptado.)
O pensamento do autor, sob o ponto de vista filosófico, pode
ser corretamente caracterizado como