SóProvas


ID
2537740
Banca
IBFC
Órgão
TJ-PE
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto I


                                                     Os outros


      Você não acha estranho que existam os outros? Eu também não achava, até que anteontem, quando tive o que, por falta de nome melhor, chamei de SCA – Súbita Consciência da Alteridade.

      Estava no carro, esperando o farol abrir, e comecei a observar um pedestre, vindo pela calçada. Foi então que, do nada, senti o espasmo filosófico, a fisgada ontológica. Simplesmente entendi, naquele instante, que o pedestre era um outro: via o mundo por seus próprios olhos, sentia um gosto em sua boca, um peso sobre seus ombros, tinha antepassados, medo da morte e achava que as unhas dos pés dele eram absolutamente normais – estranhas eram as minhas e as suas, caro leitor, pois somos os outros da vida dele.

      O farol abriu, o pedestre ficou pra trás, mas eu não conseguia parar de pensar que ele agora estava no quarteirão de cima, aprisionado em seus pensamentos, embalado por sua pele, tão centro do Cosmos e da Criação quanto eu, você e sua tia-avó.

      Sei que o que eu estou dizendo é de uma obviedade tacanha, mas não são essas verdades as mais difíceis de enxergar? A morte, por exemplo. Você sabe, racionalmente, que um dia vai morrer. Mas, cá entre nós: você acredita mesmo que isso seja possível? Claro que não! Afinal, você é você! Se você acabar, acaba tudo e, convenhamos, isso não faz o menor sentido.

      As formigas não são assim. Elas não sabem que existem. E, se alguma consciência elas têm, é de que não são o centro nem do próprio formigueiro. Vi um documentário ontem de noite. Diante de um riacho, as saúvas africanas se metiam na água e formavam uma ponte, com seus próprios corpos, para que as outras passassem. Morriam afogadas, para que o formigueiro sobrevivesse.

      Não, nenhuma compaixão cristã brotou em mim naquele momento, nenhuma solidariedade pela formiga desconhecida. (Deus me livre, ser saúva africana!). O que senti foi uma imensa curiosidade de saber o que o pedestre estava fazendo naquela hora. Estaria vendo o mesmo documentário? Dormindo? Desejando a mulher do próximo? Afinal, ele estava existindo, e continua existindo agora, assim como eu, você, o Bill Clinton, o Moraes Moreira. São sete bilhões de narradores em primeira pessoa soltos por aí, crentes que, se Deus existe, é conosco que virá puxar papo, qualquer dia desses. Sete bilhões de mundinhos. Sete bilhões de chulés. Sete bilhões de irritações, sistemas digestivos, músicas chicletentas que não desgrudam da cabeça e a esperança quase tangível de que, mês que vem, ganharemos na loteria. Até a rainha da Inglaterra, agorinha mesmo, tá lá, minhocando as coisas dela, em inglês, por debaixo da coroa. Não é estranhíssimo?

(PRATA, Antônio. Os outros. In: Meio intelectual, meio de esquerda. São Paulo: Editora 34, 2010. p17-18)

No trecho “Até a rainha da Inglaterra, agorinha mesmo, tá lá, minhocando as coisas dela, em inglês, por debaixo da coroa. Não é estranhíssimo?“ (6º§), ocorrem vários exemplos do registro informal da língua. Dentre as alternativas abaixo, assinale aquela que se diferencia das demais por NÃO ilustrar tal informalidade e ser exemplo do padrão culto.

Alternativas
Comentários
  • Analisando as alternativas:

     

    a) “agorinha mesmo”. 

    Errada. Porque apresenta coloquialismo.

     

     

    b) “tá lá”.

    Errada. Porque apresenta coloquialismo através da palavra 'tá'.

     

     

    c) “minhocando”. 

    Errada. A palavra acima nos dá ideia de neologismo( emprego de palavras novas, derivadas ou formadas de outras já existentes, na mesma língua ou não. ) apesar de existir o verbo minhocar, entretanto no excerto acima essa está com um sentido diferente.

     

     

    d) “coisas”. 

    Errada. A palavra acima apresenta traços de coloquialismo

     

     

     

     

     

    Qcom - Questão comentada

    https://www.youtube.com/channel/UCBY27FNGgRpPa-PgFubwjPQ

  • Adjetivos Superlativo Absoluto

    Analitica; a intensificação se faz com o auxílio de palavras que dão ideia de intensidade.(advérbios)

    Ex; O secretário é muito inteligente.

    Sintético; intensificação se faz por meio do acréscimo de sufixos.

    O secretário é inteligentíssimo.

    estranhíssimo > adjetivo superlativo sintético

     

  • Nossa, jurava que era "coisa" :(

  • A gramática classifica o estranhíssimo como Adjetivo de grau superlativo absoluto sintético.

  • Eu acertei, mas acredito que a questão é passível de recurso: a letra D também é certa, na minha opinião. Não há coloquialidade na palavra "coisas".

  • GABARITO: E

  • Eu fiquei em dúvida entre as duas últimas. Não consigo entender pq coisas é "informal"...

  • "Coisa" é informal quando está substituindo um substantivo mais adequado gerando ambiguidade ou imprecisão sobre exatamente ao que se refere.

    Pega o coiso para mim, por favor!

    Pega o controle para mim, por favor!

    Odeio aquela coisa verde.

    Odeio espinafre.

    "minhocando as coisas dela"

    É genérico e informal.