Há alguns séculos, o olhar da literatura tem como foco
central o homem em suas relações com o outro. Porém,
muitas vezes, este outro não é humano, mas sim um
animal. São muitos os exemplos na literatura universal
de obras que conferem protagonismo aos bichos: das
fábulas de Esopo à baleia Mobydick, da Revolução
dos Bichos a Maus. A fera selvagem que amedronta
o homem, o ser que sofre pela própria ação humana
ou o companheiro de todas as horas são alguns dos
exemplos de animais também presentes na literatura
em língua portuguesa, sendo o tema de discussão
nesta prova.
INSTRUÇÃO: Para responder à questão,
leia o excerto de “O burrinho pedrês”, de João Guimarães
Rosa.
Era um Burrinho Pedrês, miúdo e resignado, vindo de
Passa-Tempo, Conceição do Serro, ou não sei onde no
sertão. Chamava-se Sete-de-Ouros, e já fora tão bom,
como outro não existiu e nem pode haver igual. Agora,
porém, estava idoso, muito idoso. Tanto, que nem seria
preciso abaixar-lhe a maxila teimosa, para espiar os
cantos dos dentes. Era decrépito mesmo a distância: no
algodão bruto do pelo – sementinhas escuras em rama
rala e encardida; nos olhos remelentos, cor de bismuto,
com pálpebras rosadas, quase sempre oclusas, em
constante semissono; e na linha, fatigada e respeitável
– uma horizontal perfeita, do começo da testa à raiz da
cauda em pêndulo amplo, para cá, para lá, tangendo
as moscas. Na mocidade, muitas coisas lhe haviam
acontecido. Fora comprado, dado, trocado e revendido,
vezes, por bons e maus preços. Em cima dele morrera
um tropeiro do Indaiá, baleado pelas costas. Trouxera,
um dia, do pasto – coisa muito rara para essa raça de
cobras – uma jararacussu, pendurada do focinho, como
linda tromba negra com diagonais amarelas, da qual
não morreu porque a lua era boa e o benzedor acudiu
pronto. Vinha-lhe de padrinho jogador de truque a última
intitulação, de baralho, de manilha; mas, vida a fora, por
anos e anos, outras tivera, sempre involuntariamente.
(...) De que fosse bem tratado, discordar não havia, pois
lhe faltavam carrapichos ou carrapatos, na crina - reta,
curta e levantada, como uma escova de dentes.
Com base no excerto, preencha os parênteses com V
para verdadeiro e F para falso.
( ) O narrador constrói um discurso que confronta um
presente decadente com um passado conturbado.
( ) O narrador preocupa-se com a exatidão naquilo
que conta para conferir verossimilhança ao relato.
( ) É sugerido pelo narrador que a degradação física
do animal tem relação com os maus tratos promovidos
pelo seu atual dono.
( ) No evento da cobra, o narrador substitui uma explicação
científica pela superstição.
A sequência correta de preenchimento dos parênteses,
de cima para baixo, é: