Introdução a Alda
Dizem que ninguém mais a ama. Dizem que foi uma boa pessoa. Sua filha de doze
anos não a visita nunca e talvez raramente se lembre dela. Puseram-na numa cidade
triste de uniformes azuis e jalecos brancos, de onde não pôde mais sair. Lá, todos
gritam-lhe irritados, mal se aproxima, ou lhe batem, como se faz com sacos de areia para
treinar os músculos.
Sei que para todos ela já não é, e ninguém lhe daria uma maçã cheirosa, bem
vermelha. Mas não é verdade que alguém não a possa mais amar. Eu amo-a. Amo-a
quando a vejo por trás das grades de um palácio, onde se refugiou princesa, chegada
pelos caminhos da dor. Quando fora do reino sente o mundo de mil lanças, e selvagem
prepara-se, posta no olhar. Amo-a quando criança brinca na areia sem medo. Uns pés
descalços, uma mulher sem intenções. Cercada de mundo, às vezes sofrendo-o ainda.
CANÇADO, M. L. O sofredor do ver. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
Ao descrever uma mulher internada em um hospital psiquiátrico, o narrador compõe um quadro que expressa sua percepção