SóProvas


ID
5521501
Banca
CETAP
Órgão
Prefeitura de Maracanã - PA
Ano
2019
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

É correto, sem advérbios.

A lição da menina negra, magérrima, que cantou feito rainha. 


    Eiza Soares estreou no programa de Ary Barroso na Rádio Tupi. Tinha 16 anos e era mãe. Sua cria estava doente e Elza inscreveu-se no show de Barroso porque os primeiros lugares ganhavam prêmios em dinheiro. Era uma chance de pagar o tratamento do filho. Elza subiu no palco, mulher negra, jovem, magérrima, vestida conforme o lugar que lhe cabia na perversa espiral de privilégios da nossa sociedade. Notavam-se os remendos no vestido. Os alfinetes. Ary Barroso ficou chocado com alguém que, para muitos, não merecia estar sob os holofotes. “O que é que você velo fazer aqui?” Ary recebeu Elza com boa dose da branquitude, classismo e machismo que inebriam a elite brasileira desde sempre. 

    Elza respondeu: “Eu vim cantar”. Ary seguiu a cantilena do opressor: “E quem disse que você sabe cantar?”. Amenina de 16 anos, cujo filho ardia em febre, respondeu com a coragem das mães: “Eu”. “De onde você veio, menina?" Ary não parecia se cansar de assinalar que Elza era uma estrangeira ali. Nesse momento, a menina respondeu com a audácia disruptiva que mora em cada nota do seu jazz de lata d'água na cabeça: “Eu vim do planeta fome”.  

    Em 1983, a respeitadíssima acadêmica indiana Gayatri Spivak escreveu Pode o Subalterno Falar? O ensaio, referência para quem deseja compreender a contribuição dos estudos pós-coloniais para as ciências humanas, fala do silenciamento sistemático do subalterno. Categoria nomeada por Gramsci, o subalterno é quem não pertence socialmente e politicamente às estruturas hegemônicas de poder. Os excluídos. Os triturados diariamente pela mecânica da discriminação. As Elzas e seus filhos febris. Spivak teorizou sobre o fato de não parecer natural ou adequado o subalterno falar. O silêncio é o que se espera dele,  

    Se o subalterno não deve falar, como poderia ousar cantar? Ary e sua plateia, que ria da humilhação de Elza, achavam que não, E hoje? Seria diferente? Mudamos pouco. Somos a mesma plateia rindo de novas humilhações que nos chegam pelas novas mídias, mas somos iguais. Esperamos do subalterno o silêncio. Zombamos do subalterno que ousa quebrar esse nosso contrato social. E não se enganem: a zombaria é o novo açoite. Mudamos pouco. Os ancestrais de Elza foram para o pelourinho. Elza foi ridicularizada ao vivo. Hoje, fingimos ter superado esse passado, mas as revistas lidas pelas madames saúdam a nova onda: uniformes de domésticas assinados por estilistas renomados. 

    Mudamos quase nada. 

    Naquele dia, Elza cantou Lama na Rádio Tupi. A subalterna cantou rainha, majestosa. Ary Barroso aplaudiu boquiaberto. A plateia que antes riu levantou-se. Reverenciou a nobreza da negra do planeta fome que ousou adentrar um espaço que lhe era negado e fez dele seu reino. Para quem ainda não entendeu: o politicamente correto é simplesmente isso. O correto. Algumas piadas a menos? Sim. Mas, em troca, hoje temos infinitos talentos antes silenciados embalando nossos sonhos. Só os que não sonham não veem que o resultado é positivo e deve ser comemorado. 


(Manoela Miklos. 25 de janelro, 2019, Revista VEJA). 


No terceiro parágrafo, o excerto “(...) fala do silenciamento sistemático do subalterno.”, o uso da aliteração conota: 

Alternativas
Comentários
  • Que viajem é essa?!

    Quem elaborou essa questão certamente queria mostrar que era intelectual. Só pode.

  • (Meu raciocínio para responder a Questão, pode não ter nada a ver com português, mas foi com base nessa lógica que eu fiz)

    Só dá pra fazer por anulação de alternativas após ler o 3 parágrafo inteiro e com conhecimento de mundo.

    B)O subalterno não tem o que dizer.

    Errado, pois se fosse verdade por que os silenciariam sistematicamente?

    C) O opressor é claro ...

    Errado, alguém que oprime uma massa de pessoas de maneira clara =direta , certamente vai enfrentar grandes represálias ou anarquistas (é só observar aqui no Brasil, alguns políticos nos impõem o que eles querem de maneira implícita, ou seja, sem atacar as massas claramente/diretamente, pois caso fizesse diretamente iriam enfrentar uma multidão.

    D)estruturas hegemônicas incentivam os excluídos.

    Errado , Os poderosos incentivam ações para excluir mais pessoas e assim acabam desestimulando os excluídos na luta por equidade e igualdade. Praticamente não dão ouvidos aos excluídos e se não tem quem os ouça ,logo todos vão ficar desestimulados de lutar por direitos iguais para deixarem de serem excluídos na sociedade.

    resta apenas letra A. Ordem implícita do abafamento do discurso

    Correta, Para ter ordem tem que vir de alguém hierarquicamente superior e como já foi explicado na letra C, os opressores/ políticos/superiores em regalias, sempre atacam implicitamente para calar ou rechaçar as massas .

  •  “(...) fala do silenciamento sistemático do subalterno.” - temos SSSSS, a pronúncia nos lembra um pedido de silêncio. Nessa lógica, marquei letra A. "Ordem implícita do abafamento do discurso"

  • Fui por eliminação e marquei letra A