SóProvas


ID
2356684
Banca
CONSULPLAN
Órgão
CFESS
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                            São só contas de vidro

      Os índios ficaram deslumbrados com as contas de vidro que os portugueses lhes davam. Por quê? Por causa da beleza dessas contas de vidro? Pouco provável. Para encontrar coisas belas, tudo o que os nativos tinham de fazer era olhar ao redor: as árvores, os pássaros, as flores. Mas as contas de vidro representavam duas coisas. Em primeiro lugar, eram novidade, coisa desconhecida por ali. Em segundo lugar, eram novidade, de uma tecnologia que os índios não dominavam e que, por isso, admiravam. Mais de cinco séculos se passaram e continuamos dominados pela mesma reverência à tecnologia. Exemplo: o automóvel tem absoluta prioridade em relação aos pedestres, mesmo em situações em que estes são vários e em que o veículo transporta uma única pessoa. Muitos brasileiros ficam assombrados ao saber que em Brasília os motoristas respeitam a faixa de segurança. Em outras cidades, faixa de segurança é mero detalhe, pouco importante diante da potência que é o automóvel. Isso também explica a quantidade de acidentes de trânsito que temos; a sensação de poder de que goza o motorista muitas vezes perturba sua capacidade de discernimento.

      O verdadeiro progresso traz junto consigo os mecanismos de controle para esses excessos. Na Europa e nos Estados Unidos, os motoristas, em geral (claro que há numerosas exceções), dirigem com cautela, pela simples razão de que podem responder no tribunal por qualquer problema, até mesmo psicológico, que venham a causar a outras pessoas. A noção de espaço público lá está muito presente. No Brasil é diferente. Se o espaço é público, isso não significa que é de todos, que todos têm de cuidar dele; não, se o espaço é público, ele não é de ninguém. Nos cinemas brasileiros, celulares tocam com frequência e às vezes seus proprietários mantêm longas conversas, em voz alta, durante a exibição do filme. Os outros espectadores que se lixem. Existe aí um motivo adicional, além do desrespeito ao local coletivo. O telefone, no Brasil, ainda guarda a aura de um passado em que era privilégio de poucos. Conseguir uma linha era missão quase impossível. Quem tinha telefone tinha poder, e esta imagem, de certo modo, persiste. Infelizmente, porque poucos meios de comunicação são tão invasivos. Cartas e e-mails ficam pacientemente à nossa espera. O telefone, não. O telefone soa insistentemente, e temos de atender, não importa o que estejamos fazendo no momento – almoçando, tomando banho, fazendo amor. E quem liga também não dá bola para esses detalhes. A elementar pergunta – “Você pode falar? ” – raramente é feita. Ligação telefônica desloca para um segundo plano qualquer outra coisa. Digamos que você esteja sendo atendido por um funcionário no banco. Se tocar o telefone, você e todos os outros que estão esperando terão de se conformar: o funcionário atenderá à chamada, não raro longa.

      O celular é ótima coisa. Pessoas que, por falta de telefone, ficavam em verdadeiro estado de marginalização social, agora podem se comunicar facilmente. Existe hoje uma verdadeira cultura do celular, mas ela, infelizmente, ainda não inclui a noção de respeito ao outro. Chegaremos lá, claro, se não mediante leis, como fazem os países mais adiantados, então pela evolução natural da arte do convívio. As pessoas aprendem. E um dia descobrem que as brilhantes contas de vidro são só isto: contas de vidro.

              (SCLIAR, Moacyr. Do jeito que nós vivemos. Belo Horizonte: Ed. Leitura, 2007.)

De acordo com o contexto, a manutenção do objeto discursivo “espaço público” é feita através de:

I. todos.

II. ninguém.

III. local coletivo.

IV. ele (em “ele não é de ninguém”).

Estão corretas apenas as alternativas

Alternativas
Comentários
  • Boa questão

  • não entendi...

  • WTF?

  • Manutenção do objeto discursivo "espaço público" - palavras que foram utilizadas para se referir a "espaço público".

  • Thais,

    A dificuldade da questão está em interpretar a pergunta, o que vem a ser essa "manutenção" do objeto do discurso.

    O objeto do discurso está bem claro que é o espaço público e como nós brasileiros lidamos com ele. Faz uma comparação com o comportamento das pessoas no trânsito dos Estados Unidos, assim como também, o comportamento das pessoas em Brasília ao respeitarem a faixa de pedestre e o fato desse comportamento causar estranheza em muitos. 

    "Manutenção", no texto, significa uma forma de retomar, de se referir a palavra "espaço público", utilizando sinônimo e promone, sem ter que ser redundante.

    Espero ter ajudado.

  • Gabarito letra A.

    As assertivas III (local coletivo) e IV (ele - em "ele não é de ninguém) retomam a palavra "espaço público" no texto.

    É só lembrar da anáfora!!!

  • Gabarito: A

     

    Resposta da Consulplan ao recurso interposto contra essa questão:

     

    Recurso Improcedente. Ratifica-se a opção divulgada no gabarito preliminar. A alternativa “C) I, II e IV. ” não pode ser considerada correta.

    De acordo com o contexto, a manutenção do objeto discursivo “espaço público” é feita através de:

    I. todos.

    II. ninguém.

    III. local coletivo.

    IV. ele (em “ele não é de ninguém”).

    Apenas os itens III e IV contribuem para a manutenção de “espaço público”.

     

    Em “A noção de espaço público lá está muito presente. No Brasil é diferente. Se o espaço é público, isso não significa que é de todos, que todos têm de cuidar dele; não, se o espaço é público, ele não é de ninguém. ” (2º§)

     

    O termo “todos” não se refere a “espaço público”, “todos” são as pessoas que ocupam ou utilizam o espaço público.

     

    O termo “ninguém” também não tem como referente “espaço público”, trata-se de um pronome indefinido significando “nenhuma pessoa”.

     

    Em “Nos cinemas brasileiros, celulares tocam com frequência e às vezes seus proprietários mantêm longas conversas, em voz alta, durante a exibição do filme. Os outros espectadores que se lixem. Existe aí um motivo adicional, além do desrespeito ao local coletivo. ” (2º§) é possível identificar a expressão local coletivo” em referência ao espaço público assim como “ele” em “ele não é de ninguém”, ou seja, o espaço público não é de ninguém.

     

    Fonte:  GARCIA, O. M. Comunicação em prosa moderna: aprenda a escrever, aprendendo a pensar. 26. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006.  Koch, Ingedore. Elias, Vanda Maria. Ler e compreender os sentidos do texto. Ed. Contexto.

  • WTF2?

    #pelamordeDeus!

    Às vezes da vontade de desistir de estudar! 

  • Custei a entender o que o enunciado pedia. Raciocinei assim: quais elementos substituem "espaço público" no texto? Seriam "local coletivo" e "ele".

  • uma merda de questão dessas faz você desanimar viu!

  • Lendo os comentários acima, consegui entender e era até tranquila a questão. Mas esse enunciado está impossível de enteder!

  • DIFÍCIL É ENTENDER A QUESTÃO. UMA VEZ ENTENDIDA FICA FÁCIL. MAS, PARA ISSO, PRECISARÍAMOS DE UM TRADUTOR NA HORA DA PROVA... :(

  • A resolução da questão em si é muito simples, mas, para não perder o hábito da banca, o enunciado beira o subjetivismo.

  • Por isso que eu amo o CESPE, faz questões difíceis, mas mais justas. Não inventa moda. Os candidatos não tem que adivinhar o que o enunciado quer dizer, nao tem que traduzir o que a banca quiz dizer na questão.

  • Demorei nessa questão, se viesse na prova iria perder uns 15 minutos.

    Até que entendi enfim o que era essa manutenção do objeto discursivo. Questão osso essa!