- ID
- 4122922
- Banca
- IDECAN
- Órgão
- Prefeitura de Apiacá - ES
- Ano
- 2016
- Provas
- Disciplina
- Português
- Assuntos
A língua como ela é
Nos últimos dias tive uma experiência muito gratificante cumprindo o meu papel de professora de língua
portuguesa – sim, gosto de enfatizar que dou aula de língua e não de gramática da língua. Pois é, nos últimos dias
ensinei a nossa língua portuguesa a estrangeiros ávidos por aprender o idioma oficial do país que sediou o maior evento
esportivo do planeta. São pessoas de todas as partes com um objetivo em comum: interagir, comunicar-se em
português.
Como práxis, nas aulas iniciais, ensinamos o verbo “ser” e “estar”; para nós brasileiros, o famoso e enfadonho
verbo to be das aulinhas de inglês. Então, a lição inicial é fazer com que os iniciantes entendam a diferença entre ambos
os verbos, já que na língua do Tio Sam tal diferença só é percebida no contexto comunicativo. As explicações acontecem
com exemplos reais, a fim de mostrar-lhes a língua como ela é.
Nas aulas para estrangeiros o “tu” e o “vós” são abolidos, completamente descartados, e isso é o sonho linguístico
de toda e qualquer criança brasileira. Imaginem o tormento: conjugação do verbo “ir”, no presente do indicativo “tu
vais”, “vós ides” e a criança inconformada e chorosa pergunta: “Mãe, alguém fala isso? Eu não falo”. Pois é, sábia
conclusão! A criança, com seu conhecimento linguístico inato, não reconhece o idioma descrito na Gramática e intui que
aquelas conjugações trarão uma imensa dor de cabeça e possíveis notas vermelhas.
A língua como ela é não se apresenta, com pretérito-mais-que-perfeito, como insiste a Gramática Normativa e seus
exemplos surreais: “O vento fechou a porta que o vento abrira.” Abrira?
Com o futuro também temos problemas. Não, não sou vidente, não me refiro ao amanhã, refiro-me ao tempo
gramatical. Ele, como a GN sugere, não participa dos nossos planos, visto que um casal, ao sonhar com o ninho de amor,
não enrola a língua para conjugar o verbo “querer” e, em vez de dizer “Nós quereremos um apartamento de frente para
o mar”, usam a corriqueira forma composta “Vamos querer...”. A partir disso, façamos uma reflexão: por que não
mostrar aos nossos pupilos os tempos verbais no contexto da nossa realidade linguística? O tempo futuro pode ser dito
com a forma composta (verbo auxiliar no presente + verbo principal no infinito) acompanhada pelo advérbio de tempo
que situa a ideia. Sendo assim, dizemos: “Vou viajar amanhã”. E falar assim é menos futuro? É tanto quanto em “Viajarei
amanhã”, com o detalhe de que está caindo em desuso na fala do dia a dia.
Ah! Como é gostoso ensinar a língua viva! Aquela que não está engessada nos compêndios gramaticais! Porém, os
gramáticos que elaboram tais manuais afirmariam categoricamente: ensinar português para estrangeiros é diferente de
ensinar português a uma criança nativa, afinal, ela já sabe português. Concordo! Claro que não precisamos ensinar as
diferenças entre ser e estar, levar e trazer, conhecer e saber, confusões típicas de um aprendiz não nativo.
Sugerir e advogar a favor do ensino real da língua significa retirar o que não é utilizado ou é raramente visto na
escrita, é ignorar regras inúteis que não influenciam na compreensão da língua. Um exemplo clássico é o pronome
oblíquo no começo da oração. Os puristas da língua consideram um erro crasso, mas que mal pode haver em dizer “Me
empresta o seu livro do Veríssimo”? E por que não escrever assim também? É uma tendência nossa o uso da próclise,
enquanto os portugueses preferem a ênclise. O nosso olhar para com os fenômenos linguísticos se compara ao estudo
de um biólogo ou de um botânico, que não diz que aquela flor é mais ou menos bela por causa do formato das pétalas
ou da coloração. Falar “empresta-me” não é mais ou menos bonito, é diferente, e em ambos os casos a comunicação
acontece.
Portanto, a minha singela conclusão é que precisamos de gramáticas que não tenham espaço para mesóclise,
pronome possessivo “vosso”, lista de substantivos coletivos, tipos de sujeito e predicado, enfim, uma série de bobagens
e gramatiquices que não ensinamos para os estrangeiros, porque não são relevantes para comunicação, também
porque não fazem parte da língua como ela é.
(Disponível em http://conhecimentopratico.uol.com.br/linguaportuguesa/gramatica-ortografia/53/artigo344826-1.asp. Acesso em: 08 set 2016.)
“A impessoalidade é um recurso de natureza linguístico-discursiva utilizado para conferir ao texto uma isenção, uma
imparcialidade maior. Para a elaboração de um texto argumentativo, sobretudo em provas e exames, os professores
geralmente orientam os alunos a escreverem de maneira distante, impessoal, já que o foco é nas ideias contidas no
texto e não no seu autor, levando-os a um processo de dessubjetivação, isto é, ‘a um apagamento de marcas subjetivas
tanto do eu quanto do outro dialógicos constitutivos do gênero’.”
(Vidon, 2012, p. 423.)
Com base no texto anterior, assinale a única alternativa que NÃO apresenta uma marca de pessoalidade.