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ID
2884297
Banca
IDECAN
Órgão
CRF-SP
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                              Um motivo para chorar

                                                                                             (Olden Hugo.)


      Era um café da manhã, por volta das sete, a mim fato corriqueiro, na padaria da rua Maricá. Um homem estava já à mesa menor, só, com pães intactos e apenas o café sendo bebericado, sem aparentar gosto nesse ato. Permaneceu assim por grupos de minutos. Seus olhos focavam, através do vidro, o nada da movimentação expedita de automóveis, bicicletas, cães e pessoas. Houve uma lágrima.

      Engoli com esforço quando notei o choro emudecido daquele homem. Sua expressão se inalterou no rosto. Era fato bastante enigmático. Não tive reação precisa. Mais lágrimas vieram. Meu café demorou mais que o costumeiro. Pensei em oferecer-lhe um lenço, em perguntar se precisava de algo. Nada disso fiz.

      Vieram a meu coração tantas razões quantas possíveis capazes de levá-lo a emoção extrema.

      Era sem dúvida a perda de alguém para a morte inexorável, irreversível. É o motivo mais justo para chorar, o mais comum. Certamente ele amava essa pessoa com um amor que vem naturalmente, com os sentimentos que são latentes nos genes e que se despertam na convivência familiar. Era um amor de grilhões sanguíneos: seu pai, sua mãe, um irmão ou irmã. As lágrimas resultavam, por conseguinte, de lembranças inumeráveis de momentos em presença a qual jamais voltará a se efetivar. Jamais.

      Mas me houve dúvida. Julgando melhor, vi que o choro era solitário mesmo por solidão. Sua mulher não o acompanhava, não mais. E seria assim adiante. Era um choro de fim, definitivo. Era o fim do amor, que nunca acaba. Ele devia amá-la por motivos inquebráveis, não por sangue, mas por vida compartilhada, o que pode ser mais rijo. Lembrava-se, é pouco improvável, de trocas de solicitudes ao longo da vivência de um mundo restrito a ambos. Recordava-se, e isso provocava o choro, do amor que cresceu por serem uma vida em dois corpos que venceram guerras e festejaram glórias, solitários em sua união.

      Não era, entretanto, ainda acertado isso. Um amigo apartado, a perda de um emprego de relações vetustas são igualmente legítimas causas de pranto. E por alegria também se chora.

      Outras lágrimas ganharam a superfície da mesa, passando antes por sua mão que tapava a boca, talvez contendo palavras que viviam por si. Ele suspirava fundo.

      Havia mais possibilidades. Era então a distância do filho cuja voz diariamente lhe soprava suave os ouvidos, numa ficção tão verossímil que lhe arrancava de dentro o choro evitável por ser doloroso. A lembrança era da personalidade tão autônoma do menino, que mal sabia falar, mas que agia intrépido e seguro sempre. A lembrança era do cheiro, da textura da pele, dos abraços e beijos de amor real. Lembrava-se dos olhos nos seus olhos, como se nada mais houvesse a ver no universo. E não havia de melhor. Nisso vinha o choro.

      Uma lágrima me desceu junto. Não consegui terminar o café. Ele se levantou e se encaminhou ao caixa. Eu o segui com os olhos, bem úmidos. Quis dar nele um abraço demorado e dizer-lhe que tudo ficaria bem. Quis dizer a ele, com doçura, que era passageiro. Era minha vontade oferecer-lhe um conforto. Ia chamá-lo, mas minha garganta se embargou e chorei mais. Ele saiu pela porta sem que eu sequer pudesse apertar a sua mão.

(Disponível em: https://www.facebook.com/oldenhugo.silvafarias/posts/1583838504972154.)

Analise as afirmativas sobre o texto a seguir.


I. O narrador da história é do tipo onisciente.

II. São aventadas cinco hipóteses acerca da causa do choro do homem.

III. O narrador indica a possibilidade de intervir na ação da outra personagem em dois momentos.


Está(ão) correta(s) apenas a(s) afirmativa(s)

Alternativas
Comentários
  • I) ERRADA - onisciente: que sabe de tudo. A única coisa que esse narrador sabe é que o homem está chorando, o motivo é uma incógnita.


    II) CORRETA - cinco possíveis motivos segundo o narrador:



     "perda de alguém para a morte inexorável"

    "mulher não o acompanhava, não mais."

    "Um amigo apartado"

    "a perda de um emprego"

    "distância do filho"


    III) CORRETA

    "Pensei em oferecer-lhe um lenço, em perguntar se precisava de algo. Nada disso fiz."

    " Quis dar nele um abraço demorado e dizer-lhe que tudo ficaria bem. Quis dizer a ele, com doçura, que era passageiro. Era minha vontade oferecer-lhe um conforto. Ia chamá-lo, mas minha garganta se embargou e chorei mais."

  •  "perda de alguém para a morte inexorável"

    "mulher não o acompanhava, não mais."

    "Um amigo apartado"

    "a perda de um emprego"

    "distância do filho"


    Concordo que são hipóteses, mas...


    Quando ele diz:

    "E por alegria também se chora" parágrafo 6

    também não seria mais uma hipótese?


    Por isso marquei que apenas III estava correta...

  • Wendson, realmente são 6 hipóteses. Fiquei quebrando a cabeça aqui e acho que a banca quis dizer que existem PELO MENOS 5 hipóteses (se são 6 no total, logo existem 5). Se a alternativa fosse categórica e dissesse que existem APENAS as 5 hipóteses, aí sim teria que ser considerada errada, muito embora eu ache que ficou bastante subjetiva, o que gerou duplo sentido e por isso poderia ser passível de anulação...

  • Contei 6 hipóteses.

  • NARRADOR PERSONAGEM

  • Concordo com o que o Wendson Monteiro comentou. Acredito que são seis os motivos hipotéticos para o choro do homem.

  • Eu contei 6 hipóteses.

  • questão feita pra você errar, vim conferir se outras pessoas também contaram 6 hipóteses, pq eu encontrei 6 hipóteses, por mim pediria anulação

  • Também contei 6 hipóteses.

  • 1) a perda de alguém para a morte inexorável, irreversível;

    2) Sua mulher não o acompanhava, não mais;

    3) Um amigo apartado;

    4) a perda de um emprego de relações vetustas;

    5) E por alegria também se chora.

    6) Era então a distância do filho 

    Seguimos sem entender esse gabarito...

  • Acertei a questão. Eu contei 5 possibilidades, mas, ao ver os comentários, concordo que "por alegria também chora" é também uma hipótese.

    O comentário da Tatiane Melo faz mais sentido: PELO MENOS cinco hipóteses.

  • GABARITO LETRA D

    Pra mim, questão passível de mudança de gabarito, já que são 6 hipóteses do choro!

    Banca complicada essa IDECAN, cruzes!

  • Onde cabem 6 hipóteses também cabem 5 :)

  • Gab: D

    I. ERRADA O narrador da história é do tipo onisciente > Onisciente é o narrador que tudo sabe, o do texto podemos perceber que não sabe o(s) motivo(s) pelo(s) qual(is) chora o homem;

    II. VERDADEIRO São aventadas cinco hipóteses acerca da causa do choro do homem > Morte de alguém querido; divórcio; afastamento de um amigo; perda de um emprego e felicidade;

    III. VERDADEIRO O narrador indica a possibilidade de intervir na ação da outra personagem em dois momentos > Dar-lhe um lenço, perguntar se precisava de algo, e dar um abraço no homem.

  • Vou fazer prova dessa banca e já estou percebendo que terei dor de cabeça.

  • Contei 6 hipóteses. Algum professor pode explicar?

  • TIPO NARRATIVO → Texto em que se conta uma história.

    O narrador pode ser: personagem (quando em 1ª pessoa); observador (3ª); onisciente (3ª); intruso (3ª).

    1) observador: apenas descreve; não se envolve; não dá opinião sobre os personagens.

    2) onisciente: aquele que sabe de tudo; pode invadir a mente do personagem; pode dar opinião; pode narrar, antecipar, mudar a cronologia.

    3) intruso: associa-se a Machado de Assis; não só sabe de tudo (onisciente), mas também fala com o leitor, interrompe a narrativa, etc.

  • Eu entraria com recurso, se considerar que 5 hipóteses é um gabarito correto, então a banca poderia considerar correto uma alternativa que dissesse que ele considerou a possibilidade de intervir uma vez. Até por que todos nós sabemos contar.

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  • 1 -    Não era, entretanto, ainda acertado isso. Um amigo apartado, a perda de um emprego de relações vetustas são igualmente legítimas causas de pranto. E por alegria também se chora.

    2 - Julgando melhor, vi que o choro era solitário mesmo por solidão. Sua mulher não o acompanhava, não mais. E seria assim adiante. Era um choro de fim, definitivo. Era o fim do amor, que nunca acaba. 

    3 - Um amigo apartado,

    4 - a perda de um emprego de relações vetustas são igualmente legítimas causas de pranto.

    5- E por alegria também se chora.

    6 - Havia mais possibilidades. Era então a distância do filho cuja voz diariamente lhe soprava suave os ouvidos, numa ficção tão verossímil que lhe arrancava de dentro o choro evitável por ser doloroso.