Leia o texto a seguir para responder a questão.
LER DEVAGAR
Para aprender a ler é preciso ler bem devagar, e em seguida é preciso ler bem devagar e, sempre, até o último livro
que terá a honra de ser lido por você, será preciso ler bem devagar. É preciso ler devagar um livro tanto para desfrutar dele
quanto para se instruir ou para criticá-lo. Flaubert dizia: “Ah! Esses homens do século XVII! Como sabiam latim! Como liam
devagar!”. Mesmo sem a intenção de escrever você mesmo, é preciso ler com lentidão o que quer que seja, sempre se
perguntando se compreendeu corretamente e se a ideia com que acabou de se deparar é a do autor e não a sua. “É isso
mesmo?” deve ser a pergunta contínua que o leitor faz a si mesmo.
Os filólogos têm uma mania um pouco divertida, mas que parte do melhor sentimento do mundo e que devemos
ter e conservar como princípio, como raiz. Eles se perguntam sempre: “É este mesmo o texto? Não seria ergo em lugar de
ego, e ex templo em lugar de extemplo? Isso faria diferença”. Essa mania lhes surgiu de um hábito excelente, que é o de ler
devagar, que é o de desconfiar do primeiro sentido que se vê nas coisas, que é o de não se abandonar, que é o de não
sermos preguiçosos ao ler. Dizem que, no texto de Pascal sobre o ácaro, ao ver o manuscrito, Cousin leu: “nos contornos
dessa síntese de abismo”. E como ele o admirou! Como o admirou! Estava escrito: “nos contornos dessa síntese de átomo”
o que faz sentido. Cousin, levado por seu entusiasmo romântico, não se perguntou se “síntese de abismo” também fazia. É
preciso não ter preguiça ao ler, mesmo uma preguiça lírica.
Nem precipitação. A precipitação não passa, aliás, de uma forma de preguiça. Nossos pais diziam: “Ler com os
dedos”. Isso queria dizer folhear de tal modo que, feitas as contas, os dedos tinham mais trabalho do que os olhos. “O sr.
Beyle lia muito com os dedos, o que quer dizer que ele percorria muito mais do que lia, e deparava sempre com o lugar
essencial e curioso do livro”. É preciso não pensar muito mal desse método que é o dos homens que são, como Beyle,
colecionadores de ideias. Ocorre apenas que esse método tira todo o prazer da leitura e o substitui pelo da caça. Se você
quer ser um leitor diletante e não um caçador, seu método precisa ser exatamente o oposto. De forma alguma deve ler com
os dedos, nem ler na diagonal, como também se diz de modo bastante pitoresco. Deve ler com um espírito atento e
bastante desconfiado de sua primeira impressão.
Você me dirá que há livros que não podem ser lidos devagar, que não suportam a leitura lenta. E os há, de fato,
mas esses são os livros que não é preciso ler em absoluto. Primeira consequência benéfica da leitura lenta: ela faz a
separação, desde o início, entre o livro que se deve ler e o livro que só foi feito para não ser lido.
Ler devagar é o primeiro princípio, e se aplica a toda e qualquer leitura. É como a essência da arte de ler. Há
outras? Sim, mas nenhuma se aplica a todos os livros sem distinção. Além de “ler devagar” não há uma arte de ler; há artes
de ler, e muito diferentes conforme as diferentes obras. São essas artes de ler que tentaremos sucessivamente destrinchar.
(FAGUET, Émile. A arte de ler. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2009.)
A partir da leitura do texto, é possível afirmar que sua ideia central é: