SóProvas


ID
2189083
Banca
COMPERVE
Órgão
Prefeitura de Ceará-Mirim - RN
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

CONTRA A MERA “TOLERÂNCIA” DAS DIFERENÇAS
Renan Quinalha
“É preciso tolerar a diversidade”. Sempre que me defronto com esse tipo de colocação, aparentemente progressista e bem-intencionada, fico indignado. Não, não é preciso tolerar.
“Tolerar”, segundo qualquer dicionário, significa algo como “suportar com indulgência”, ou seja, deixar passar com resignação, ainda que sem consentir expressamente com aquela conduta.
“Tolerar” o que é diferente consiste, antes de qualquer coisa, em atribuir a “quem tolera” um poder sobre “o que tolera”. Como se este dependesse do consentimento daquele para poder existir. “Quem tolera” acaba visto, ainda, como generoso e benevolente, por dar uma “permissão” como se fosse um favor ou um ato de bondade extrema.
Esse tipo de discurso, no fundo, nega o direito à existência autônoma do que é diferente dos padrões construídos socialmente. Mais: funciona como um expediente do desejo de estigmatizar o diferente e manter este às margens da cultura hegemônica, que traça a tênue linha divisória entre o normal e o anormal.
Tolerar não deve ser celebrado e buscado nem como ideal político e tampouco como virtude individual. Ainda que o argumento liberal enxergue, na tolerância, uma manifestação legítima e até necessária da igualdade moral básica entre os indivíduos, não é esse o seu sentido recorrente nos discursos da política.
Com efeito, ainda que a defesa liberal-igualitária da tolerância, diante de discussões controversas, postule que se trate de um respeito mútuo em um cenário de imparcialidade das instituições frente a concepções morais mais gerais, isso não pode funcionar em um mundo marcado por graves desigualdades estruturais.
Marcuse identificava dois tipos de tolerância: a passiva e a ativa. No primeiro caso, a tolerância é vista como uma resignação e uma omissão diante de uma sociedade marcadamente injusta em suas diversas dimensões. Por sua vez, no segundo caso, ele trata da tolerância como uma disposição efetiva de construção de uma sociedade igualitária. Não é este, no entanto, o discurso mais recorrente da tolerância em nossos tempos.
Assim, quando alguém lhe disser que é preciso “tolerar” a liberdade das mulheres, os direitos das pessoas LGBT, a busca por melhores condições de vida das pessoas pobres, as reivindicações por igualdade material das pessoas negras, dentre outros segmentos vulneráveis, simplesmente não problematize esse discurso.
Admitir a existência do outro não significa aceitá-lo em sua particularidade como integrante da comunidade política. É preciso, ensina Axel Honneth, valorizar os laços mais profundos de reciprocidade e respeito pelas diferenças, o que só o reconhecimento, estágio superior da tolerância, pode ajudar a promover.
Diversidade é um valor em si mesmo e não depende da concordância dos que ocupam posições de privilégios. Direitos e liberdades não se “toleram”. Devem ser respeitados e promovidos, por serem conquistas jurídicas e políticas antecedidas de muitas lutas.
O que não se pode tolerar é o discurso aparentemente “benevolente” e “generoso” – mas na verdade bem perverso – da tolerância das diferenças. Ninguém precisa da licença de ninguém para existir. 
Disponível em: . Acesso em: 12 abr. 2016. [Adaptado]

Glossário
- Axel Honneth (1949): Filósofo e sociólogo alemão, é diretor do Institut für Sozialforschung, da Universidade de Frankfurt, instituição na qual surgiu a chamada Escola de Frankfurt.
- Herbert Marcuse (1898-1979): Sociólogo e filósofo alemão, naturalizado norte-americano, pertenceu à Escola de Frankfurt. 

O propósito comunicativo dominante no texto é

Alternativas
Comentários
  • Gab D. Mas, essa "dubiedade" é de laskar. Não há um confronto?  Cita o posicionamento de adversos e rebate...

     

  • Gab. D

    Mas, acredito que a questão tenha duas respostas, com referência a opção "B".

     

    Fundamentação para opção B:

    # 2º parágrafo: “Tolerar”, segundo qualquer dicionário, significa...

    # 3º parágrafo: “Tolerar” o que é diferente consiste, antes de qualquer coisa...

    Ainda no 3º par.: “Quem tolera” acaba visto, ainda, como generoso e benevolente...

    # 7º parágrafo: "Marcuse identificava dois tipos de tolerância: a passiva e a ativa."

    # 9º parágrafo: "É preciso, ensina Axel Honneth, valorizar os laços mais profundos de reciprocidade e respeito pelas diferenças, o que só o reconhecimento, estágio superior da tolerância, pode ajudar a promover."

     

    Com relação a opção "D", também acho correta... houve sim, problematização do tema.

    Significado do dicionário on line: Formular um certo fato, matéria, conceito, etc., analisar e discutir os aspectos mais complicados ou mais difíceis; elaborar conjunto de questões articuladas; questionar; inventariar questões provisórias.

     

     

     

  • questão mal elaborada...

     

  • Odeio a comperve com todas as minhas forças por isso. A prova de português é quase toda de interpretação de texto e os gabaritos deles são desse modelo... Dá raiva demais.

  • O gabarito é o “D”, e só pode ser o “D” mesmo. Vejamos:

     

    É claro que o autor ao expor o seu sentimento e o seu ponto de vista acerca do tema tratado valeu-se da caracterização dos discursos mais recentes (gabarito B), assim como os confrontou (gabarito A), mas isso não significa que a sua intenção ao escrever esse texto tenha sido meramente isso; ora, a intenção do autor vai muito além, o que ele pretende é trazer o leitor para o cerne da discussão, para aquilo que EFETIVAMENTE interessa, é fazer o leitor raciocinar a respeito, ou seja, a sua intenção é PROBLEMATIZAR  a questão.

  • Fui de B...

  • Bem, eu entendi assim:

    A questão tentou induzir ao erro, quando no início informa "O propósito comunicativo dominante no texto é"

    Eu iria de B (caracterizar os discursos mais recorrentes sobre a tolerância.), mas percebi que não está caracterizando e sim explicando sobre diversas óticas.

     

    A letra D (problematizar o discurso mais recorrente sobre a tolerância. ), alternativa correta, foi intrudizido "problematizar" no SENTIDO de ANALISAR e sendo assim encaixa perfeitamente, visto que muito embora tenha se discutido várias definições sobre "tolerância", os parágrafos finais abordam acerca da definição mais recorrente da tolerância em nossos tempos.

  • Ele confronta sim. A problematização é notória, porém ele adota uma posição. Que posição? De discórdia, de confronto. Ele não discute o assunto de forma imparcial. No mínimo, deveria ter anulado por duplicidade de respostas possíveis. O mais interessante é saber que a banca adotou na questão seguinte a letra C como resposta "argumentativo, uma vez que defende ponto de vista a respeito do discurso mais recorrent e sobre a tolerância.", o que só faz reforçar o acerto da A.  Tem que ter muita paciência viu?!

  • Questão de alto nível de interpretação. Eu errei já duas vezes (marquei A), porém analisando a resposta considerada pela banca (D), acredito que a parte que mais se encaixa à resposta é a parte final do texto:

    "O que não se pode tolerar é o discurso aparentemente “benevolente” e “generoso” – mas na verdade bem perverso – da tolerância das diferenças. Ninguém precisa da licença de ninguém para existir."

    Entendi essa mensagem como sendo um problema relatado, no qual uma pessoa "tolerar" parece algo inofensivo, quando na verdade é algo bem perverso na visão do autor, tratando-se de um problema que vem acontecendo frequentemente.

     

    Bons estudos!

  • Concordo com João Filho. Não tem como a letra A estar errada.

    "É  preciso tolerar a diversidade”. Sempre que me defronto com esse tipo de colocação, aparentemente progressista e bem-intencionada, fico indignado. Não, não é preciso tolerar.

    Ele critica vevementemente os discursos mais recorrentes sobre a tolerância.

    Só Jesus na banca!!!

  • Eliminei A e B porque vi no texto apenas um discurso ("É preciso tolerar a diversidade” // "Esse tipo de discurso (...)") e não "discursos", como essas alternativas apontam. Partindo dessa ideia, o discurso é justificado ou problematizado? Justificado não é. Gabarito: D.

     

    Obs: segui essa lógica e deu certo, mas não sei se pensar assim está de todo correto.

  • Creio que a questão é que só se aborda um discurso específico, inclusive mencionado no texto, e não discursos no plural, como a alternativa A aponta. 

  • A colega Luciana está correta. Nesse caso, ele só rebateu UM discurso. O que falou mais alto do que os verbos no início das alternativas foi o plural dos artigos logo depois. Ele problematiza UM tipo de tolerância

     

    O propósito comunicativo dominante no texto é 

     a)

    confrontar os discursos mais recorrentes sobre a tolerância.

     b)

    caracterizar os discursos mais recorrentes sobre a tolerância.

     c)

    justificar o discurso mais recorrente sobre a tolerância.

     d)(CORRETA)

    problematizar o discurso mais recorrente sobre a tolerância.