SóProvas


ID
3015673
Banca
CETREDE
Órgão
Prefeitura de Quixeré - CE
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

                                     Iracema

                                                                                                 José de Alencar


      Iracema cantava docemente, embalando a rede para acalentar o filho.

      A areia da praia crepitou sob o pé forte e rijo do guerreiro tabajara, que vinha das bordas do mar depois da abundante pesca.

      A jovem mãe cruzou as franjas da rede, para que as moscas não inquietassem o filho acalentado, e foi ao encontro do irmão:

      - Caubi vai tornar às montanhas dos tabajaras! disse ela com brandura. O guerreiro anuviou-se:

      - Tu despedes teu irmão da cabana para que ele não veja a tristeza que a enche.

      - Araquém teve muitos filhos em sua mocidade; uns a guerra levou e morreram como valentes; outros escolheram uma esposa e geraram por sua vez numerosa prole; filhos de sua velhice, Araquém só teve dois. Iracema é a rola que o caçador tirou do ninho. Só resta o guerreiro Caubi ao velho Pajé, para suster seu corpo vergado e guiar seu passo trêmulo.

      - Caubi partirá quando a sombra deixar o rosto de Iracema. - Como a estrela que só brilha de noite, vive Iracema em sua tristeza. Só os olhos do esposo podem apagar a sombra em seu rosto. Parte, para que eles não se turvem com tua vista.

      - Teu irmão parte para te fazer a vontade; mas ele voltará todas as vezes que o cajueiro florescer para sentir em seu coração o filho de teu ventre.

      Entrou na cabana. Iracema tirou da rede a criança, e ambos, mãe e filho, palpitaram sobre o peito do guerreiro tabajara. Depois Caubi passou a porta e sumiu-se entre as árvores.

      Iracema, arrastando o passo trêmulo, o acompanhou de longe até que o perdeu de vista na orla da mata. Aí parou, quando o grito de jandaia, de envolta com o choro infantil, a chamou à cabana, a areia fria, onde esteve sentada, guardou o segredo do pranto que embebera.

      A jovem mãe suspendeu o filho à teta; mas a boca infantil não emudeceu. O leite escasso não apojava o peito.

      O sangue da infeliz diluía-se todo nas lágrimas incessantes que não lhe estancavam nos olhos; pouco chegava aos seios, onde se forma o primeiro licor da vida.

      Ela dissolveu a alva carimã e preparou ao fogo o mingau para nutrir o filho. Quando o sol dourou a crista dos montes, partiu para a mata, levando ao colo a criança adormecida.

      Na espessura do bosque estava o leito da irara ausente; os tenros cachorrinhos grunhem enrolando-se uns sobre os outros. A formosa tabajara aproxima-se de manso.

      Prepara para o filho um berço da macia rama do maracujá e senta-se perto.

      Põe no regaço um por um os filhos da irara e lhes abandona os seios mimosos, cuja teta rubra como a pitanga ungia do mel da abelha. Os cachorrinhos famintos sugam os peitos avaros de leite.

      Iracema curte dor, como nunca sentiu; parece que lhe exaurem a vida; mas os seios vão-se intumescendo; apojaram afinal, e o leite, ainda rubro do sangue de que se formou, esguicha.

      A feliz mãe arroja de si os cachorrinhos, e, cheia de júbilo, mata a fome ao filho. Ele é agora duas vezes filho de sua dor, nascido dela e também nutrido.

      A filha de Araquém sentiu afinal que suas veias se estancavam; e, contudo, o lábio amargo de tristeza recusava o alimento que devia restaurar-lhe as forças.

      O gemido e o suspiro tinham crestado o sorriso e o sabor em sua boca formosa.

Caubi partirá quando a sombra deixar o rosto de Iracema. A figura de linguagem presente nesse período é

Alternativas
Comentários
  • GABARITO: LETRA E

    → - Caubi partirá quando a sombra deixar o rosto de Iracema. 

    → A triste que Iracema sofre é comparada com uma sombra sem qualquer uso de termos comparativos, caracterizando uma metáfora (comparação implícita sem que haja um sentido real, mas um sentido de espírito, depreendendo certo teor de semelhança "sombra → tristeza).

    FORÇA, GUERREIROS(AS)!! ☻

  • Arthur obrigada por tamanha contribuição!

  • Comecei a estudar sobre o assunto e fiquei confuso depois desta questão. Ao explicar sobre metonímia no livro Gramática da Língua Portuguesa para concursos - 9ª edição, pág. 475 tem como exemplo o seguinte:

    "E mães, a agonizar de fome e de cansaço,

    Levam com o coração mais do que com os braços,

    Os filhos pequeninos." (=sentimento)

    Neste caso, quando se emprega um nome pelo outro, substituindo o concreto pelo abstrato, temos metonímia.

    Fiquei meio confuso, pois a questão parece semelhante quando "sombra" foi substituída por tristeza, ou seja, o concreto pelo abstrato.

  • GABARITO (E)

    A metáfora consiste em comparação implícita, em que acontece a fusão dos dois elementos comparados, com a ideia de que "um é o outro". Logo, podemos considerar "sombra" como sendo a tristeza a sair do rosto de Iracema, e chegamos a esta interpretação com um pouco de raciocínio, esse que caracteriza a metáfora.

    PORÉM, esta seria uma metáfora com pitacos de eufemismo, logo por haver também a suavização do termo tristeza. Mesmo assim, quando lembramo de que, para o autor levantar a ideia de "sombra no rosto", vem em nossas mentes a vontade de comparar sem conectivos e sim com o verbo ser; A TRISTEZA É SOMBRA NO ROSTO. Daí, podemos ver que se trata de uma metáfora.

  • Nossa Jonas, nada ve véio... na moral...

  • Fiquei na dúvida,existe também um eufemismo, de forma que a expressão: quando a sombra deixar o rosto de iracema é um atenuante de deixar a tristesa ir embora. Entretanto, a metáfora que compara a tristesa no rosto de iracema com uma sombra é mais dominante, por isso letra E.

  • Metáfora: Uso de uma palavra com outro sentido que não seja o seu usual. Ex.: Aquela menina era uma flor.  

  • metonímia - Empregar um termo no lugar de outro (havendo entre eles estreita relação de sentido). Ex. ator por obra

    comparação - paralelo entre dois termos com sentidos diferentes. Ex. dirige como um louco

    antítese - Figuras que se opõe numa frase. Qualquer contraste muito nítido. Ex. Com luz no olhar e trevas no peito.

    eufemismo - locução mais agradável para suavizar ou minimizar o peso conotador de uma palavra. Ex. Usar "faltou com a verdade" para dizer que mentiu.

    metáfora - produz sentidos figurados por meio de comparações. Ex. ele tem um vontade de ferro