SóProvas


ID
4959403
Banca
IBADE
Órgão
Prefeitura de Vitória - ES
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

A uma senhora

    Com que então, minha senhora, está fazendo mais um ano de casada. Não lhe mando flores, que a distância não permite. Telefonar custa uma pequena fortuna, e ruídos errantes entram na conversa, abafando as vozes; nada mais enervante do que sentir a voz sem poder captá-la, ou recolher somente pedaços de frase, palavras soltas. Não lhe mando telegrama, pois a senhora mesmo o dispensou: costuma não chegar, seja porque há crise política por aqui, seja que há crise militar por aí, e vice-versa; ou as duas crises juntas nos dois lugares. E telegrama está sempre omitindo, calando; de tanto calar, não exprime nada. Por isso, escrevo-lhe. Carta leva quatro dias para chegar. Tanto melhor: quando a receber, estará pensando em outra coisa. Se fosse pelo correio, reconheceria logo a letra no envelope. Indo pelo jornal (astúcia minha), lerá desprevenida as primeiras linhas, até descobrir: “É comigo”.

    É com a senhora mesmo e com seu marido que estou falando, mas tenho motivo especial para dirigir-me aos dois por seu intermédio. Conheço-a há bem mais tempo do que a ele. Posso dizer, sem exagero, que a vi nascer; quando ele me apareceu, era homem feito e vinha trazido pela senhora. Aprovei a escolha, porque função de amigo é aprovar; e acho que não andei mal. A prova é esta carta.

     Estou me lembrando de como as coisas se passaram. Tudo é tão liso na vida de uma pessoa; os dias repetem os dias; de súbito não repetem mais. A pessoa é a mesma; os fatos mudam. A senhora levava uma vidinha tranquila de estudante, ganhara bolsa em Paris, não era de coquetéis; por desfastio, foi a um, conheceu lá um fulano que lhe falou qualquer coisa; não era conversa de pegar, pegou. Tratava-se de ilustre desconhecido, ou antes, de dois ilustres desconhecidos um para o outro. Ele estava de passagem e voltou logo para o seu país. Assim desconhecidos, um mês depois se casavam, à base de intuição e maluquice. Paris foi trocada por outra cidade, de outra nação. Ficamos sem a senhora e nem nos queixamos; obrigação de amigo é não se queixar. Eu aprendera sozinho: vida é aceitação. 

    Os dois malucos conheceram o delicioso e o difícil, a rotina e a quimera, os problemas, as melancolias, os sustos, as angústias, as distrações infantis que vêm depois das angústias; no total, viveram. A população do globo foi aumentada pelos dois em escala razoável: nem muito nem com avareza. Daqui estou ouvindo, ou esperando ouvir, na visita do ano, os gritos de três molequinhos que me julgam uma peça arqueológica simpática. Também me divirto com eles, nesse período; e com isso, e com as demais presenças, embalo a falta da senhora no resto do ano. Pois amigo deve ter imaginação suficiente para fazer, de falta, companhia.

     A senhora, seu marido e os moleques recebam este abraço absolutamente real.


(ANDRADE, C. Drummond de Cadeira de balanço. 11 ed. Rio de Janeiro: J. Olympio Editora, 1979, p. 142-143.)

“A senhora, seu marido e os moleques recebam este abraço absolutamente real.” (5º §) A oração transcrita acima está correta quanto à concordância, com o verbo no plural concordando com o sujeito composto. Das alterações feitas abaixo, está INCORRETA quanto à concordância a seguinte:

Alternativas
Comentários
  • Sobre a B: As duas expressões, embora redundantes, são muito utilizadas na língua portuguesa e seus significados são sinônimos. Ambas são locuções prepositivas. As palavras  e  significam unido, ligado. A preposição com também transmite uma ideia de associação, companhia, adição, simultaneidade.

    https://duvidas.dicio.com.br/junto-com-ou-juntamente-com/

  • Qual o erro da E?

  • Acho que o erro da "E" está relacionado ao pronome "vós" e a conjugação do verbo receber. Acredito que o correto seria "recebeis".

  • Eu + alguém = nós

    Tu + alguém = vós

    Ex.: Tu e ele fizestes o exercício.

  • Meus caros, posso estar equivocado, mas o comando da questão versa "Das alterações feitas abaixo, está INCORRETA quanto à concordância a seguinte:" e não sobre pronomes.

    Marquei a letra E pela simples relação de não separação de Sujeito, Verbo e complemento.

    Desejo que vós, a senhora, seu marido e os moleques, recebam este abraço absolutamente real. X

    Desejo que vós, a senhora, seu marido e os moleques recebam este abraço absolutamente real. OK

    Por gentileza, caso haja equívocos, contate-me.

    Bom Papiro a todos.

  • Nos sujeitos compostos formados por pessoas gramaticais diferentes, a concordância no plural obedece ao seguinte esquema: a primeira pessoa prevalece sobre a segunda pessoa, que, por sua vez, prevalece sobre a terceira. Veja:

    Teus irmãos, tu e eu tomaremos a decisão.

    Tu e teus irmãos tomareis a decisão.

  • Desejo que vós (sujeito), a senhora, seu marido e os moleques,(aposto) recebais este abraço absolutamente real