- ID
- 3238339
- Banca
- IBADE
- Órgão
- Prefeitura de Presidente Kennedy - ES
- Ano
- 2018
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Texto 02
Palavras, palavras, palavras
Criadas pelos humanos, as palavras são
suscetíveis ao tempo, como os humanos. Algumas
mudam de significado, outras vão desbotando aos
poucos, e há as que morrem na inanição do silêncio.
Ninguém mais chama o libertino de bilontra, a amante
de traviata ou o inocente de cândido. Depois de soar
na boca do povo e iluminar a escrita, bilontra, traviata
e cândido foram sepultadas nos dicionários junto as
que lá descansavam em paz. Em seus lugares
brotam novas, frescas e saltitantes, com significado
igual - ou quase. A língua é a mais genuína criação
coletiva, feita da contribuição anônima. O agito das
palavras traduz as mudanças do mundo - na ciência
e tecnologia, na economia e política, nas leis e
religiões, no comércio e publicidade, no esporte e
comunicação, nos costumes e valores.
[...]
Faz tempo não ouço a palavra cavalheirismo.
Parece que a igualdade de direitos das mulheres
botou fora o bebê, a água do banho e a bacia. Lá se
foram também delicadeza e cordialidade: louvadas
no passado, antes de sumir viraram sinônimo de
perda de tempo. Pessoa cordial passou a ser chata,
cheia de frescura, pé-no-saco, puxa-saco. Cortesia
não morreu, mas mudou: agora quer dizer brinde,
boca-livre, promoção! Crimes tem cúmplices, mas é
rara a cumplicidade entre casais.
[...]
Se as palavras morrem ou mudam de sentido, os
gestos, intenções e atitudes que designam também
morrem ou mudam de sentido. Cabe indagar: que
sociedade é essa que sepulta o cavalheirismo, a
delicadeza, a cordialidade e a compaixão? Que gente
é essa que enterra a honra? Que país é esse que
esvazia valores como educação e ética e faz da
cortesia um gesto interesseiro? Que confere respeito
e perdão aos poderosos e impõe aos destituídos o
dever e o sacrifício?
Criadas pelos homens, palavras são do humano.
Intriga sejam justamente as que dizem o mais humano do humano a perderem o sentido ou
morrerem. Ou será que estamos perdendo o prazer
da convivência? Ah, palavras, palavras, palavras...
ARAÚJO, Alcione. Palavras, palavras, palavras. Estado de
Minas, Belo Horizonte, 05 jul. 2010. Caderno Cultura, p. 8.
Adaptado.
A autora do texto admite, nas primeiras linhas de sua
análise, que “Criadas pelos humanos, as palavras
são suscetíveis ao tempo, como os humanos.
Algumas mudam de significado, outras vão
desbotando aos poucos, e há as que morrem na
inanição do silêncio." A comparação estabelecida
pela autora indica que: