a) O requerimento de usucapião extrajudicial deverá ser instruído por ata notarial, lavrada por tabelião de notas, de livre escolha da parte, distinto do registrador de imóveis perante o qual tramita o procedimento.
É O GABARITO. Entendo, contudo, que a questão é incorreta, já que, embora não expressamente previsto na Lei n. 6.015/1973, o tabelião de notas que lavra a ata notarial não é de livre escolha da parte. Nos termos do art. 5º do Provimento n. 65/2017 do CNJ, a ata notarial deve ser lavrada pelo tabelião de notas do município em que estiver localizado o imóvel usucapiendo ou a maior parte dele. Mesmo que não conste essa ressalva na lei n. 6.015/1973, a lei também não indica que o tabelião seja de livre escolha, de modo que deve ser observada a norma regulamentar editada pelo CNJ.
b) O pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião será processado mediante requerimento do interessado, representado por advogado, perante o cartório de registro de imóveis da comarca de domicílio do requerente.
ERRADO. O registro de imóveis competente é o da situação do imóvel (art. 216-A, caput, da Lei n. 6.015/1973).
c) Se a planta do imóvel usucapiendo não contiver assinatura do confinante, este será notificado pelo registrador competente a se manifestar em quinze dias, sob pena de seu silêncio ser interpretado como concordância tácita.
CORRETO, embora não seja o gabarito. Art. 216-A, § 2º, Lei n. 6.015/1973: "Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes, o titular será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar consentimento expresso em quinze dias, interpretado o silêncio como concordância."
d) Contra a decisão do registrador de imóveis que negar o pedido administrativo de reconhecimento extrajudicial de usucapião, a parte interessada poderá interpor recurso perante o juízo competente.
ERRADO. Se considerado o termo técnico, não será cabível propriamente um recurso, mas a suscitação de uma dúvida registral (art. 216-A, § 7º, da Lei n. 6.015/1973), que é um procedimento administrativo previsto nos arts. 198 e seguintes da Lei n. 6.015/1973. Anote-se ainda a possibilidade que, com a negativa do oficial, pode ser ajuizado pedido judicial (art. 216-A, § 9º, da Lei n. 6.015/1973).
A questão exige do candidato conhecimento sobre a usucapião extrajudicial e como ela é realizada tanto em sua primeira fase, concentrada no tabelionato de notas, como na fase de registro, a cargo do oficial de registro de imóveis.
Com respeito a banca elaborada do certame, ocorrido em 2018, parece-nos que a questão não foi redigida levando-se em conta importantes alterações trazidas pelo Conselho Nacional de Justiça no ano anterior, com a edição do Provimento 65/2017, que estabeleceu diretrizes para o procedimento de usucapião extrajudicial nos serviços notariais e de registro de imóveis.
Tem-se então que a questão deveria ter seu gabarito corrigido e não anulada, pois uma das alternativas ainda sim trazia a resposta em acordo com a legislação vigente.
Antes, contudo, de entrar na análise das alternativas é preciso lembrar que o artigo 216-A da Lei 6.015/1973 disciplinou como será feita a usucapião extrajudicial, como veremos a seguir:
Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de
reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado
diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que
estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado,
representado por advogado, instruído com:
I - ata notarial lavrada pelo
tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores,
conforme o caso e suas circunstâncias, aplicando-se o disposto no art. 384 da
Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo
Civil);
II - planta e memorial
descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de
anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização
profissional, e pelos titulares de direitos registrados ou averbados na
matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes;
III - certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do
imóvel e do domicílio do requerente;
IV - justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a
origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o
pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel.
§ 1
o O pedido será autuado pelo registrador,
prorrogando-se o prazo da prenotação até o acolhimento ou a rejeição do
pedido.
§ 2o Se a
planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos
registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos
imóveis confinantes, o titular será notificado pelo registrador competente,
pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar
consentimento expresso em quinze dias, interpretado o silêncio como
concordância.
§ 3
o O oficial de registro de imóveis dará ciência à
União, ao Estado, ao Distrito Federal e ao Município, pessoalmente, por
intermédio do oficial de registro de títulos e documentos, ou pelo
correio com aviso de recebimento, para que se manifestem, em 15 (quinze)
dias, sobre o pedido.
§ 4
o O oficial de registro de imóveis promoverá a
publicação de edital em jornal de grande circulação, onde houver, para a
ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão se
manifestar em 15 (quinze) dias.
§ 5
o Para a elucidação de qualquer ponto de dúvida,
poderão ser solicitadas ou realizadas diligências pelo oficial de
registro de imóveis.
§ 6
o Transcorrido
o prazo de que trata o § 4
o deste artigo, sem pendência de
diligências na forma do § 5
o deste artigo e achando-se em
ordem a documentação, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do
imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula,
se for o caso.
§ 7o Em qualquer caso, é lícito ao interessado
suscitar o procedimento de dúvida, nos termos desta Lei.
§ 8
o Ao final das diligências, se a documentação não
estiver em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido.
§ 9o A rejeição do pedido extrajudicial não impede o
ajuizamento de ação de usucapião.
§ 10. Em caso de impugnação do pedido de reconhecimento extrajudicial
de usucapião, apresentada por qualquer um dos titulares de direito reais
e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel
usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, por algum dos entes
públicos ou por algum terceiro interessado, o oficial de registro de
imóveis remeterá os autos ao juízo competente da comarca da situação do
imóvel, cabendo ao requerente emendar a petição inicial para adequá-la
ao procedimento comum.
§ 11. No caso de o imóvel
usucapiendo ser unidade autônoma de condomínio edilício, fica dispensado
consentimento dos titulares de direitos reais e outros direitos registrados ou
averbados na matrícula dos imóveis confinantes e bastará a notificação do
síndico para se manifestar na forma do § 2
o deste artigo.
§ 12. Se o imóvel confinante
contiver um condomínio edilício, bastará a notificação do síndico para o efeito
do § 2
o deste artigo, dispensada a notificação de todos os
condôminos.
§ 13. Para efeito do § 2
o
deste artigo, caso não seja encontrado o notificando ou caso ele esteja em lugar
incerto ou não sabido, tal fato será certificado pelo registrador, que deverá
promover a sua notificação por edital mediante publicação, por duas vezes, em
jornal local de grande circulação, pelo prazo de quinze dias cada um,
interpretado o silêncio do notificando como concordância.
§ 14. Regulamento do órgão
jurisdicional competente para a correição das serventias poderá autorizar a
publicação do edital em meio eletrônico, caso em que ficará dispensada a
publicação em jornais de grande circulação.
§ 15. No caso de ausência ou
insuficiência dos documentos de que trata o inciso IV do
caput
deste artigo, a posse e os demais dados necessários poderão ser comprovados em
procedimento de justificação administrativa perante a serventia extrajudicial,
que obedecerá, no que couber, ao disposto no § 5
o do art. 381
e ao rito previsto nos arts. 382 e 383 da
Lei n
o
13.105, de 16 março de 2015 (Código de Processo Civil). (Negritos por mim apontados para destaque dos dispositivos que auxiliarão na resposta).
Em seguida, em 2017, o Conselho Nacional de Justiça editou o Provimento 65/2017 que trouxe de modo pormenorizado como deveria ser realizado o processamento da usucapião extrajudicial pela via administrativa.
Vamos então a análise das alternativas:
A) ERRADA - Embora a banca tenha apontado tal alternativa como a correta, merece reparo. É verdade que a regra é da livre escolha do tabelião de notas, o qual poderá ser livremente eleito pelas partes nos moldes do artigo 8º da Lei 8935/1994. Todavia, em se tratando de usucapião extrajudicial vigora a competência terriorial do tabelião. O artigo 5º do Provimento 65/2017 do CNJ assim dispõe: A ata notarial mencionada no artigo 4º deste Provimento será lavrada pelo tabelião de notas do município que estiver o imóvel usucapiendo ou a maior parte dele, a quem caberá alertar o requerente e as testemunhas de que a prestação de declaração falsa no referido instrumento configurará crime de falsidade, sujeitos à pena da lei. Desta maneira, havendo um ou mais tabelionato de notas no município em que se situa o imóvel pode o requerente escolher entre estes tabelionatos, todavia, não poderá fazer a ata notarial em município diverso.
B) ERRADA - O caput do artigo 216-A é expresso ao afirmar que o processamento da usucapião extrajudicial será no cartório de registro de imóveis da comarca onde se situar o imóvel usucapiendo e não no domicílio do requerente. Registra-se por oportuno que é correta a parte da assistência por advogado, devendo obrigatoriamente ser assistido o requerente por advogado constituído ou por defensor público.
C) CORRETA - Trata-se da dicção do artigo 216-A, §2º e também do artigo 10 do Provimento 65/2017 do CNJ. Importante mencionar que tal notificação pode ser realizada tanto pelo registrador de imóveis como pelo registrador de títulos e documentos e que a não manifestação pelo confrontante no prazo de quinze dias será entendida como concordância.
D) ERRADA - O requerente poderá se valer de dois instrumentos próprios caso tenha sua pretensão frustada pelo registrador de imóveis. Poderá suscitar dúvida ao juiz, procedimento de natureza administrativa, nos moldes do §7º do artigo 216-A da Lei de Registros Públicos ou então poderá de imediato ou após a dúvida ser julgada procedente, ingressar com a ação judicial de usucapião, uma vez que o procedimento de dúvida não encerra coisa julgada material.
GABARITO DO PROFESSOR: LETRA C
DICA: O Conselho Nacional de Justiça editou o recente Provimento nº 100/2020 instituindo o E-Notariado, por meio do qual poderão ser praticados os atos do tabelionato de notas por meio eletrônico, atendidos os requisitos de segurança do Instituto de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil). Estaria a vedação imposta pelo artigo 9º da Lei 8.935/1994 revogada? NÃO! O Provimento nº 100/2020 trouxe de maneira clara, com o escopo de se evitar a concorrência predatória, em seu artigo 19 que os atos eletrônicos serão lavrados com exclusividade pelo tabelião de notas da circunscrição do imóvel ou do domicílio do adquirente, de forma remota, por meio do e-Notariado, com a realização de videoconferência e assinaturas digitais das partes. Trata-se, assim como em relação a lavratura de ata notarial em usucapião extrajudicial, de limitação a livre escolha do tabelião de notas para a prática de atos notariais.
Esse gabarito vai de encontro com o provimento 65/2017 do CNJ, embora saibamos que o enunciado requer conforme a Lei 6015/73. Mas mesmo considerando a lei 6015/73, entendo que o item considerado correto também vai de encontro com a regra geral da referida lei.
A
O requerimento de usucapião extrajudicial deverá ser instruído por ata notarial, lavrada por tabelião de notas, de livre escolha da parte, distinto do registrador de imóveis perante o qual tramita o procedimento.
Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com:
I - ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e de seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias, aplicando-se o disposto no art. 384 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil);
B
O pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião será processado mediante requerimento do interessado, representado por advogado, perante o cartório de registro de imóveis da comarca de domicílio do requerente.
Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com:
C
Se a planta do imóvel usucapiendo não contiver assinatura do confinante, este será notificado pelo registrador competente a se manifestar em quinze dias, sob pena de seu silêncio ser interpretado como concordância tácita.
Art. 216-A [...]
§ 2 o Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo ou na matrícula dos imóveis confinantes, o titular será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar consentimento expresso em quinze dias, interpretado o silêncio como concordância.
D
Contra a decisão do registrador de imóveis que negar o pedido administrativo de reconhecimento extrajudicial de usucapião, a parte interessada poderá interpor recurso perante o juízo competente.
Art. 216-A [...]
§ 9 o A rejeição do pedido extrajudicial não impede o ajuizamento de ação de usucapião.