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ID
2684563
Banca
VUNESP
Órgão
Câmara Municipal de São José dos Campos - SP
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

      Teria eu meus seis, meus sete anos. Perto da gente, morava o “casal feliz”. Ponho as aspas porque o fato merece. Vamos que eu pergunte, ao leitor, de supetão: – “Você conhece muitos ‘casais felizes’?” Aí está uma pergunta trágica. Muitos afirmam: – “A coabitação impede a felicidade” etc. etc. Não serei tão radical. Nem podemos exigir que marido e mulher morem um no Leblon e outro para lá da praça Saenz Peña. Seja como for, uma coisa parece certa: – o “casal feliz” constitui uma raridade.

      Normalmente, marido e mulher têm uma relação de arestas e não de afinidades. Tantas vezes a vida conjugal é tecida de equívocos, de irritações, ressentimentos, dúvidas, berros etc. etc. Mas o “casal feliz” de Aldeia Campista conseguira, graças a Deus, eliminar todas as incompatibilidades. Era a mais doce convivência da rua, do bairro, talvez da cidade. Quando passavam, de braços, pela calçada, havia o sussurro espavorido: – “Olha o casal feliz!”. Da minha janela, eu os via como dois monstros.

      Estavam casados há quinze anos e não havia, na história desse amor, a lembrança de um grito, de uma impaciência, de uma indelicadeza. Até que chegou um dia de Carnaval e, justamente, a terça-feira gorda. O marido saiu para visitar uma tia doente, não sei onde. A mulher veio trazê-lo até o portão. Beijaram-se como se ele estivesse partindo para a guerra. E, no penúltimo beijo, diz a santa senhora: – “Meu filho, vem cedo, que eu quero ver os blocos”. Ele fez que sim. E ainda se beijaram diante da vizinhança invejosa e frustrada. Depois, ela esperou que ele dobrasse a esquina. E as horas foram passando. A partir das seis da tarde ficou a esposa no portão. Sete, oito, nove da noite. Os relógios não paravam. Dez da noite, onze. E, por fim, o marido chegou. Onze.

      O “casal feliz” foi parar no distrito.

      Pois bem, contei o episódio para mostrar como o “irrelevante” influi nas leis do amor e do ódio. Por causa de uma mísera terça-feira gorda, ruía por terra toda uma pirâmide de afinidades laboriosamente acumuladas. No dia seguinte, separaram-se para sempre.

           (Nelson Rodrigues, O reacionário – memórias e confissões. Adaptado)

Ao informar por que põe entre aspas a expressão “casal feliz” (Ponho as aspas porque o fato merece. – 1° parágrafo), o narrador destaca

Alternativas
Comentários
  • Acredito que a respota esteja no trecho:

     

    "Pois bem, contei o episódio para mostrar como o "irrelevante" influi nas leis do amor e do ódio. Por causa de uma mísera terça-feira gorda ruía por terra toda uma pirâmide de afinidades laboriosamente acumuladas." [...]

  • Texto maneiro! Nelson Rodrigues era foda. Melhor que os textos esquerdistas do Hélio Sch. que a VUNESP adora.

  • Achei excelente também! 

    Até porque muitos candidatos procuram a resposta apenas no conteúdo do texto destacado na questão quando, muitas vezes, o contexto já responde perfeitamente o que é pedido. Basta ler! 

    Infelizmente, somos de uma geração que pouca gente gosta de verdade de leitura.

    Sorte a nossa que gostamos! ;)

  • Resposta correta (B)

     b) que as relações afetivas podem ser desestabilizadas por acontecimento casual de pouca importância.


    "Por causa de uma mísera terça-feira gorda, ruía por terra toda uma pirâmide de afinidades laboriosamente acumuladas. No dia seguinte, separaram-se para sempre".

  • A alternativa D também está correta, caso seja levado em consideração o fragmento: " Teria eu meus seis, meus sete anos. Perto da gente, morava o “casal feliz”. Ponho as aspas porque o fato merece. Vamos que eu pergunte, ao leitor, de supetão: – “Você conhece muitos ‘casais felizes’?” Aí está uma pergunta trágica. Muitos afirmam: – “A coabitação impede a felicidade” etc. etc. Não serei tão radical. Nem podemos exigir que marido e mulher morem um no Leblon e outro para lá da praça Saenz Peña. Seja como for, uma coisa parece certa: – o “casal feliz” constitui uma raridade."


    Eu e dezenas de conhecidos entramos com recurso e aguardamos deferimento. 

  • A mim, a questão é fácil, mas precisa de muita atenção. A resposta das aspas só vem no final! 

    Bom texto! 

  • Essa derruba facilmente o candidato que não gosta de ler o texto todo. A questão fez referência no primeiro parágrafo, e a resposta estava no último. Quase que eu erro pois também faço isso. Fica de alerta...

  • Bom para ficar esperto..Errei feio e, ainda demorei para responder.

  • Gabarito B

  • acho que por destacar o 1 paragrafo da uma escolha na letra D.

  • Pesado

  • Apesar de concordar com o gabarito, acho que nem a alternativa b) nem a d) são suficientemente corretas.

    O trecho destacado fala: " “casal feliz” (Ponho as aspas porque o fato merece. "

    A alternativa b) fala que o narrador destaca que:

    que as relações afetivas podem ser desestabilizadas por acontecimento casual de pouca importância.

    Enquanto que a alternativa d) fala que o destaque está na:

    a incerteza da maioria das pessoas acerca dos casamentos que se sustentam apenas em aparências.

    Gente. O acontecimento não é "casual de pouca importância". O autor do texto coloca aspas em "casal feliz" "porque o fato merece". Se o fato merece, o fato é relevante. Não é de pouca importância. Não faria o menor sentido escrever uma crônica com base em um acontecimento trivial sem importância ao autor. Está fora a alternativa b).

    Com relação à d), também não é satisfatória. Encontramos aspas em "casal feliz" porque "o fato merece". Ponto. Essa alternativa não é incorreta mas não responde a pergunta.

    Bons estudos!

  • Nível "HARD"

  • Questão grátis.

  • O comentário do Valnei Franco matou a questão. Boa!

  •       O “casal feliz” foi parar no distrito.

          Pois bem, contei o episódio para mostrar como o “irrelevante” influi nas leis do amor e do ódio. Por causa de uma mísera terça-feira gorda, ruía por terra toda uma pirâmide de afinidades laboriosamente acumuladas. No dia seguinte, separaram-se para sempre.


    GABARITO -> [B]

  • MAS NÃO ERA PARA ANALISAR SOMENTE O PRIMEIRO PARÁGRAFO?

  • SENSACIONAL VALNEI FRANCO. DICA GUARDADA. VALEU!

  • Questão difícil, pois o comando da questão destaca o primeiro parágrafo. É difícil prever o que a questão quer, marquei a ''D'' temendo ser a ''B''.

  • Não sei pq tão achando que é a letra D, se por nenhum momento o autor fala no texto que o relacionamento do casal era de aparências. O final do texto encaixa perfeitamente na letra B:

    "Pois bem, contei o episódio para mostrar como o “irrelevante” influi nas leis do amor e do ódio. Por causa de uma mísera terça-feira gorda, ruía por terra toda uma pirâmide de afinidades laboriosamente acumuladas. No dia seguinte, separaram-se para sempre."

  • Se antes já era raridade um casal feliz, imagina nos tempos modernos de hoje. Muitas afloradas e aflorados...

  • Difícil duas alternativas corretas mas a pergunta não direciona a alternativa que é correta pela banca. Impossível acertar desse jeito.