SóProvas


ID
3307084
Banca
IBFC
Órgão
Câmara de Feira de Santana - BA
Ano
2018
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto

                                                   Estátuas

                                      (Luis Fernando Veríssimo)


      Há uma estátua do Carlos Drummond de Andrade sentado num banco da praia de Copacabana, uma estátua do Fernando Pessoa sentado em frente ao café “A Brasileira” em Lisboa, uma estátua do Mario Quintana sentado num banco da Praça da Alfandega de Porto Alegre. Salvo um cataclismo inimaginável, as três estátuas jamais se encontrarão. Mas, e se se encontrassem?

      - Uma estátua é um equívoco em bronze – diria o Mario Quintana, para começar a conversa.

      - Do que nos adianta sermos eternos, mas imóveis? – diria Drummond.

      Pessoa faria “sim” com a cabeça, se pudesse mexê-la. E acrescentaria:

      - Pior é ser este corpo duro sentado num lugar duro. Eu trocaria a eternidade por uma almofada.

      - Pior são as câimbras – diria Drummond.

      - Pior são os passarinhos – diria Quintana.

      - Fizeram estátuas justamente do que menos interessa em nós: nossos corpos mortais.

      - Justamente do nosso exterior. Do que escondia a poesia.

      - Do que muitas vezes atrapalhava a poesia.

      - Espera lá, espera lá – diz Drummond. – Minha poesia também vinha do corpo. Minha cara de padre era um disfarce para a sensualidade. Minha poesia dependia do corpo e dos seus sentidos. E o sentido que mais me faz falta, aqui em bronze, é o do tato. Eu daria a eternidade para ter de volta a sensação na ponta dos meus dedos. Pessoa:

      - O corpo nunca ajudou minha poesia. Eu e meus heterônimos habitávamos o mesmo corpo, com a sua cara de professor de geografa, mas não nos envolvíamos com ele. Nossa poesia era à revelia dele. E fizeram a estátua do professor de geografa. Quintana:

      - Pra mim, o corpo não era nem inspiração nem receptáculo. Acho que já era minha estátua, esperando para se livrar de mim.

***

      - Pessoa – diria Drummond -, estamos há meia hora com você na mesa do Chiado, e você não nos ofereceu nem um cafezinho.

      - Não posso – responderia Pessoa. – Não consigo chamar o garçom. Não consigo me mexer. Muito menos estalar os dedos.

      - Nós também não...

      - Não posso reagir quando sentam à minha volta para serem fotografados, ou retribuir quando me abraçam, ou espantar as crianças que me chutam, ou protestar quando um turista diz “Olha o Eça de Queiroz”...

      - Em Copacabana é pior – diria Drummond. – Fico de costas para a praia, só ouvindo o ruído do mar e o tintilar das mulheres, sem poder me virar...

      - Pior, pior mesmo – diria Quintana – é estar cheio de poemas ainda não escritos e não poder escrevê-los, nem em cima da perna.

      Os três concordam: o pior é serem poetas eternos, monumentos de bronze à prova de agressões do tempo, fora poluição e vandalismo – e não poderem escrever nem sobre isto. As estátuas de poeta são sucata de poesia.

      E ficaram os três, desolados e em silêncio, até um turista apontá-los para a mulher e dizer:

      - O do meio eu não sei mas os outros dois são o Carlos Gardel e o José Saramago. 

Em “Acho que já era minha estátua, esperando para se livrar de mim.” (15º§), ocorre uma figura de estilo denominada:

Alternativas
Comentários
  • Gabarito B

    “Acho que já era minha estátua, esperando para se livrar de mim.” 

    Prosopopeia é uma figura de linguagem caracterizada pela atribuição de características, ações e sentimentos próprios de seres humanos a seres inanimados e a seres irracionais.

    Uma relação à "estátua".

  • a) Eufemismo: consiste em atenuar um pensamento desagradável ou chocante.

    EX: Ele sempre faltava com a verdade (= mentia).

    b) Prosopopeia ou personificação: consiste em atribuir a seres inanimados características próprias dos seres humanos.

    EX: O jardim olhava as crianças sem dizer nada.

    GABARITO: “Acho que já era minha estátua, esperando para se livrar de mim.” 

    c) Metáfora: consiste em empregar um termo com significado diferente do habitual, com base numa relação de similaridade entre o sentido próprio e o sentido figurado. Na metáfora ocorre uma comparação em que o conectivo comparativo fica subentendido.

    EX: “Meu pensamento é um rio subterrâneo”. (Fernando Pessoa)

    d) Hipérbole: trata-se de exagerar uma ideia com finalidade enfática.

    EX: Estou morrendo de sede!

    EX: Não vejo você há séculos!

    FONTE: https://www.infoescola.com/portugues/figuras-de-linguagem/

  • Não poderia ser a alternativa "A"? A estátua/corpo queria se livrar dele no sentido que queria que ele morresse. Sendo assim um eufemismo?

  • Ex.: Vou me livrar dele = vou matá-lo. Eufemismo sim.

    Passível de recurso

  • o texto inteiro é prosopopeia, inclusive o trecho destacado. Mas o que o trecho destacado traz em destaque é um eufemismo. discordo do gabarito.
  • Marquei prosopopeia por eliminação, mas depois de ler o texto também considerei eufemismo.

    Acho que poderia caber recurso, viu. Ele está se referindo a morte, "minha estátua querendo se livrar de mim".

  • Marquei eufemismo.

    Entraria com recurso para anular...

  • Prosopopeia: Ocorre prosopopeia (ou animização ou personificação) quando se atribui movimen-

    to, ação, fala, sentimento, enfim, caracteres próprios de seres animados a seres inanimados ou

    imaginários. ,

    Exemplos: “... os rios vão carregando as queixas do caminho.” (Raul Bopp)

    Um frio inteligente (...) percorria o jardim...” (Clarice Lispector)

    Em “Acho que já era minha estátua, esperando para se livrar de mim.”

    no trecho, acho que já era minha estátua , entendido como um ser imaginário

  • Tem duas respostas essa questão.

    "esperando para se livrar de mim" remete ao eufemismo. Um modo de se referir à morte de maneira mais sutil. E em relação às ações atribuídas à estatua, aí sim, temos a prosopopeia.

  • questão com duas respostas: PROSOPOPEIA E EUFEMISMO

  • Gabarito: B

    Prosopopeia: Atribuições humanas a seres inanimados.