Umas poucas pessoas, gente da Ladeira, espiavam o cadáver quando Vanda chegou. O
santeiro informava em voz baixa:
— É a filha. Tinha filha, genro, irmãos. Gente distinta. O genro é funcionário, mora em
Itapagipe. Casa de primeira... [...]
Era um morto pouco apresentável, cadáver de vagabundo falecido ao azar, sem decência na
morte, sem respeito, rindo-se cinicamente, rindo-se dela, com certeza de Leonardo, do resto da
família. Cadáver para necrotério, para ir no rabecão da polícia servir depois aos alunos da
Faculdade de Medicina nas aulas práticas, ser finalmente enterrado em cova rasa, sem cruz e
sem inscrição. Era o cadáver de Quincas Berro Dágua, cachaceiro, debochado e jogador, sem
família, sem lar, sem flores e sem rezas. Não era Joaquim Soares da Cunha, correto funcionário
da Mesa de Rendas Estadual, aposentado após vinte e cinco anos de bons e leais serviços,
esposo modelar, a quem todos tiravam o chapéu e apertavam a mão.
AMADO, Jorge. A morte e a morte de Quincas Berro Dágua. 44. ed. Rio de Janeiro: Record, 1979. p. 26-27.
O texto apresenta