Para resolução da questão, é necessário o
conhecimento do conteúdo acerca dos Contratos em espécie, previstos no art. 481
e seguintes do Código Civil. Diante disso, passemos à análise das proposições
apresentadas.
A) INCORRETA. Nesta
alternativa, a banca exige o conhecimento do candidato sobre o contrato de
mútuo, previsto no art. 586 e seguintes do Código Civil.
Como ensina Peluso (2017), o mútuo é o contrato
pelo qual uma parte entrega a outra uma determinada quantia de dinheiro ou outras coisas fungíveis, obrigando-se esta outra a restituir igual
quantidade de coisas da mesma espécie e qualidade. As partes deste negócio
jurídico são o mutuante (quem concede o empréstimo) e o mutuário (o
beneficiário que assume a obrigação de restituir).
O contrato pode se apresentar como gratuito ou oneroso, cambiando conforme a sua finalidade. Se o mútuo não é
remunerado por juros, assume feição gratuita, pois, nesse caso, somente uma das
partes (o mutuário) se beneficia economicamente. Porém, havendo estipulação de
pagamento em prol do mutuante ou assumindo finalidade econômica (como no
exemplo do empréstimo bancário), haverá também sacrifício patrimonial ao
tomador do empréstimo, convertendo o contrato em oneroso (PELUSO, 2017, p.
620).
Havendo remuneração do mutuante, o contrato será
denominado mútuo feneratício, mútuo oneroso ou mútuo frutífero. Assim, nos
termos do art. 591 do Código Civil, destinando-se
o mútuo para fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de
redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406 (previamente
estipulada), permitida a capitalização anual.
Os juros a que alude o dispositivo são os
denominados compensatórios ou
remuneratórios, vale dizer, aqueles
recebidos pelo mutuante como compensação pela privação do capital emprestado
por um determinado período. A remuneração do credor equivale aos frutos
civis por ser privado temporariamente da posse do bem (como no exemplo dos
aluguéis, das rendas e dos dividendos). Sobre o tema, é preciso cuidado para
não confundir os juros compensatórios com os moratórios, que se imputam ao
mutuário como sanção pela mora no pagamento do débito, verdadeira pena civil
estipulada pela lei para o caso de inadimplemento das obrigações (art. 395 do
Código Civil) (PELUSO, 2017, p. 623).
No que concerne à capitalização de juros, o art.
5º da MP n. 2.170-36/2001 admitia a prática do anatocismo com periodicidade
inferior a um ano. Todavia, a parte
final do art. 591 do CC somente autorizou a capitalização anual como regra
geral para o mútuo. Aliás, a vedação à contagem de juros dos juros mensais
ou semestrais já era referida na Lei de Usura – Decreto n. 22.626/33, bem como
na Súmula nº 121 do STF (PELUSO, 2017, p. 623).
Em princípio, as instituições financeiras estão
liberadas da limitação imposta pela legislação ordinária e, particularmente,
pela norma constante do art. 591 da codificação, inclusive no que tange à
periodicidade da capitalização dos juros. Do mesmo modo, estão liberados os
financiamentos de crédito rural, comercial e industrial (PELUSO, 2017, p. 623).
Dessa maneira, a capitalização de juros é anual como regra geral, ressalvados os casos
previstos em norma especial, nos
quais são possíveis outras formas de capitalização. Entretanto, é
fundamental perceber que a adoção das cláusulas gerais da boa-fé objetiva (art.
113 do CC), de abuso do direito (art. 187 do CC) e da função social do contrato
(art. 421 do CC) permite que o magistrado possa limitar o exercício excessivo
do direito subjetivo ao crédito pelas instituições financeiras (PELUSO,
2017, p. 623).
Portanto, a alternativa está incorreta ao afirmar
que é permitida a capitalização mensal quando pactuada pelas partes.
B) INCORRETA. Nesta
alternativa, a banca exige o conhecimento do candidato sobre o mandato,
previsto no art. 653 e seguintes do Código Civil.
Nos termos do art. 653 do Código Civil, trata-se
de contrato pelo qual alguém (o mandante) transfere poderes a outrem (o
mandatário) para que este, em seu nome, pratique atos ou administre interesses.
Como se vê, o mandatário age sempre em nome do mandante, havendo um negócio
jurídico de representação, sendo a procuração o instrumento do mandato
(TARTUCE, 2019, p. 804).
O Código Civil, no art. 682, dispõe sobre as
causas de extinção do contrato de mandato, a começar por duas que se podem
dizer voluntárias: a revogação e a renúncia. A revogação é ato unilateral por meio do qual o mandante
exerce faculdade potestativa de destituir o mandatário do encargo que lhe havia
cometido. Já a renúncia, é ato
unilateral praticado pelo mandatário, cuja possibilidade se funda nos
mesmos pressupostos que fazem da revogabilidade a regra no mandato (PELUSO,
2017, p. 696).
Observe que o próprio Código Civil autoriza a cláusula de irrevogabilidade, que
afasta o direito potestativo do mandante resilir unilateralmente o contrato
(art. 683 do CC). Havendo esta cláusula e tendo sido o contrato revogado,
arcará o mandante com as perdas e danos que o caso concreto determinar
(TARTUCE, 2019, p. 821).
Entretanto, quando
a cláusula de irrevogabilidade for condição de um negócio bilateral, ou tiver
sido estipulada no exclusivo interesse do mandatário, a revogação do mandato
será ineficaz, conforme determina o art. 684 do Código Civil.
Nesse sentido, o mandato que seja condição de um
negócio jurídico bilateral não se revoga como decorrência da própria
irrevogabilidade deste negócio principal. Da mesma forma, se o mandato é
estabelecido no interesse exclusivo do mandatário, como quando contém a
cláusula in rem suam (procuração em
causa própria) ou quando já se lhe tenha dado integral quitação de suas
obrigações, igualmente haverá irrevogabilidade e ineficácia da revogação que,
apesar disso, venha a se manifestar (PELUSO, 2017, p. 696).
Portanto, note que em tais hipóteses a única
consequência da revogação do mandato é que esta será considerada ineficaz,
razão pela qual a alternativa está incorreta ao afirmar que haveria perdas e
danos.
C) INCORRETA. Nesta
alternativa, a banca exige o conhecimento do candidato sobre a corretagem,
prevista no art. 722 e seguintes do Código Civil.
O Código Civil conceitua o contrato de corretagem
ou mediação no art. 722, sendo este o negócio jurídico pelo qual uma pessoa (o
corretor ou intermediário), não ligada a outra em virtude de mandato, de
prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter
para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.
Nessa esteira, definiu-se a corretagem,
genericamente, como o contrato de
mediação em que, sem mandato ou
relação de dependência, se obriga o corretor a obter, para outrem, um ou
mais negócios, conforme as instruções
recebidas. Cuida-se de verdadeira intermediação para a celebração de
contratos outros, em que o corretor aproxima de seu cliente pessoas
interessadas na entabulação de um negócio. É, portanto, fundamentalmente um
contrato acessório (PELUSO, 2017, p. 726).
Deste modo, a alternativa está incorreta ao
afirmar que o corretor funciona como mandatário e que há cláusulas de mandato a
serem obedecidas. Como vimos, existe, na verdade, um contrato de corretagem,
que funciona como intermediação para celebração de outros contratos, e o
corretor atua conforme orientações recebidas, não havendo que se falar em
mandato neste caso.
D) CORRETA. Segundo a jurisprudência do STJ, descabe ação de terceiro
prejudicado ajuizada, direta e exclusivamente, em face da seguradora do
causador do dano, porque, no seguro de responsabilidade civil facultativo, a
obrigação da seguradora de ressarcir os danos sofridos por terceiros pressupõe
a responsabilidade civil do segurado, a qual, de regra, não poderá ser
reconhecida em demanda em que este não haja intervindo, sob pena de vulneração
do devido processo legal e da ampla defesa.
Nesta alternativa, a banca exige o conhecimento do
candidato sobre o contrato de seguro, previsto no art. 757 e seguintes do
Código Civil, bem como sobre o atual posicionamento dos tribunais acerca do
assunto.
Primeiramente, cumpre esclarecer que o seguro de responsabilidade civil é uma
importante modalidade de seguro de dano (art. 787 do CC). Por meio desse contrato, a seguradora compromete-se a cobrir os danos
causados pelo segurado a terceiro, nos termos dos arts. 186 e 187 do Código
Civil. Consigne-se que, conforme o art. 927, caput, do CC, a responsabilidade
civil está amparada tanto no ato ilícito quanto no abuso de direito, sendo
comum, quando se debate o seguro de responsabilidade civil, falar em
socialização dos riscos (TARTUCE, 2017, p. 970).
Assim, imagine a seguinte situação hipotética:
Pedro estava dirigindo seu veículo, quando foi abalroado por trás pelo carro de
José. Aparentemente, a culpa pelo acidente foi de José (ele foi o causador do
dano). Felizmente, José possui contrato de seguro de veículos com a “Seguradora
X”. Pedro (terceiro prejudicado), sabendo que José tem contrato de seguro, NÃO
pode deixar de lado o causador do dano e ajuizar ação de indenização apenas
contra a “Seguradora X”, cobrando seu prejuízo (CAVALCANTE, 2015).
Esse entendimento já era pacífico no STJ há alguns
anos e agora foi materializado na Súmula nº 529, segundo a qual “no seguro de responsabilidade civil
facultativo, não cabe o ajuizamento de ação pelo terceiro prejudicado direta e
exclusivamente em face da seguradora do apontado causador do dano”.
Observe que a súmula fala em “seguro de
responsabilidade civil facultativo” para deixar claro que está tratando daquele
seguro que os proprietários de carro fazem espontaneamente com a seguradora, e
não sobre o seguro DPVAT, que é um seguro obrigatório de danos pessoais
causados por veículos automotores de via terrestre (CAVALCANTE, 2015).
Conforme registra Cavalcante (2015), os principais
argumentos utilizados pelo STJ para chegar à conclusão exposta na súmula foram
os seguintes:
·
A obrigação da seguradora de ressarcir
os danos sofridos por terceiros pressupõe a responsabilidade civil do segurado.
Em outras palavras, a seguradora só paga o terceiro prejudicado se o segurado
teve “culpa” pelo acidente. Como regra, não se pode reconhecer a
responsabilidade civil do segurado em um processo judicial sem que ele tenha
participado, sob pena de ofensa ao devido processo legal e à ampla defesa.
·
A obrigação da seguradora está sujeita a
condição suspensiva, que não se implementa pelo simples fato de ter
ocorrido o sinistro, mas somente pela verificação da eventual obrigação civil
do segurado.
·
O seguro de responsabilidade civil
facultativo não é espécie de estipulação a favor de terceiro alheio ao negócio.
O indivíduo que faz o seguro de veículos não contrata a seguradora para pagar
uma indenização em favor de terceiros. O segurado contrata a seguradora para
que esta cubra os prejuízos que ele, segurado, for obrigado a pagar.
·
O ajuizamento direto e exclusivamente
contra a seguradora ofende os princípios do contraditório e da ampla defesa,
pois a ré (seguradora) não teria como defender-se dos fatos expostos na
inicial, especialmente no que tange à descrição e aos detalhes do sinistro
(acidente).
·
O ajuizamento direto e exclusivamente
contra a seguradora inviabiliza, também, que a seguradora possa discutir no
processo eventuais fatos extintivos da cobertura securitária, pois, a
depender das circunstâncias em que o segurado se envolveu no sinistro, poderia
a seguradora eximir-se da obrigação contratualmente assumida. É o caso, por
exemplo, do contrato de seguro que diz que se o segurado estava embriagado a
seguradora se isenta da obrigação contratual. Se o segurado não está na lide,
tais discussões não poderão ser suscitadas pela seguradora.
Nesse sentido, para o caso em análise há duas soluções
possíveis: 1) o terceiro prejudicado pode ajuizar ação de indenização contra o
segurado e este, por sua vez, poderá promover a denunciação da lide à
seguradora; 2) o terceiro prejudicado pode ajuizar a ação de indenização contra
o segurado e a seguradora, em litisconsórcio passivo.
Portanto, a alternativa está correta.
Gabarito do professor: alternativa D.
Referência bibliográfica:
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Nova
Súmula 529 do STJ comentada. Disponível no site Dizer o Direito, em 19 de maio
de 2015.
PELUSO, Cezar. Editor. et al. Código
Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 11. Ed. São Paulo: Manole, 2017.
TARTUCE, Flávio. Direito civil: teoria
geral dos contratos e contratos em espécie. 14. Ed. Rio de Janeiro: Forense,
2019, v. 3.
Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível no site do
Planalto.