SóProvas


ID
4045105
Banca
FAEPESUL
Órgão
Prefeitura de São João Batista - SC
Ano
2017
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Sobre o morrer

“Ninguém quer morrer. Mesmo as pessoas que querem chegar ao paraíso. Mas a morte é o destino de todos nós.” (Steve Jobs) 

Odeio a ideia de morte repentina, embora todos achem que é a melhor. Discordo. Tremo ao pensar que o jaguar negro possa estar à espreita na próxima esquina. Não quero que seja súbita. Quero tempo para escrever o meu haikai. 
Mallarmé tinha o sonho de escrever um livro com uma palavra só. Achei-o louco. Depois compreendi. Para escrever um livro assim, de uma palavra só, seria preciso ter-se tornado sábio, infinitamente sábio. Tão sábio que soubesse qual é a última palavra, aquela que permanece solitária depois que todas as outras se calaram. Mas isso é coisa que só a Morte ensina. Mallarmé certamente era seu discípulo.
O último haikai é isto: o esforço supremo para dizer a beleza simples da vida que se vai. Tenho terror de ser enganado. Se estiver para morrer, que me digam. Se me disserem que ainda me restam dez anos, continuarei a ser tolo, mosca agitada na teia das medíocres, mesquinhas rotinas do cotidiano. Mas se só me restam seis meses, então tudo se torna repentinamente puro e luminoso. Os não essenciais se despregam do corpo, como escamas inúteis.
A Morte me informa sobre o que realmente importa. Me daria o luxo de escolher as pessoas com quem conversar. E poderia ficar em silêncio, se o desejasse. Perante a morte tudo é desculpável… Creio que não mais leria prosa. Com algumas exceções: Nietzsche, Camus, Guimarães Rosa. Todos eles foram aprendizes da mesma mestra. E certo que não perderia um segundo com filosofia. E me dedicaria à poesia com uma volúpia que até hoje não me permiti. Porque a poesia pertence ao clima de verdade e encanto que a Morte instaura. E ouviria mais Bach e Beethoven. Além de usar meu tempo no prazer de cuidar do meu jardim…
Curioso que a Morte nada tenha a dizer sobre si mesma. A Morte me informa sobre o que realmente importa. Quem sabe sobre a Morte são os vivos. A Morte, ao contrário, só fala sobre a Vida, e depois do seu olhar tudo fica com aquele ar de “ausência que se demora, uma despedida pronta a cumprir-se” (Cecília Meireles). E ela nos faz sempre a mesma pergunta: “Afinal, que é que você está esperando?” (...)
Às vezes ela chega perto demais, o susto é infinito, e até deixa no corpo marcas de sua passagem. Mas se tivermos coragem para a olharmos de frente é certo que ficaremos sábios e a vida ganhará simplicidade e a beleza de um haikai.

(Rubem Alves) 

Rubem Alves, ao refletir “sobre o morrer”, põe em evidência:

I – Não se deve enganar as pessoas quanto ao tempo de vida que lhes resta.
II – Diante da morte iminente, o tempo seria de escolhas, assim como as leituras, selecionadas.
III – A morte deve ser lenta, oportunizando tempo para o “haikai” e para as despedidas.
IV – É preciso coragem para olhar a morte e reavaliar a vida.


No contexto em análise, podemos dizer que:

Alternativas
Comentários
  • Concordo com as afirmações II, III e IV, mas não encontrei no texto onde o autor evidencia que "Não se deve enganar as pessoas quanto ao tempo de vida que lhes resta.".

    Na minha interpretação o autor deixa bem claro que tudo gira em torno de suas preferências pessoais, tudo colocado em primeira pessoa... ("Odeio a ideia de morte repentina, embora todos achem que é a melhor. Discordo." / "Tenho terror de ser enganado. Se estiver para morrer, que me digam.")

    Até pensei que talvez tivesse relação com este último trecho "Mas se tivermos coragem para a olharmos de frente é certo que ficaremos sábios e a vida ganhará simplicidade e a beleza de um haikai.", mas acho que seria extrapolar a ideia do autor...