- ID
- 3309142
- Banca
- CONSULPLAN
- Órgão
- TJ-MG
- Ano
- 2016
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
Ódio ao Semelhante – Sobre a Militância de Tribunal
Ninguém pode negar o conflito como parte fundamental do fenômeno político. Só existe política porque existem diferenças, discordâncias, visões de mundo que se distanciam, ideologias, lutas por direitos, por hegemonia. Isso quer dizer que no cerne do fenômeno político está a democracia como um desejo de participação que implica as tenções próprias à diferença que busca um lugar no contexto social. [...]
Esse texto não tem por finalidade tratar da importância do conflito ou da crítica, mas analisar um fenômeno que surgiu, e se potencializou, na era das redes sociais: a “militância de tribunal”. Essa prática é apresentada como manifestação de ativismo político, mas se reduz ao ato de proferir julgamentos, todos de natureza condenatória, contra seus adiversários e, muitas vezes, em desfavor dos próprios parceiros de projeto político. São típicos julgamentos de excessão, nos quais a figura do acusador e do julgador se confundem, não existe uma acusação bem delimitada, nem a oportunidade do acusado se defender. Nesses julgamentos, que muito revela do “militante de tribunal”, os eventuais erros do “acusado”, por um lado, são potencializados, sem qualquer compromisso com a facticidade; por outro, perdem importância para a hipótese previamente formulada pelo acusador-julgador, a partir de preconceitos, perversões, ressentimentos, inveja e, sobretudo, ódio.
Ódio direcionado ao inimigo, aquele com o qual o “acusador-julgador” não se identifica e, por essa razão, nega a possibilidade de dialogar e, o que tem se tornado cada vez mais frequente, o ódio relacionado ao próximo, aquele que é, ou deveria ser, um aliado nas trincheiras políticas. Ódio que nasce daquilo que Freud chamou de “narcisismo das pequenas diferenças”. Ódio ao semelhante, aquele que admiramos, do qual somos “parceiros”, ao qual, contudo, dedicamos nosso ódio sempre que ele não faz exatamente aquilo que deveria – ou o que nós acreditamos que deveria – fazer. Exemplos não faltam. Pense-se na militante feminista que gasta mais tempo a “condenar” outras mulheres, a julgar outros “feminismos”, do que no enfrentamento concreto à dominação masculina. A Internet está cheia de exemplos de especialistas em julgamento e condenação. A caça por sucesso naquilo que imaginam ser o “clubinho das feministas” (por muitas que se dizem feministas enquanto realizam o feminismo como uma mera moral) tem algo da antiga caça às bruxas que regozija até hoje o machismo estrutural. Nunca se verá a “militante de tribunal feminista” em atitude isenta elogiando a postura correta, mas sempre espetacularizando a postura “errada” daquela que deseja condenar. Muitas constroem seus nomes virtuais, seu capital político, aquilo que imaginam ser um verdadeiro protagonismo feminista, no meio dessas pequenas guerras e linchamentos virtuais nas quais se consideram vencedoras pela gritaria. Há, infelizmente, feministas que se perdem, esvaziam o feminismo e servem de espetáculo àqueles que adoram odiar o feminismo. [...] Apoio mesmo, concreto, às grandes lutas do feminismo, isso não, pois não é tão fácil nem deve dar tanto prazer quanto a condenação no tribunal virtual montado em sua própria casa. [...]
No 2º§, ao determinar a finalidade do texto, a autora coloca em evidência um dos elementos do processo comunicativo. O mesmo pode ser observado em: