A questão versa sobre a competência constitucional dos Tribunais de Contas de apreciar, para fins de registro, a legalidade das concessões de aposentadorias (art. 71, inciso III da CF/88) .
De início, para entendermos o significado de controle preventivo e controle repressivo, vamos retomar a classificação do Controle quanto ao momento de sua realização. Consoante Lima (2019) [1] e Di Pietro (2017) [2], o controle pode ser:
Prévio (ex ante, a priori, perspectivo):
O Controle prévio possui caráter PREVENTIVO, e, em essência, é realizado ANTES do ato administrativo. Por isso, ele, geralmente, é realizado pela auditoria interna ou pelos sistemas de controle interno da organização e visa, de maneira tempestiva, a correção de falhas e a adoção de procedimentos antes da materialização de um prejuízo à administração [1] [2] .
Concomitante (pari-passu ou prospectivo)
Em síntese, o controle concomitante, ocorre concomitantemente à execução do(s) ato(s) administrativo(s),
como, por exemplo,
o exame de um contrato público em andamento, ou, de
maneira mais abrange, o acompanhamento de uma política pública. Este tipo de controle possui caráter preventivo, dado que visa a detectar deficiências e/ou irregularidades que possam acarretar prejuízo à administração, como também possui caráter corretivo (ou repressivo), quando já houve um dano à administração, objetivando o ressarcimento do débito (quando houver) e a individualização da conduta dos responsáveis para fins de responsabilização, ou, quando
se tratar de falhas meramente formais, a ciência das irregularidades
e/ou a determinação/recomendação à adoção de providências para o saneamento
das irregularidades. [1] [2].
Posterior (posteriori, subsequente ou retrospectivo):
O controle posterior, em suma, é realizado posteriormente à edição de algum ato administrativo, possuindo caráter eminentemente corretivo (repressivo). Por exemplo, uma análise de uma Corte de Contas acerca de um contrato já executado, onde eventuais irregularidades podem ser objeto de ciência, quando se tratar de falhas meramente formais, ou, na hipótese de um dano à administração, podem ser aprofundadas para o ressarcimento do débito (quando houver) e a individualização da conduta dos responsáveis para fins de responsabilização [1] [2].
Pessoal, conforme Lima (2019) [1], existe uma discussão conceitual sobre o controle prévio poder ser realizado ou não pelos Tribunais de Contas, visto que a previsão para registro prévio de despesas existente na Constituição de 1946 não se faz presente na Constituição de 1988.
Antes de adentrar nessa discussão, cumpre destacar que, em regra, os Tribunais de Contas não fazem controle prévio de atos administrativos, conforme enunciados jurisprudenciais abaixo transcritos:
Acórdão 1901/2009-TCU-Plenário
De regra, o TCU não é órgão consultivo da Administração Pública, responsável pelo controle prévio dos atos de gestão. Cabe ao gestor, com base em pareceres de órgãos competentes, efetuar o juízo acerca da solução que melhor atenda ao interesse público, para então decidir sobre sua forma de ação.
Acórdão 1326/2009-TCU-Plenário
Não compete ao TCU autorizar o gestor a ressarcir prejuízos alegados por empresa contratada pela Administração, sob pena de invadir seu campo decisório e de, indevidamente, exercer controle prévio dos atos administrativos. Cabe ao gestor avaliar eventual pedido nesse sentido e responsabilizar-se por sua decisão.
Contudo, salienta Lima (2019) [1], que, para parte da doutrina e para o TCU (entendimentos jurisprudenciais), as Cortes Contas exercem o Controle Prévio em situações especiais, como no EXAME PRÉVIO de editais e procedimentos em casos de grande relevância econômica e social como as Parcerias Público-Privadas (PPPs) e outras hipóteses de privatização e concessão de serviços públicos.
Ademais, nada obstante parte da doutrina considere que o controle exercido nos certames licitatórios seja de natureza concomitante, vozes autorizadas, como o Min. Benjamin Zymler, entendem que o controle efetuado sobre um edital de licitação acarreta o controle prévio do contrato a ser firmado (LIMA, 2019) [1].
Pessoal, o raciocínio acima é totalmente coerente caso seja considerado que os atos administrativos voltados à realização de uma licitação são preparatórios para que o contrato seja firmado. Assim, se meu referencial é o contrato, faz sentido chamar de controle prévio o exame de um edital publicado.
Já no que tange os atos de concessão de aposentadoria, para quem considera que esses atos são complexos, a apreciação, para fins de registro, pelos Tribunais de Contas constituiria uma modalidade de controle prévio (LIMA, 2019) [1]
De todo modo, independentemente da discussão conceitual, COMO REGRA, excetuando-se o exame prévio de editais de PPP e de concessões de serviços públicos, anteriormente citados, a atuação das Cortes de Contas somente se mostra pertinente quando há ato
administrativo praticado pelos entes submetidos a sua jurisdição
(A publicação de um edital de licitação, por exemplo, constitui ato administrativo passível de exame pela Corte de Contas) (Acórdão 1771/2013-TCU-Plenário)
Recapitulando o que fora dito acima, quando nos referimos a Controle Preventivo no contexto de Tribunais de Contas (podendo ser enquadrado como prévio ou concomitante), pela sua própria natureza e competências constitucionais, a ênfase é no Controle Preventivo da Despesa Pública, cujo propósito é evitar o cometimento atos atentatórios aos princípios da legalidade, legitimidade, economicidade (Acórdão 1771/2013-TCU-Plenário)
Como exemplo, cita-se a suspensão de um pregão por
conta de irregularidades identificadas no edital, com vistas a evitar que ocorra uma contratação
antieconômica à administração. Ou seja, aqui o
OBJETIVO da atuação da
Corte de Contas é
evitar a MATERIALIZAÇÃO de um dano (sentido amplo, não somente dano patrimonial) à administração.
Já no controle repressivo, entende-se que, diante de algum prejuízo à administração (sentido amplo, não somente prejuízo patrimonial), seja ele exercido concomitantemente à execução do objeto fiscalizado ou a posteriori, a atuação do Tribunal de Contas volta-se ao ressarcimento do débito (se houver), à responsabilização individualizada, ou, quando se tratar de falhas meramente formais, a dar ciência das irregularidades e/ou a determinar/recomendar adoção de providências para o saneamento das irregularidades.
Agora vamos à conceituação dos atos administrativos quanto à intervenção da vontade administrativa, segundo Carvalho Neto (2021) [3]:
Atos Simples:
Ato que emana da vontade de um só órgão ou agente administrativo [3]
Atos Complexos:
São aqueles atos cuja vontade final da Administração exige a intervenção de agentes ou órgãos diversos, havendo certa autonomia, ou conteúdo próprio, em cada uma das manifestações [3]
Atos Compostos:
São atos que, embora não se componham de vontades autônomas, compõem-se de vontades múltiplas. Assim, há uma só vontade autônoma, de conteúdo próprio, e as demais seriam meramente instrumentais, dado que se limitariam à verificação de legitimidade do ato de conteúdo próprio [1]
Pessoal, o posicionamento majoritário da doutrina e do próprio STF é que a Aposentadoria é um Ato
complexo, onde se faz necessária a conjugação das vontades do órgão de origem e do Tribunal de Contas. Desse modo, tratar-se-á de um CONTROLE PRÉVIO, cujo caráter é PREVENTIVO.
Data vênia quem pensa diferente, no meu entendimento, ainda que se classifique como controle concomitante a apreciação, para fins de registro, pelos Tribunais de Contas dos atos de concessão de aposentadoria, esse tipo de controle teria caráter PREVENTIVO, tendo em vista que objetiva mitigar o risco da consumação de uma concessão irregular de uma aposentadoria, o que, consequentemente, traria prejuízos materiais à administração pública.
Logo, a questão está correta.
GABARITO DO PROFESSOR: CORRETA.
Pessoal, por fim, para fins de estudo, cabe ressaltar que, nada obstante o STF tenha mantido entendimento de que a aposentadoria é um Ato Complexo, na apreciação do tema 445, a Corte Suprema fixou a seguinte tese:
"Em atenção aos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os Tribunais de Contas estão sujeitos ao prazo de 5 anos para o julgamento da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a contar da chegada do processo à respectiva Corte de Contas." (grifou-se)
Fontes:
[1] LIMA, Luiz Henrique. Controle Externo – Teoria e jurisprudência para os Tribunais de Contas. 8. ed. São Paulo: Editora Método, 2019;
[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 30.ed. Rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017;
[3] CARVALHO FILHO, José dos Santos.
Manual de Direito Administrativo. 35 ed. - São Paulo: Atlas, 2021.