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Queixo duplo
Psicólogos, pedagogos e linguistas advertem: o
smartphone é antissocial - ao mesmo tempo em que parece
conectar as pessoas, na verdade as afasta e faz com que se
confinem individualmente na mediocridade de uma telinha de três
polegadas. Pode-se estar num restaurante, teatro, praia ou até
passeando em Paris - se o sujeito estiver empalmando um
smartphone, nada e ninguém mais existirá. A badalhoca abole a
vida ao redor.
Apesar disso, raros se habilitam a tentar equilibrar essa
servidão com a riqueza da vida real, onde as coisas têm forma,
volume, peso, cheiros e cores. Neste momento, já há dezenas de
milhões de crianças que não conheceram o mundo antes do
smartphone. Mais um pouco e não acreditarão que esse mundo um
dia existiu.
Se as pessoas insistem em ignorar as conclusões de tais
estudiosos e não se importam de reduzir suas mentes à condição de
apêndice de um aparelho, talvez se assustem ao saber que o
smartphone também as atinge em algo que ainda devem valorizar:
o corpo.
Cidadãos habituados a usar o smartphone enquanto
caminham pela rua tendem a torcer o pé em buracos no
calçamento, ser tragados por bueiros, tropeçar no meio-fio e
abalroar-se uns aos outros. Os mais compenetrados não estão livres
de ser atropelados pelo pipoqueiro.
Se isto não basta para que as pessoas deem um pouco de
sossego ao smartphone, resta informar que, para alguns
fisioterapeutas, a postura curvada - a cabeça em ângulo reto em
relação ao pescoço, exigida para se ler ou escrever na telinha - pode
vergar a coluna mais ereta à forma de um ponto de interrogação. E
o queixo cravado ao peito tantas horas por dia está levando as
pessoas mais bonitas a desenvolverem queixo duplo.
(Ruy Castro. Folha de S.Paulo, 12.05.2014. Adaptado)
Ao se utilizar do termo servidão, em destaque no segundo
parágrafo do texto, o autor o faz com a intenção de enfatizar