SóProvas


ID
2738929
Banca
FUNRIO
Órgão
AL-RR
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

TEXTO I


Anotações sobre uma pichação


    Faz provavelmente uns dois anos que topei com a frase pela primeira vez, num muro qualquer da cidade. Em pouco tempo, era impossível deixar de vêla. Da noite para o dia, como uma infecção, onde houvesse um tapume, muro, parede, empena ou porta de ferro, ela aparecia: Não fui eu.

    É certo que, pichada num muro de Estocolmo, os sentidos que ganharia seriam outros, e não há dificuldade em imaginar que conteúdos ela traria à tona em Berlim. História e geografia aqui são determinantes. O passado é tudo.

    Minha hipótese é de que, no Brasil, a frase é imediatamente lida como um protesto de inocência. A um brasileiro não ocorrerá interpretá-la como manifestação de modéstia, como recusa de um crédito indevido – Não, essa honra não me cabe, ou Não, o mérito não é meu. Como violência, desigualdade e desordem formam a teia de nossa existência cívica, o que se insinua nas entrelinhas de Não fui eu não é a virtude, mas o delito.

    Delito dos outros, no caso. A transferência de ônus é o que parece dar força ao enunciado, na medida em que fundamenta uma verdade incômoda sobre nossa condição de cidadãos brasileiros. Como tantos de nós, o autor está tirando o corpo fora.

Ignora-se a identidade do autor dessa frase com a qual o carioca convive há anos e que continua a se disseminar pelas superfícies da cidade. Numa reportagem de 2017 da Veja Rio, ele afirma que se manterá no anonimato: “Se a pichação funciona como uma assinatura que reivindica a autoria, meu trabalho é uma assinatura que nega a própria autoria. Comecei a me interessar pela potência poética que surgia disso e pelas diferentes leituras que a frase poderia ter na rua.”

    Fez bem. Não sendo enunciada por ninguém em particular, a frase pertence a qualquer um. A sensação difusa de que ela exprime um éthos*, de que essas três palavras falam de nós, é uma confirmação de que, dado o alheamento geral, o melhor mesmo é jogar a toalha e ir cuidar da vida.

(*Éthos: palavra com origem grega, que significa "caráter moral")


SALLES, João Moreira. Revista PIAUÍ, 2018. (Adaptado)

O texto Anotações sobre uma pichação é do tipo argumentativo. Realizando-se uma atenta leitura, pode-se inferir que a tese defendida pelo autor, em relação à frase Não fui eu, no Brasil, apresenta implicitamente a ideia de

Alternativas
Comentários
  • Parte do texto que embasa a resposta: " o que se insinua nas entrelinhas de Não fui eu não é a virtude, mas o delito."

     

    Gabarito: B

  • Não compreendi, alguém poderia me explicar melhor?

  • Tem que ver o texto pela ótica do autor.

    No texto o autor fala sobre uma pichação em forma de manifestação, se esta frase "Não fui eu" fosse escrita em outro pais, como citado no texto, em Estocolmo ou em Berlim, teria uma interpretação histórica diferente.

    Mas no Brasil a sociedade em geral percebe a frase como se fosse uma exclusão de um crime.


    Mas não é isso que o examinador quer saber, ele pede para INFERIR (Deduzir, interpretar) o que o autor quer dizer com o texto, e isto fica mais claro na frase "Não, essa honra não me cabe, ou Não, o mérito não é meu"

  • "O que se insinua nas entrelinhas de Não fui eu não é a virtude, mas o delito

    Alternativa B. A mesma confirma o que o autor enfatiza de acordo com o termo "isenção", ou seja, o brasileiro tende a ver a frase Não fui  eu, como a isenção de culpa.