SóProvas


ID
952744
Banca
FCC
Órgão
DPE-RS
Ano
2013
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Atenção: As questões de números 1 a 8 referem-se ao texto seguinte.  


Vista cansada


      Acho que foi Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Essa ideia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que Hemingway tenha acabado como acabou. Fugiu enquanto pôde do desespero que o roía − e daquele tiro brutal que acabou dando em si mesmo.
      Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.
      Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou trinta e dois anos a fio pelo mesmo hall do prédio de seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer. Como era ele? Sua cara? Sua voz? Não fazia a mínima ideia. Em trinta e dois anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer.
      O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos. Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz dever pela primeira vez o que, de tão visto, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia a dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.


(Otto Lara Resende, Bom dia para nascer)



A frase do texto cujo sentido se mantém numa nova e correta redação é:

Alternativas
Comentários
  • Assertiva A incorreta. Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver (Oração subordinada adverbial condicional). Comigo morre um certo modo de ver, ainda que eu venha a morrer (Oração subordinada adverbial concessiva).

    Assertiva B incorreta. De tanto ver, você não vê (Oração subordinada adverbial proporcional). Você não vê, apesar de tanto ver (Oração subordinada adverbial concessiva).

    Assertiva C incorreta. Em trinta e dois anos, nunca o viu (sentido de negação). Nunca o viu, por força de ter-se passado trinta e dois anos (sentido causal).

    Assertiva D incorreta. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem (oração coordenada sindética aditiva). Mesmo que lhes suje, o hábito baixa a voltagem dos olhos (Oração subordinada adverbial concessiva).

    Assertiva E correta. Uma criança vê o que o adulto não vê. Não vê o adulto que vê a criança.

    Conhecimento + dedicação + equilíbrio = sucesso.

  • Uma proposta de correção seria:

    Você não vê, porque tanto ver.
  • Alguém pode esclarecer um pouco mais a Letra B? Obrigado. Favor mandar msg inbox
  • Boa noite,

    Para complementar, apenas discordo do colega Edson na letra "b", pois "de tanto ver, você não vê" tem sentido de causa e consequência; não proporcionalidade.


    Eu vejo tanto (causa) que acabo não vendo (consequência de tanto ver)

    oração coordenada assindética


    Abraço forte.

  • Exatamente isso:


    na alternativa "B":

    na primeira frase temos ------> Causa vs Consequência

    na segunda frase temos ------> temos a relação de Concessão (oração subordinada concessiva), ou seja, há uma quebra de lógica!!!


    Não esquecer isso ---> concessão = quebra de lógica


    Outras conjunções concessivas para o caso: "embora tanto veja, você não vê."


    Bons estudos!