SóProvas


ID
4144138
Banca
INAZ do Pará
Órgão
Prefeitura de São Sebastião da Boa Vista - PA
Ano
2016
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto para a questão

Era uma vez, uma Agulha, que disse a um novelo de Linha:

— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma coisa, neste mundo? 

— Deixe-me, Senhora.

— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.

— Que cabeça, Senhora? A Senhora não é alfinete, é Agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.

— Mas você é orgulhosa.

— Decerto que sou.

— Mas, por quê? 

— É boa! Porque coso. Então, os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?

— Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu, e muito eu?

— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados... 

— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás, obedecendo ao que eu faço e mando...

— Também os batedores vão adiante do imperador. 

— Você é imperador?

— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...

— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...

Estavam nisto, quando a Costureira chegou à casa da Baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma Baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a Costureira, pegou do pano, pegou da Agulha, pegou da Linha, enfiou a Linha na Agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da Costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a Agulha:

— Então, Senhora Linha, ainda teima no que dizia, há pouco? Não repara que esta distinta Costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima. 

A Linha não respondia nada; ia andando. Buraco aberto pela Agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A Agulha vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a Costureira dobrou a costura, para o dia seguinte; continuou ainda nesse e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile. 

Veio a noite do baile, e a Baronesa vestiu-se. A Costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a Agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E quando compunha o vestido da bela dama, e puxava a  um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a Linha, para mofar da agulha, perguntou-lhe:

— Ora, agora diga-me quem é que vai ao baile, no corpo da Baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com Ministros e Diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá. Parece que a Agulha não disse nada; mas um Alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre Agulha:

— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:

—Também eu tenho servido de Agulha a muita linha Ordinária! 

(Assis, Machado de. www.releituras.com/machadodeassis_apólogo.asp)

Que relevante figura de linguagem há, no seguinte trecho: “Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.” ?

Alternativas
Comentários
  • Anáfora = Repetição de uma palavra ou grupo de palavras no início de duas ou mais frases sucessivas, para enfatizar o termo repetido

    EXEMPLO: este amor que tudo nos toma, este amor que tudo nos dá, este amor que Deus nos inspira, e que um dia nos há de salvar .

  • “Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.”

    Anáfora - repetição da mesma palavra no inicio de versos ou frases

    Poderia dizer também que teria um polissíndeto implícito (repetição de de conjunções coordenativas e subordinativas)

    “Chegou a costureira, e pegou do pano, e pegou da agulha, e pegou da linha, e enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.”

  • Silepse: concordância que se faz com a ideia e não com a palavra

    Ex: BH é muito linda (cidade) / Aparecia gente de todos os lados e corriam freneticamente (eles)

    Anáfora: repetição de palavra, porém somente no início da frase [A=1]

    Ex: Eu que não fumo. Eu que não saio. Eu que não quero. [É ferida que dói... É um contentamento ... É dor que..]

    Anacoluto: quebra estrutural da frase a fim de introduzir nova palavra, sem ligação sintática com a anterior.

    Ex: Minha vida, tudo sem importância. [não se confunde com a silepse, pois não houve supressão e sim quebra]

    GAB: "E"

  • anafora = repetição de termos/retoma termos através de pronomes. polissindeto = repetição de conjuções
  • Assertiva C

    “Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.” = Anáfora.

  • Em palavras breves, as figuras de linguagem são recursos expressivos utilizados com objetivo de gerar efeitos no discurso. Dentro do extenso grupo em que se arrolam esses recursos, existem quatro subdivisões: figura de palavra, figura de construção, figura de sintaxe e figura de som.

    Inspecionemos o trecho: 

    “Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser.” 

    No trecho acima, consta anáfora, figura de linguagem que caracteriza a repetição de uma palavra ou grupo de palavras no início de duas ou mais frases sucessivas, para enfatizar o termo repetido. Ex.:

    "Vi uma estrela tão alta,

    Vi uma estrela tão fria!

    Vi uma estrela luzindo

    Na minha vida vazia.

    Era uma estrela tão alta!

    Era uma estrela tão fria!

    Era uma estrela sozinha

    Luzindo no fim do dia."

    (Manuel Bandeira)

    a) Metáfora.

    Incorreto. Recurso expressivo demasiadamente portentoso, a metáfora, do ponto de vista puramente formal, consiste na transferência de um termo para uma esfera de significação que não é sua, normalmente em virtude de uma comparação implícita, ou seja, que não apresenta elementos comparativos do tipo "como", "qual", "tal como", "tal qual". Exs.:

    “Incêndio — leão ruivo, ensanguentado.” (Castro Alves)

    “Meu pensamento é um rio subterrâneo.” (Fernando Pessoa)

    Todavia, nem sempre está implícita essa comparação, como é visto nos exemplos a seguir extraídos de Moderna Gramática Portuguesa, de Evanildo Bechara: “sol da liberdade”, “vale de lágrimas”, “negros pressentimentos”, “não ponha a carroça diante dos bois”.

    b) Onomatopeia.

    Incorreto. É a atribuição a certos sons linguísticos, ou grupamento deles, de capacidade especial para imitir, ou, de certo modo, sugerir determinados ruídos naturais. Exs.: cri-cri, zum-zum, tique-taque, plic-plic, etc.

    c) Silepse.

    Incorreto. concordância feita ideologicamente, ou seja, com termos não explícitos na estrutura.

    Há três tipos: de número, gênero e pessoa. Ei-los:

    I - Número (normalmente o sujeito será termo no singular, mas o verbo se flexionará no plural)

    Ex.: “Povoaram os degraus muita gente de sorte." (Camilo Castelo Branco)

    II - Gênero (há discordância de gênero entre artigos, pronomes, adjetivos, substantivos)

    Ex.: “Conheci uma criança... mimos e castigos pouco podiam com ele.” (Almeida  Garret)

    III - Pessoa (há discordância entre sujeito e verbo)

    Ex.: “Dizem que os cariocas somos pouco dados aos jardins públicos.” (Machado de Assis)

    d) Anacoluto.

    Incorreto. É o rompimento da estruturação lógica da oração. Exs.:

    “O relógio da parede, eu estou acostumado com ele.” (Rubem Braga)

    “Essas criadas de hoje, não se pode confiar nelas.” (Aníbal Machado)

    e) Anáfora.

    Correto. Vide detalhamento inicial.

    Letra E