SóProvas


ID
2013871
Banca
FUMARC
Órgão
Câmara de Conceição do Mato Dentro
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

TEXTO 2

A ESCRITA NÃO É "A LÍNGUA"

Por Marcos Bagno*

    UMA LONGUÍSSIMA tradição de vinte e cinco séculos se impregnou de tal modo na cultura ocidental que a jovem ciência linguística, que conta pouco mais de 150 anos, ainda peleja para fazer valer seus postulados, muito mais lógicos e racionais. É a ideia (ou, melhor, a ideologia) de que “a língua” é uma entidade muito restrita, acessível a poucos iluminados, aqueles grandes escritores (todos homens, é claro) que se tornaram os “clássicos do idioma”. Não é à toa que o português é chamado de “a língua de Camões”, o espanhol de “a língua de Cervantes”, o italiano de “a língua de Dante”, o inglês de “a língua de Shakespeare” e por aí vai. A escrita literária, desde o surgimento dos estudos gramaticais no mundo de língua grega, trezentos anos antes de Cristo, tem sido vítima dessa apropriação ideológica. Qual é o problema? O grande escritor não é grande porque respeita mais ou desobedece menos as regras da gramática tradicional. O grande escritor é aquele que vai além do normal e do normativo, que tenta dar vazão à sua sensibilidade, exprimir de modo novo e surpreendente o que a realidade lhe comunica. É preciso libertar a língua usada pela imensa maioria das pessoas do peso insuportável de ser comparada aos usos feitos pelos grandes escritores. As pessoas não podem até hoje ser oprimidas e reprimidas pela culpa absurda de não falar tal como Machado de Assis escreveu seus romances no final do século 19!

    A escrita literária é só uma parcela microscópica de todos os múltiplos e variados usos possíveis da língua. Ela não serve para a descrição gramatical da língua, de como ela funciona, das regras em vigor. Para a ciência linguística, a língua é, primordialmente, aquilo que as pessoas falam no dia a dia, em suas interações normais, espontâneas, na construção de sua identidade pessoal e da identidade de sua comunidade. Por isso é que não se pode dizer que em Brasil e Portugal “se fala a mesma língua”. Não, não se fala: brasileiros e portugueses seguem regras totalmente diversas na hora de falar, têm coisas que só existem lá e não existem aqui e vice-versa. Quando falamos, contribuímos para a construção única e exclusivamente da nossa identidade social e cultural. É maravilhoso podermos ler a produção literária portuguesa, mas isso não significa que se trate “de uma mesma língua”. Basta ler os textos em voz alta para se dar conta disso!

    Durante mil anos, na Europa, a única língua de cultura foi o latim clássico: os letrados (só homens, é claro!) já falavam suas línguas maternas na vida diária, mas elas não eram consideradas dignas de estudo, de ensino e de aparecer na escrita respeitada. Foi preciso esperar o Renascimento para que isso acontecesse. Pois é assim que nos encontramos hoje no Brasil, numa Idade Média linguística: falamos o português brasileiro, uma língua viva, dinâmica, com gramática própria, mas ainda nos cobram o ensino e o uso de um “latim clássico”, que é o português literário consagrado antigo. E dá-lhe ensinar conjugação verbal com “vós”, regências verbais que não significam nada para nós, usos de pronomes que não correspondem ao que a gente realmente sente e quer expressar. Já passou da hora da nossa língua (e não “de a nossa língua”, por favor!) ocupar de direito o lugar que já ocupa de fato: o de língua materna de mais de 200 milhões de pessoas, uma das mais faladas do mundo, num País com crescente importância geopolítica e econômica mundial. “E deixe os portugais morrerem à míngua!”.

*Marcos Bagno é linguista, escritor e professor da UNB. 

Ref.: http://www.carosamigos.com.br/index.php/revista/204-edicao-226/5859- falar-brasileiro-a-escrita-nao-e-a-lingua-2

Considere o texto Escrita não é “a língua” para responder a questão.

Com o sintagma grifado (todos homens, é claro), no 1º. parágrafo, o autor

Alternativas
Comentários
  • achei que o termo (todos homens, é claro) foi usado pelo autor no sentido de ironia... como logo adiante, no início do 3º parágrafo ele usa (só homens, é claro!)...

    não que eu seja feminista, mas achei esse autor muito machista...

    achei meio confuso!

  • ..aqueles grandes escritores (todos homens, é claro) entendi que ele deu um ponto de vista pessoal dizendo que só existem grandes escritores homens...

     

    Gab. D

  • Ponto de vista???

  • Se esse é o ponto de vista dele, então ele é um machista do c... Pensei que ele estava sendo irônico.

  • Das duas, uma:

    Ou o autor é muito machista, ou quem formulou a questão não entendeu o que o autor expressou!

  • Questão hiper difícil, mas vamos lá:

    Gabarito letra D. Exprime seu ponto de vista sobre o que foi anteriormente afirmado.

    Se você ler o parágrafo todo você irá perceber que ele faz uma crítica em relação a restrição da acessibilidade na língua. Esta crítica ganha ênfase na expressão (todos homens, é claro). Ai está o ponto de vista do autor. 

    Vamos meus amigos e amigas, em busca de nossos objetivos.

  • O comentário, é claro, foi sim uma ironia e uma relação que era restrita, não teve machismo, muito pelo contrário.

  • Foi o ponto de vista do autor. Esse "é claro" está com tom de deboche. Pode sim ser interpretado como ironia, mas deixa claro o ponto de vista do autor (ele acha errado apenas homens serem os "letrados"). No entanto, pode ser interpretado como machismo se a pessoa ler apenas esse fragmento. Não gosto deste tipo de questão, fica muito subjetivo. A FUMARC deveria cobrar mais gramática e interpretações de textos menos subjetivas.