Vão tirar o terminal do meu ônibus do centro da cidade, vão tirar do centro da cidade o meu
ônibus, vão me tirar do centro da cidade?
Vão me dar passagem entre o tapume e a pista de corridas, entre o poço e a poça de lama,
ou não vão deixar mais que use as pernas e os pés por estarem definitivamente fora de moda?
Vão permitir que eu siga o meu itinerário de trabalho sobre a capota dos automóveis, saltando
de uma para a outra depois de treinado em academia de técnica pedestre, ou vão estatuir que
eu e mais nove concidadãos de bom físico carreguemos nas costas o automóvel, a fim de que
automóveis e nós possamos chegar ao destino, passando no que outrora se chamava de rua?
Vão dizer quantas pessoas podem sair de casa, a quantas horas, por quanto tempo, e por
onde será permitido caminhar, durante quantos minutos, para que as turmas seguintes não
sejam prejudicadas na regalia de ir e vir na cidade entupida?
Vão acabar com a cidade, todas as cidades, vão acabar com homem e a mulher também, vão
fazer o quê, depois que eles mesmos acabarem?
ANDRADE, C. D. De notícias & não notícias faz-se a crônica (1974). Rio de Janeiro: Record, 2007.
O texto de Drummond revela que, em meados da década de 1970, época em que foi escrito, já
havia, nas grandes cidades, muitos dos problemas com que nos deparamos atualmente. Essa
realidade pode ser comprovada pelos autoquestionamentos de um cidadão que