Leia o texto a seguir para responder a questão
Um humano sai em busca de um mamute, persegue-o durante o dia, arma a emboscada e, depois de inúmeras
tentativas, consegue matá-lo e abocanhar seu quinhão de carne.
Em seguida, exausto, volta para casa com o firme propósito de deitar e rolar no tapete com o filho, contar
historinhas repetitivas e ignorar a bronca merecida do pimpolho, pois, afinal, trata-se de um pai/mãe ausente o dia todo.
Antes de dormir, ainda se verá no espelho com um olhar de feroz reprovação pela falta de tempo e de pique
para a ginástica, para o sexo e para a vida social.
Bem-vindo à geração cem por cento, que acredita que pode e deve dar conta de tudo e de fazer escolhas que não
impliquem perdas.
Uma aluna comentou esse fenômeno sabiamente: "Escolha sua perda!". Sim, é disso que se trata.
Uma ínfima parcela da população pode se dar ao luxo de não ter que caçar seu mamute diariamente. Além
disso, temos outras aspirações, que nos fazem mais do que caçadores, que nos fazem humanos.
Ainda assim, somos assombrados pela ideia de que nossos filhos serão traumatizados pela nossa ausência. Aqui
funciona a lógica de que pai e mãe são oxigênio, de que qualquer outro adulto cuidando deles será fatal. [...]
Nossos filhos viverão em média 4 a 5 décadas mais do que nós -ou seja, os deixaremos órfãos, na melhor das
hipóteses. Ausência fundamental que marca o sentido da parentalidade, pois acarreta criar sujeitos rumo à autonomia.
[...]
Há, ainda, outras ausências, menos radicais do que a morte, com as quais devemos aprender a lidar. Ausentamonos trabalhando, amando outras pessoas, amando outras coisas e amando a nós mesmos. [...] Ninguém merece ser
tudo para um pai ou uma mãe. Por outro lado, nenhum adulto merece criar uma criança sem ajuda, sem respiro, tendo
que gostar de brincar por obrigação. [...]
A tarefa parental é imensa e vitalícia. Será exercida por quem assumir essa responsabilidade radical, não
cabendo aqui fazer diferença entre homens e mulheres, pais e mães. Quem tomar para si essa missão só poderá
cumpri-la a partir de suas escolhas e consequentes perdas, sem fazer da parentalidade um poço de ressentimento e
culpas, cuja conta quem paga são os filhos.
Então, façamos a lição de casa. O que realmente é possível para cada família específica, para além de um
mundo fantasioso no qual os pais se dedicariam integralmente aos filhos como se isso fosse bom para as crianças?
Perguntemo-nos também o que é desejável para nós, pois a presença ressentida não passa desapercebida aos
pequenos.
Ao deixá-los com outros, sejam familiares ou profissionais, cabe assumir essa escolha, não valendo controlar
à distância avós, babás e professores, o que é enlouquecedor. Enfim, escolha sua perda e aprenda a se ausentar.
(Folha de São Paulo, VERA IACONELLI, 10 set. 2017, com adaptações).
No trecho “Uma ínfima parcela da população pode se dar ao luxo de não ter que caçar seu mamute diariamente”,
o termo em destaque, refere-se a