SóProvas


ID
2670706
Banca
INSTITUTO AOCP
Órgão
ITEP - RN
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                 Cuidar de idoso não é só cumprir tarefa, é

                             preciso dar carinho e escuta     

                                                                                                 Cláudia Colluci


      A maior taxa de suicídios no Brasil se concentra entre idosos acima de 70 anos, segundo dados recentes divulgados pelo Ministério da Saúde. São 8,9 mortes por 100 mil pessoas, contra 5,5 por 100 mil entre a população em geral. Pesquisas anteriores já haviam apontado esse grupo etário como o de maior risco. Abandono da família, maior grau de dependência e depressão são alguns dos fatores de risco.

      Em se tratando de idosos, há outras mortes passíveis de prevenção se o país tivesse políticas públicas voltadas para esse fim. Ano passado, uma em cada três pessoas mortas por atropelamento em São Paulo tinha 60 anos ou mais. Pessoas mais velhas perdem reflexos e parte da visão (especialmente a lateral) e da audição por conta da idade.

      Levando em conta que o perfil da população brasileira mudará drasticamente nos próximos anos e que, a partir de 2030, o país terá mais idosos do que crianças, já passou da hora de governos e sociedade em geral encararem com seriedade os cuidados com os nossos velhos, que hoje somam 29,4 milhões (14,3% da população).

      Com a mudança do perfil das famílias (poucos filhos, que trabalham fora e que moram longe dos seus velhos), faltam cuidadores em casa. Também são poucos os que conseguem bancar cuidadores profissionais ou casas de repouso de qualidade. As famílias que têm idosos acamados enfrentam desafios ainda maiores quando não encontram suporte e orientação nos sistemas de saúde.

      Recentemente, estive cuidando do meu pai de 87 anos, que se submeteu à implantação de um marca-passo. Após a alta hospitalar, foi um susto atrás do outro. Primeiro, a pressão arterial disparou (ele já teve dois infartos e carrega quatro stents no coração), depois um dos pontos do corte cirúrgico se rompeu (risco de infecção) e, por último, o braço imobilizado começou a inchar muito (perigo de trombose venosa). Diante da recusa dele em ir ao pronto atendimento, da demora de retorno do médico que o assistiu na cirurgia e sem um serviço de retaguarda do plano de saúde ou do hospital, a sensação de desamparo foi desesperadora. Mas essas situações também trazem lições. A principal é a de que o cuidado não se traduz apenas no cumprimento de tarefas, como fazer o curativo, medir a pressão, ajudar no banho ou preparar a comida. Cuidado envolve, sobretudo, carinho e escuta. É demonstrar que você está junto, que ele não está sozinho em suas dores.

      Meu pai é um homem simples, do campo, que conheceu a enxada aos sete anos de idade. Aos oito, já ordenhava vacas, mas ainda não conhecia um abraço. Foi da professora que ganhou o primeiro. Com o cultivo da terra, formou uma família, educou duas filhas. Lidar com a terra continua sendo a sua terapia diária. É onde encontra forças para enfrentar o luto pelas mortes da minha mãe, de parentes e de amigos. É onde descobre caminhos para as limitações que a idade vai impondo ("não consigo mais cuidar da horta, então vou plantar mandioca").

      Ouvir do médico que só estará liberado para suas atividades normais em três meses foi um baque para o meu velho. Ficou amuado, triste. Em um primeiro momento, dei bronca ("pai, a cirurgia foi um sucesso, custa ter um pouco mais de paciência?"). Depois, ao me colocar no lugar desse octogenário hiperativo, que até dois meses atrás estava trepado em um abacateiro, podando-o, mudei o meu discurso ("vai ser um saco mesmo, pai, mas vamos encontrar coisas que você consiga fazer no dia a dia com o aval do médico"). 

      Sim, envelhecer é um desafio sob vários pontos de vista. Mas pode ficar ainda pior quando os nossos velhos não contam com uma rede de proteção, seja do Estado, da comunidade ou da própria família.

      Os números de suicídio estão aí para ilustrar muito bem esse cenário de abandono, de solidão. Uma das propostas do Ministério da Saúde para prevenir essas mortes é a ampliação dos Centros de Atenção Psicossocial (Caps). A presença desses serviços está associada à diminuição de 14% do risco de suicídio. Essa medida é prioritária, mas, em se tratando da prevenção de suicídio entre idosos, não é o bastante.

      Mais do que diagnosticar e tratar a depressão, apontada como um dos mais importantes fatores desencadeadores do suicídio, é preciso que políticas públicas e profissionais de saúde ajudem os idosos a prevenir/diminuir dependências para que tenham condições de sair de casa com segurança, sem o risco de morrerem atropelados ou de cair nas calçadas intransitáveis, que ações sociais os auxiliem a ter uma vida de mais interação na comunidade. E, principalmente, que as famílias prestem mais atenção aos seus velhos. Eles merecem chegar com mais dignidade ao final da vida.


Adaptado de <http://www1.folha.uol.com.br/ colunas/claudiacollucci/ 2017/ 09/1921719-cuidar-de-idoso-nao-e-so-cumprir-tarefa-e-preciso-dar-carinho-e-escuta.shtml 26/09/2017> . Acesso em: 6 dez. 2017.

“Cuidar de idoso não é só cumprir tarefa, é preciso carinho e escuta” é um texto em que

Alternativas
Comentários
  • O título já nos dá uma dica: " Cuidar de idoso não é só cumprir tarefa, é preciso dar carinho e escuta "

     

    A autora já no título mostra qual a sua tese , e ao decorrer do texto ela utiliza informações e dados de pesquisas ( marcando um texto dissertativo-expositivo) , mas tabém utiliza argumentos subjetivos (marcando um texto dissertativo-argumentativo) para convencer o leitor  de que cuidar de idoso não é só cumprir tarefa , é preciso dar carinho e escuta.

     

    Os artigos de opinião nada mas são do que textos dissertativos-argumentativos. 

  • Gabarito:

    b) um dos principais objetivos é expor e argumentar em favor de um determinado ponto de vista, como ocorre em textos produzidos sob o formato do gênero artigo de opinião.

  • Que texto!! Me fez até repensar algumas coisas... A verdade tem que ser dita!! Reclamamos muito dessa banca, mas os textos que ela traz em português são ótimos!!...

  • Gente essa banca só coloca textos maravilhosos! Textos que nos fazem pensar, refletir...UauU...encantada.

  • Esse texto é um verdadeiro tapa de luva em nossa sociedade individualista e egoísta. Valorizemos nossos velhos. Depois que partirem será tarde pra arrependimentos.

  • A questão trabalha com gênero textual. Dessa forma, é importante identificar cada um e suas características.

    a) o principal objetivo é apresentar a narrativa de uma história, como ocorre em textos produzidos sob o formato do gênero crônica.

    Incorreta. Não se trata de uma crônica, pois não há apenas trechos narrativos no texto.

    b) um dos principais objetivos é expor e argumentar em favor de um determinado ponto de vista, como ocorre em textos produzidos sob o formato do gênero artigo de opinião.

    Correta. Percebemos, ao longo da leitura, que a autora inclui dados para embasar sua tese. Dessa forma, temos um artigo de opinião.

    c) um dos principais objetivos é informar o leitor sobre um evento decorrido, como acontece em textos produzidos sob o formato do gênero reportagem.

    Incorreta. O texto não é apenas expositivo. A autora coloca sua opinião. Portanto, não pode ser uma reportagem.

    d) um dos principais objetivos é descrever e criticar tanto positiva quanto negativamente um objeto, como ocorre em textos produzidos sob o formato do gênero resenha.

    Incorreta. A autora não faz críticas acerca de um objeto, mas sim sobre um tema.

    e) um dos principais objetivos é sugerir, indicar ou mesmo ordenar como se deve agir diante de determinada situação, como ocorre em textos produzidos sob o formato do gênero manual de instruções.

    Incorreta. A autora não elenca instruções ou dicas. Portanto, não pode ser um manual.

    Gabarito do professor: B
  • Quero deixar uma sugestão : por favor aumentem as questões comentadas por professores .

  • Os textos da banca AOCP são realmente muito bons, só a banca que não presta mesmo...

  • Eu vim para estudar, mas me deparo com essa beleza, que texto!

  • passei 11 minutos para ler e responder e ainda errei, sacanagem viu

  • Belíssimo texto. Vale muito a reflexão e, obviamente, a prática.

  • Encantada com esse texto maravilhoso. Que sensibilidade! Achei tão interessante, que li somente uma vez e retive as informações.

  • Isso seria tipologia textual? Por quê nos conceitos não consegui ver nada disso, eles mudam totalmente a linguagem do conceito, acho estranho isso! Mas eles são a banca, fazer o quê!!

  • Só comentários que não ajudam a responder à questão.

  • Que texto! Respondendo às questões e parei uns 5 min pensativo.