SóProvas


ID
1869721
Banca
FUNCAB
Órgão
Prefeitura de Santa Maria de Jetibá - ES
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                      O encontro


      Maria da Piedade Lourenço era uma mulher miúda e nervosa, com uma cabeleira pardacenta, malcuidada, erguida, como uma crista, no alto da cabeça. Ludo não conseguia distinguir-lhe os pormenores do rosto. Todavia, deu pela crista. Parece uma galinha, pensou, e logo se arrepende por ter pensado aquilo. Andara nervosíssima nos dias que antecederam a chegada da filha. Quando esta lhe surgiu à frente, porém, veio-lhe uma grande calma. Mandou-a entrar. A sala estava agora pintada e arranjada, soalho novo, portas novas, tudo isso às custas do vizinho, Arnaldo Cruz, que também fizera questão de oferecer as mobílias. Comprara o apartamento a Ludo, concedendo-lhe o usufruto vitalício do mesmo, e comprometendo-se a pagar os estudos de Sabalu até este concluir a universidade.

      A mulher entrou. Sentou-se numa das cadeiras, tensa, agarrada à bolsa como a uma boia de salvação. Sabalu foi buscar chá e biscoitos.

      Não sei como a hei de chamar.

      Pode chamar-me Ludovica, é o meu nome.

      Um dia poderei chamá-la mãe?

     Ludo apertou as mãos de encontro ao ventre. Podia ver, através das janelas, os ramos mais altos da mulemba. Nenhuma brisa os inquietava.

      Sei que não tenho desculpa, murmurou: Era muito nova, e estava assustada. Isso não justifica o que fiz.

      Maria da Piedade arrastou a cadeira para junto dela. Pousou a mão direita no seu joelho:

      Não vim a Luanda para cobrar nada. Vim para a conhecer. Quero levá-la de volta para a nossa terra.

      Ludo segurou-lhe a mão:

      Filha, esta é a minha terra. Já não me resta outra.

      Apontou para a mulemba:

      Tenho visto crescer aquela árvore. Ela viu-me envelhecer a mim.

      Conversamos muito.

      A senhora há de ter família em Aveiro.

      Família?!

      Família, amigos, eu sei lá.

      Ludo sorriu para Sabalu, que assistia a tudo, muito atento, enterrado num dos sofás:

      A minha família é esse menino, a mulemba lá fora, o fantasma de um cão. Vejo cada vez pior. Um oftalmologista, amigo do meu vizinho, esteve aqui em casa, a observar-me. Disse-me que nunca perderei a vista por completo. Resta-me a visão periférica. Hei de sempre distinguir a luz, e a luz neste país é uma festa. Em todo o caso, não pretendo mais: A luz, Sabalu a ler para mim, e a alegria de uma romã todos os dias.


AGUALUSA, José Eduardo.Teoria Geral do Esquecimento. Rio de Janeiro: Foz, 2012. 

Sobre o texto leia as afirmativas a seguir.


I. A inevitabilidade do encontro com o passado se dá quando Maria da Piedade Lourenço, filha de Ludo, a conhece pessoalmente.

II. O primeiro momento é de estranhamento. Depois, há a tentativa de fuga de Ludo para evitar o reconhecimento dos fatos.

III. Por fim, a aceitação de que, sem o reconhecimento de lembranças, só há esquecimento.

IV. Em sua memória, Ludo se recupera de seu lugar primeiro com uma facilidade indiscutível. Seu corpo para ela é uma realidade próxima ao mundo e aos outros corpos.


Está correto apenas o que se afirma em: 

Alternativas
Comentários
  • C)

    I, II e III. 

     

    textinho do cão... alguem poderia ter a honra de explicar as respostas??

  • Bom tentarei explicar o texto, afinal não é simples ter a interpretação de um texto tão complexo quanto esse. Já a questão poderá ser respondida.

    Ludo = Ludovica

     Maria da Piedade Lourenço (filha de Ludovica) era uma mulher miúda e nervosa, com uma cabeleira pardacenta, malcuidada, erguida, como uma crista, no alto da cabeça (descrevendo Maria). Ludo não conseguia distinguir-lhe os pormenores do rosto (não lembrava do rosto de Maria). Todavia, deu pela crista (Lembrou pela detalhe da crista). Parece uma galinha, pensou, e logo se arrepende por ter pensado aquilo. Andara nervosíssima nos dias que antecederam a chegada da filha (Aqui mostra que é mãe e filha). Quando esta lhe surgiu à frente (Maria surge), porém, veio-lhe uma grande calma. Mandou-a entrar. A sala estava agora pintada e arranjada, soalho novo, portas novas, tudo isso às custas do vizinho, Arnaldo Cruz, que também fizera questão de oferecer as mobílias. Comprara o apartamento a Ludo, concedendo-lhe o usufruto vitalício do mesmo, e comprometendo-se a pagar os estudos de Sabalu até este concluir a universidade (A casa não era dela).

          A mulher entrou. Sentou-se numa das cadeiras, tensa, agarrada à bolsa como a uma boia de salvação. (Maria) Sabalu foi buscar chá e biscoitos.

          Não sei como a hei de chamar. (Maria faz esse questionamento, iniciando um diálogo)

          Pode chamar-me Ludovica, é o meu nome. (Ludo)

          Um dia poderei chamá-la mãe? (Maria)

         Ludo apertou as mãos de encontro ao ventre (Demonstra a lembrança do passado, quando a tinha em seu ventre). Podia ver, através das janelas, os ramos mais altos da mulemba (mulemba = apenas uma árvore ou planta). Nenhuma brisa os inquietava.

          Sei que não tenho desculpa, murmurou: Era muito nova, e estava assustada. Isso não justifica o que fiz. (Ludo se lamentando do passado)

          Maria da Piedade arrastou a cadeira para junto dela. Pousou a mão direita no seu joelho:

          Não vim a Luanda para cobrar nada (Luanda lugar ou local onde vive Ludo). Vim para a conhecer. Quero levá-la de volta para a nossa terra. (Maria tentando levar a mão de volta a terra natal)

          Ludo segurou-lhe a mão:

          Filha, esta é a minha terra. Já não me resta outra. (Ludo)

          Apontou para a mulemba:

          Tenho visto crescer aquela árvore. Ela viu-me envelhecer a mim.

          Conversamos muito.

          A senhora há de ter família em Aveiro. (Maria questiona Ludo sobre familha em Aveiro. Aveiro = cidade)

          Família?!

    ...

    Expus um pouco da interpretação do texto e espero ter ajudado a todos!

    A luta continua....

  • lui., ta mais para afirmativas do cão