O multiculturalismo, como corpo teórico e campo político, tem sido trazido à tona com intensidade, nos debates atuais. Referindo-se à necessidade de compreender-se a sociedade como constituída de identidades plurais, com base na diversidade de raças, gênero, classe social, padrões culturais e lingüísticos, habilidades e outros marcadores identitários, o multiculturalismo constitui, segundo autores como Semprini (1999) e Grant (2000), uma ruptura epistemológica com o projeto da modernidade, no qual se acreditava na homogeneidade e na evolução "natural" da humanidade rumo a um acúmulo de conhecimentos que levariam à construção universal do progresso. O projeto multicultural, por sua vez, insere-se em uma visão pós-moderna de sociedade, em que a diversidade, a descontinuidade e a diferença são percebidas como categorias centrais. Da mesma forma, contrapondo-se à percepção moderna e iluminista da identidade como uma essência, estável e fixa, o multiculturalismo percebe-a como descentrada, múltipla e em processo permanente de construção e reconstrução.
três categorias, argumentamos, parecem ser centrais nas práticas pedagógicas multiculturais: crítica cultural, hibridização e ancoragem social dos discursos. Boyle-Baise e Gillette (1998) e Moreira e Macedo (2001) referem-se à crítica cultural permanente dos discursos como a possibilidade dada aos alunos de analisar suas identidades étnicas, criticar mitos sociais que os subjugam, gerar conhecimento baseado na pluralidade de verdades e construir solidariedade em torno dos princípios da liberdade, da prática social e da democracia ativista. Para tal, quatro dimensões da prática pedagógica multicultural são propostas: a construção (que envolve a produção do conhecimento, por parte do aluno, por intermédio de estratégias que o ajudem a buscar, compartilhar e analisar a informação sobre o pluralismo cultural e as desigualdades); voz e escolha (desenvolvimento de atividades democráticas em sala de aula, envolvendo a voz e a escolha dos alunos); crítica (envolvendo estratégias que demandem a discussão de valores culturais conflitantes, críticas ao status quo e investigação das relações culturais de domínio e marginalização); e, por fim, o ativismo social (incentivo a tomadas de posição e ações efetivas, com base nas outras três dimensões, que levem ao ganho de habilidades para uma oposição ativa às condições de desigualdade).
https://www.scielo.br/j/rbedu/a/QF4wH5r85zzy9hkYKjFDNNB/?lang=pt