Você pode mudar, mas o seu histórico da
internet não
Após publicar uma piada extremamente racista sobre
Kylian Mbappé, jogador da seleção francesa, a batata
esquentou na mão do youtuber Júlio Cocielo, apontado
como um dos maiores influenciadores brasileiros na
internet. A princípio, Cocielo apostou na retórica de
acusar quem o chamou de racista de “mimimi” e se
resguardou na desculpa esfarrapada de que se tratava
de uma piada mal interpretada. Porém, esse argumento
durou pouquíssimo quando os internautas resgataram
outras piadas racistas que o youtuber fez em 2013.
Observando as marcas que o patrocinaram saindo
de cena após seu racismo ser escancarado e a conta
bancária diminuindo, Cocielo apagou mais de 50 mil
tuítes da sua conta e pediu desculpas pela atitude por
meio de um texto e também gravando um vídeo no seu
canal. Não convenceu muito o pessoal, já que parece que
as desculpas foram mais uma obrigação para não perder
a possibilidade de ganhar dinheiro com publicidade.
[...]
Porém, fica a pergunta. Alguém se salvaria caso
vasculhassem nossas redes sociais de cinco, seis, 10
anos atrás?
Eu não me salvaria em 2009. E redescobri isso quando
fui rever o que escrevia com 18, 19 anos no Facebook,
Twitter e em blogs. Senti vergonha. Eu fiz muita piada
machista. Ri do caso da Geisy Arruda, tirava sarro de
mulheres que andavam com pouca roupa [...]. Também
achei comentários meus achando graça em piadas
racistas feitas por amigos virtuais. Eu já sabia ler e
interpretar texto na época. Não há desculpas para quem
eu era 10 anos atrás: uma imbecil.
Só que eu mudei. Não concordo com as coisas que falei
antes e nunca reproduziria elas novamente. Isso prova
que, sim, é possível deixar de ser preconceituosa. É
possível mudar e tentar ser uma pessoa melhor. A minha
ignorância e burrice também refletiram como as coisas
eram cinco, 10 anos atrás. Não se falava de feminismo
como hoje em dia. Pouco se discutia sobre o racismo
estrutural da sociedade brasileira. O que reinava era a
ignorância escondida atrás de piadas “inocentes”.
Minha mudança de pensamento não aconteceu porque
sou perfeita e iluminada. Não não, eu aprendi porque tive
contato com pessoas negras e / ou LGBTs no trabalho,
faculdade, em círculos de amizades e na internet. Foram
elas que chamaram a atenção sobre meu comportamento
e sobre a violência que é rir ou fazer uma piada racista.
Levei bronca ao vivo dessas pessoas ou levei bronca
lendo textos, entrevistas e vendo vídeos produzidos
pelas mesmas pessoas que antes achava válido fazer
piada – mesmo que fosse “sem intenção de ofender”.
Hoje, embora ser ainda muito pouco, há sim uma
obrigação na publicidade e no entretenimento em falar
sobre esses assuntos. De, no mínimo, chamar pessoas
negras e / ou LGBTs para falar sobre esses assuntos e
educar os espectadores sobre o preconceito. Também
há muito mais jovens colocando a cara para bater e
criando conteúdo independente para discutir sobre isso.
Há 10 anos, essas pessoas mal existiam para a internet.
[...]
Tenho certeza de que a maioria do pessoal acima de 25
anos tem um passado feio na internet de maior ou menor
escala. Até porque há 10 anos ninguém pensava muito
em como as coisas que você falou sem pensar numa rede
social permanecem lá. E que isso sirva de lição para a
nova geração da internet não fazer piada preconceituosa,
não falar sem pensar ou difundir mentiras. Você pode
mudar, mas seu histórico de internet não.
Disponível em:<https://tinyurl.com/yyjh3wls>.
Acesso em: 22 jul. 2019 (Adaptação)
Em certos trechos do texto, a autora traz sua experiência
como estratégia argumentativa, no intuito de convencer o
leitor a respeito de uma ideia. Tal ideia está corretamente
resumida em: