SóProvas


ID
2356564
Banca
CONSULPLAN
Órgão
CFESS
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

História de bem-te-vi
Com estas florestas de arranha-céus que vão crescendo, muita gente pensa que passarinho é coisa de jardim zoológico; e outras até acham que seja apenas antiguidade de museu. Certamente chegaremos lá; mas por enquanto ainda existem bairros afortunados onde haja uma casa, casa que tenha um quintal, quintal que tenha uma árvore. Bom será que essa árvore seja a mangueira. Pois nesse vasto palácio verde podem morar muitos passarinhos.
Os velhos cronistas desta terra encantaram-se com canindés e araras, tuins e sabiás, maracanãs e “querejuás todos azuis de cor finíssima...”. Nós esquecemos tudo: quando um poeta fala num pássaro, o leitor pensa que é leitura...
Mas há um passarinho chamado bem-te-vi. Creio que ele está para acabar.
E é pena, pois com esse nome que tem – e que é a sua própria voz – devia estar em todas as repartições e outros lugares, numa elegante gaiola, para no momento oportuno anunciar a sua presença. Seria um sobressalto providencial e sob forma tão inocente e agradável que ninguém se aborreceria.
O que leva a crer no desaparecimento do bem-te-vi são as mudanças que começo a observar na sua voz. O ano passado, aqui nas mangueiras dos meus simpáticos vizinhos, apareceu um bem-te-vi caprichoso, muito moderno, que se recusava a articular as três sílabas tradicionais do seu nome, limitando-se a gritar: “...te-vi! ...te-vi”, com a maior irreverência gramatical. Como dizem que as últimas gerações andam muito rebeldes e novidadeiras, achei natural que também os passarinhos estivessem contagiados pelo novo estilo humano.
Logo a seguir, o mesmo passarinho, ou seu filho ou seu irmão – como posso saber, com a folhagem cerrada da mangueira? – animou-se a uma audácia maior. Não quis saber das duas sílabas, e começou a gritar apenas daqui, dali, invisível e brincalhão: “...vi! ...vi!...” o que me pareceu divertido, nesta era do twist.
O tempo passou, o bem-te-vi deve ter viajado, talvez seja cosmonauta, talvez tenha voado com o seu team de futebol – que se não há de pensar de bem-te-vis assim progressistas, que rompem com o canto da família e mudam o leme dos seus brasões? Talvez tenha sido atacado por esses crioulos fortes que agora saem do mato de repente e disparam sem razão nenhuma no primeiro indivíduo que encontram.
Mas hoje ouvi um bem-te-vi cantar. E cantava assim: “Bem-bem-bem...te –vi!” Pensei: “É uma nova escola poética que se eleva da mangueira!...” Depois, o passarinho mudou. E fez: “Bem-te-te-te...vi!” Tornei a refletir: “Deve estar estudando a sua cartilha... Estará soletrando...” E o passarinho: “Bem-bem-bem...te-te-te... vi-vi-vi!”
Os ornitólogos devem saber se isso é caso comum ou raro. Eu jamais tinha ouvido uma coisa assim! Mas as crianças, que sabem mais do que eu, e vão diretas aos assuntos, ouviram, pensaram e disseram: “Que engraçado! Um bem-te-vi gago!”
(É: talvez não seja mesmo exotismo, mas apenas gagueira...)
(MEIRELES, Cecília. 1901-1964 – Escolha o seu sonho: (crônicas) – 26ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2005.) 

“... apareceu um bem-te-vi caprichoso, muito moderno, que se recusava a articular as três sílabas tradicionais do seu nome, limitando-se a gritar: “...te vi! ...te-vi!, com a maior irreverência gramatical.” (5º§) A narradora fala de irreverência gramatical porque se trata

Alternativas
Comentários
  • Não se usa pronome oblíquo átono no início da frase. Ao gritar te vi.... te vi....houve uma irreverência gramatical justamente porque o te é pronome oblíquo átono e está no início da frase.

  • Não se inicia oração com P.O.A.

  • Tudo bem que a opção "D" é mais específica para a pergunta, sendo assim a "mais correta". Mas as letras A e B também não estão erradas.

  • Errei essa. Pensei em inadequação vocabular e antes disso pensei no vocábulo completo "bem-te-vi".

  • O PROBLE MA É QUE TEM RETICENCIA E NAO É INICIO DE FRASE

     

  • Que viajem essa questão. A letra D é apenas mais especifica que as letras A e B.

  • Irreverência = desrespeito

     

    NÃO SE INICIA UMA FRASE COM PRONOME OBLIQUO ÁTONO, C isso:

    "Te vi... Te vi..." -  Desrespeita essa regra gramatical, ou seja, é irreverente/imprópria.

     

    Gab D

  • Comentário da Maisa Malta: Não se usa pronome oblíquo átono no início da frase. Ao gritar te vi.... te vi....houve uma irreverência gramatical justamente porque o te é pronome oblíquo átono e está no início da frase.

  • Letra D.

    Erro ao iniciar frases com pronomes átonos.

     

  • Eu vejo essa questão meio problemática, pois uma das grandes características da linguagem coloquial é o uso incorreto da colocação pronominal. Então a irreverência estaria na utilização coloquial do pronome, ou seja, a opção D é a mais "correta", mas a opção B não está errada. 

    Um exemplo clássico de que a opção B não estaria errada é esse poema de Oswald de Andrade: 

    Dê-me um cigarro
    Diz a gramática
    Do professor e do aluno
    E do mulato sabido
    Mas o bom negro e o bom branco
    Da Nação Brasileira
    Dizem todos os dias
    Deixa disso camarada
    Me dá um cigarro

    Eu vejo a opção B e D como complementares. Essa questão deveria ter sido anulada com certeza, pois ambas não se excluem de fato.

  • Questão nojenta de avaliador fdp! A e B tb são correta! Somente os amigos do avaliador acertaram essa!

  • Ao meu ver, te-vi não se enquadra como frase e sim como substantivo, portanto não há pronome.
  • uau! aprendendo aqui, se souber o signficado da palavra irreverência, o gabarito fica fácil. Eu errei, porque achava que sabia o que era irreverente.

    Irreverente, segundo o dicionário 

    Ausência de reverência; falta de respeito; desacato.

  • A impropriedade do uso do pronome átono se dá porque o correto é "a vi" e não "te vi" 

  • Impropriedade no uso do pronome é inadequação vocabular e, no caso, também linguagem coloquial. Tem 3 respostas certas.