SóProvas


ID
1889497
Banca
FCC
Órgão
TRF - 3ª REGIÃO
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

      Os Beatles eram um mecanismo de criação. A força propulsora desse mecanismo era a interação dialética de John Lennon e Paul McCartney. Dialética é diálogo, embate, discussão. Mas também jogo permanente. Adição e contradição. Movimento e síntese. Dois compositores igualmente geniais, mas com inclinações distintas. Dois líderes cheios de ideias e talento. Um levando o outro a permanentemente se superar.

      As narrativas mais comuns da trajetória dos Beatles levam a crer que a parceria Lennon e McCartney aconteceu apenas na fase inicial do conjunto. Trata-se de um engano. Mesmo quando escreviam separados, John e Paul o faziam um para o outro. Pensavam, sentiam e criavam obcecados com a presença (ou ausência) do parceiro e rival.

      Lennon era um purista musical, apegado a suas raízes. Quem embarcou na vanguarda musical dos anos 60 foi Paul McCartney, um perfeccionista dado a experimentos e delírios orquestrais. Em contrapartida, sem o olhar crítico de Lennon, sem sua verve, os mais conhecidos padrões de McCartney teriam sofrido perdas poéticas. Lennon sabia reprimir o banal e fomentar o sublime.

      Como a dialética é uma via de mão dupla, também o lado suave de Lennon se nutria da presença benfazeja de Paul. Gemas preciosas como Julia têm as impressões digitais do parceiro, embora escritas na mais monástica solidão.

      Nietzsche atribui caráter dionisíaco aos impulsos rebeldes, subjetivos, irracionais; forças do transe, que questionam e subvertem a ordem vigente. Em contrapartida, designa como apolíneas as tendências ordenadoras, objetivas, racionais, solares; forças do sonho e da profecia, que promovem e aprimoram o ordenamento do mundo. Ao se unirem, tais forças teriam criado, a seu ver, a mais nobre forma de arte que jamais existiu.

      Como criadores, tanto o metódico Paul McCartney como o irrequieto John Lennon expressavam à perfeição a dualidade proposta por Nietzsche. Lennon punha o mundo abaixo; McCartney construía novos monumentos. Lennon abria mentes; McCartney aquecia corações. Lennon trazia vigor e energia; McCartney impunha senso estético e coesão.

Quando os Beatles se separaram, essa magia se rompeu. John e Paul se tornaram compositores com altos e baixos. Fizeram coisas boas. Mas raramente se aproximaram da perfeição alcançada pelo quarteto. Sem a presença instigante de Lennon, Paul começou a patinar em letras anódinas. Não se tornou um compositor ruim. Mas os Beatles faziam melhor. Ironicamente, o grande disco dos ex-Beatles acabou sendo o álbum triplo em que George Harrison deglutiu os antigos companheiros de banda, abrindo as comportas de sua produção represada durante uma década à sombra de John e Paul. E foi assim, por estranhos caminhos antropofágicos, que a dialética de Lennon e McCartney brilhou pela última vez.

(Adaptado de: DANTAS, Marcelo O. Revista Piauí. Disponível em: http://revistapiaui.estadao.com.br/materia/beatles. Acesso em: 20/02/16) 

É correto depreender do texto:

I. O autor apresenta o contraste entre Apolo e Dionísio, estabelecido por Nietzsche, com o propósito de classificar os processos de criação de John Lennon e Paul McCartney à luz de tal teoria, processos que seriam, respectivamente, dionisíaco e apolíneo.

II. Ao lançar mão do termo “dialética” no último parágrafo, o autor assinala a incongruência da atitude dos Beatles ao se separarem, uma vez que tal separação ocasionou a derrocada da criação musical dos membros da banda.

III. O uso do adjetivo “antropofágicos” (último parágrafo) para caracterizar os caminhos seguidos por George Harrison está relacionado à afirmativa anterior de que o músico teria “deglutido” os antigos companheiros de banda.

Atende ao enunciado o que consta APENAS em 

Alternativas
Comentários
  • I. O autor apresenta o contraste entre Apolo e Dionísio, estabelecido por Nietzsche, com o propósito de classificar os processos de criação de John Lennon e Paul McCartney à luz de tal teoria, processos que seriam, respectivamente, dionisíaco e apolíneo. certO

    Nietzsche atribui caráter dionisíaco aos impulsos rebeldes, subjetivos, irracionais; forças do transe, que questionam e subvertem a ordem vigente. Em contrapartida, designa como apolíneas as tendências ordenadoras, objetivas, racionais, solares; forças do sonho e da profecia, que promovem e aprimoram o ordenamento do mundo. Ao se unirem, tais forças teriam criado, a seu ver, a mais nobre forma de arte que jamais existiu.

          Como criadores, tanto o metódico Paul McCartney como o irrequieto John Lennon expressavam à perfeição a dualidade proposta por Nietzsche.

    III. O uso do adjetivo “antropofágicos” (último parágrafo) para caracterizar os caminhos seguidos por George Harrison está relacionado à afirmativa anterior de que o músico teria “deglutido” os antigos companheiros de banda. Certo

    Mas os Beatles faziam melhor. Ironicamente, o grande disco dos ex-Beatles acabou sendo o álbum triplo em que George Harrison deglutiu (ENGOLIU) os antigos companheiros de banda, abrindo as comportas de sua produção represada durante uma década à sombra de John e Paul. E foi assim, por estranhos caminhos antropofágicos, que a dialética de Lennon e McCartney brilhou pela última vez.

    LETRA: E

  • I. O autor apresenta o contraste entre Apolo e Dionísio, estabelecido por Nietzsche, com o propósito de classificar os processos de criação de John Lennon e Paul McCartney à luz de tal teoria, processos que seriam, respectivamente, dionisíaco e apolíneo.

      Como criadores, tanto o metódico Paul McCartney como o irrequieto John Lennon expressavam à perfeição a dualidade proposta por Nietzsche. Lennon punha o mundo abaixo; McCartney construía novos monumentos. Lennon abria mentes; McCartney aquecia corações. Lennon trazia vigor e energia; McCartney impunha senso estético e coesão.

    II. Ao lançar mão do termo “dialética” no último parágrafo, o autor assinala a incongruência da atitude dos Beatles ao se separarem, uma vez que tal separação ocasionou a derrocada da criação musical dos membros da banda.

    E foi assim, por estranhos caminhos antropofágicos, que a dialética de Lennon e McCartney brilhou pela última vez.

     

    III. O uso do adjetivo “antropofágicos” (último parágrafo) para caracterizar os caminhos seguidos por George Harrison está relacionado à afirmativa anterior de que o músico teria “deglutido” os antigos companheiros de banda.

    George Harrison deglutiu os antigos companheiros de banda.

  • Gabarito Letra E

    Item II - ERRADO

    Derrocada: demolição (de construção humana ou natural); destruição, desmoronamento, desabamento
    Por outr lado, segundo o texto: Dialética é diálogo, embate, discussão. Mas também jogo permanente. Adição e contradição. Movimento e síntese. Dois compositores igualmente geniais, mas com inclinações distintas

    vejo que o termo dialética, portanto, não fora o motivo da separação de john e do paul, mas sim a característica no ato da criação das músicas (pensamentos diferentes, mas se complementavam e criavam músicas boas). Ou seja, o termo dialética NÃO assinala a incongruência da atitude dos Beatles ao se separarem .

    bons estudos

  • Item I CERTO

    Item II ERRADO

    II. Ao lançar mão do termo “dialética” no último parágrafo, o autor assinala a incongruência da atitude dos Beatles ao se separarem, uma vez que tal separação (que tem conexão com a dialética) ocasionou a derrocada da criação musical dos membros da banda.

    Primeiro que a criação musical da dupla não foi derrocada com a separação;teve apenas seu potencial diminuído,por ai já perceber-se que a afirmação está errada. Segunda, a causa da separação não foi a dialética (a dialética era o que os mantinham juntos), e sim as divergências ao longo do tempo.

    Esse item II tenta induzir o candidato a relacionar a dialética com a separação da dupla ao utilizar a conjunção causal "uma vez que".Mentira isso.

    Eu entendi assim.

    Item III CERTO

    III. O uso do adjetivo “antropofágicos” (refere-se ao fato de George Harrison ter deglutido os antigos companheiros de banda.) para caracterizar os caminhos seguidos por George Harrison está relacionado à afirmativa anterior de que o músico teria “deglutido” os antigos companheiros de banda.

    Antropofágico é exatamente o que o George Harrison fez com a dupla dinâmica, engoliu-os,portanto, refere-se ao que foi dito antes.

  • Antropofágico

    Relativo a antropofagia. = ANDROFÁGICO, CANIBALESCO

     

    OBS: A FCC gosta muito de textos com 2 posições diferentes (x / y), neste texto: Lennon e Paul.

     


     

  • A afirmação contida no item II de que "tal separação ocasionou a derrocada da criação musical dos membros da banda" não está de acordo com o texto, pois o autor mesmo afirma que o grande disco dos ex-Beatles foi aquele produzido por George Harrison. Ou seja, depois da separação dos Beatles ainda houve criação musical de qualidade feita por um ex-membro da banda.

  • Excelente texto, reflexão, questão. 

    Ao tratar de Beatles e Nietzsche dá prazer resolver o exercício! Um viva ao rock'n roll

  • Essa foi um quase acertei. Só o fato de ter compreendido bem o texto e o raciocínio de todas as alternativas deixa-me feliz. o ítem lll causou-me uma pequena dúvida, inclinei-me a considerá-lo como correto,porém minha compreensão relacionada ao termo "antropofágico ", foi equivocada. Após observar os comentários dos colegas, passei a concordar plenamente com o gabarito.

    Força e fé , estou no caminho certo!