Havia em Recife inúmeras ruas, as ruas dos ricos, ladeadas por palacetes
que ficavam no centro de grandes jardins. Eu e uma amiguinha brincávamos
muito de decidir a quem pertenciam os palacetes. “Aquele branco é meu. ” “Não,
eu já disse que os brancos são meus. ” “Mas esse não é totalmente branco, tem
janelas verdes. ” Parávamos às vezes longo tempo, a cara imprensada nas
grades, olhando.
[...] Numa das brincadeiras de “essa casa é minha”, paramos diante de
uma que parecia um pequeno castelo. No fundo via-se o imenso pomar. E, à
frente, em canteiros bem ajardinados, estavam plantadas as flores.
LISPECTOR, Clarice. Cem anos de perdão. Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.
p. 60.
A narrativa de ficção joga com sentidos duplos e figurados e explora as variadas
possibilidades da linguagem. Na obra de Clarice Lispector, para atingir uma maior
expressividade na construção do texto, destaca-se ainda a epifania. Considerando-se o
conceito de epifania na obra dessa autora, pode-se ler o conto Cem anos de perdão como