SóProvas


ID
1263616
Banca
FUNCAB
Órgão
PRF
Ano
2014
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Texto 1

Inauguração da Avenida

      [...]
      Já lá se vão cinco dias. E ainda não houve aclamações, ainda não houve delírio. O choque foi rude demais. Acalma ainda não renasceu.
      Mas o que há de mais interessante na vida dessa mó de povo que se está comprimindo e revoluteando na Avenida, entre a Prainha e o Boqueirão, é o tom das conversas, que o ouvido de um observador apanha aqui e ali, neste ou naquele grupo.
      Não falo das conversas da gente culta, dos “doutores” que se julgam doutos.
Falo das conversas do povo - do povo rude, que contempla e critica a arquitetura dos prédios: “Não gosto deste... Gosto mais daquele... Este é mais rico... Aquele tem mais arte... Este é pesado... Aquele é mais elegante...”.
      Ainda nesta sexta-feira, à noite, entremeti-me num grupo e fiquei saboreando uma dessas discussões. Os conversadores, à luz rebrilhante do gás e da eletricidade, iam apontando os prédios: e - cousa consoladora - eu, que acompanhava com os ouvidos e com os olhos a discussão, nem uma só vez deixei de concordar com a opinião do grupo. Com um instintivo bom gosto subitamente nascido, como por um desses milagres a que os teólogos dão o nome de “mistérios da Graça revelada” - aquela simples e rude gente, que nunca vira palácios, que nunca recebera a noção mais rudimentar da arte da arquitetura, estava ali discernindo entre o bom e o mau, e discernindo com clarividência e precisão, separando o trigo do joio, e distinguindo do vidro ordinário o diamante puro.
      É que o nosso povo - nascido e criado neste fecundo clima de calor e umidade, que tanto beneficia as plantas como os homens - tem uma inteligência nativa, exuberante e pronta, que é feita de sobressaltos e relâmpagos, e que apanha e fixa na confusão as ideias, como a placa sensibilizada de uma máquina fotográfica apanha e fixa, ao clarão instantâneo de uma faísca de luz oxídrica, todos os objetos mergulhados na penumbra de uma sala...
      E, pela Avenida em fora, acotovelando outros grupos, fui pensando na revolução moral e intelectual que se vai operar na população, em virtude da reforma material da cidade.
      A melhor educação é a que entra pelos olhos. Bastou que, deste solo coberto de baiucas e taperas, surgissem alguns palácios, para que imediatamente nas almas mais incultas brotasse de súbito a fina flor do bom gosto: olhos, que só haviam contemplado até então betesgas, compreenderam logo o que é a arquitetura. Que não será quando da velha cidade colonial, estupidamente conservada até agora como um pesadelo do passado, apenas restar a lembrança?
      [...]
      E quando cheguei ao Boqueirão do Passeio, voltei-me, e contemplei mais uma vez a Avenida, em toda sua gloriosa e luminosa extensão. [...]

Gazeta de Notícias - 19 nov.1905. Bilac, Olavo. Vossa Insolência: crônicas. São Paulo: Companhia de Letras, 1996, p. 264-267.

Vocabulário:
baiuca: local de última categoria, malfrequentado.
betesga: rua estreita, sem saída,
: do latim “mole” , multidão; grande quantidade,
revolutear: agitar-se em várias direções,
tapera: lugar malconservado e de mau aspecto

Texto 2

O ciclista


      Curvado no guidão lá vai ele numa chispa. Na esquina dá com o sinal vermelho e não se perturba - levanta voo bem na cara do guarda crucificado. No labirinto urbano persegue a morte com o trim-trim da campainha: entrega sem derreter sorvete a domicílio.
      É a sua lâmpada de Aladino a bicicleta e, ao sentar-se no selim, liberta o gênio acorrentado ao pedal. Indefeso homem, frágil máquina, arremete impávido colosso, desvia de fininho o poste e o caminhão; o ciclista por muito favor derrubou o boné.
      Atropela gentilmente e, vespa furiosa que morde, ei-lo defunto ao perder o ferrão. Guerreiros inimigos trituram com chio de pneus o seu diáfano esqueleto. Se não se estrebucha ali mesmo, bate o pó da roupa e - uma perna mais curta - foge por entre nuvens, a bicicleta no ombro.
      Opõe o peito magro ao para-choque do ônibus. Salta a poça d’água no asfalto. Num só corpo, touro e toureiro, golpeia ferido o ar nos cornos do guidão. Ao fim do dia, José guarda no canto da casa o pássaro de viagem. Enfrenta o sono trim-trim a pé e, na primeira esquina, avança pelo céu na contramão, trim-trim.

Trevisan, Dalton. In: Bosi, Alfredo (Org.). O conto brasileiro contemporâneo. 14" Ed. São Paulo: Cultrix, 1997. p. 189. 



A imagem finai do conto, quando a personagem “avança pelo céu na contramão”, significa que:

Alternativas
Comentários
  • Letra D)

    Acredito que essa resposta seja a correta, porque ele, por vontade própria, foi na "contramão", usurfruindo de uma liberdade que não possui na realidade do trabalho.

  • Letra D

    Pois no sonho ele assume uma liberdade que não tem no mundo do trabalho.

  • Não até que enfim acertei uma, esta banca trás questões de interpretação muito confusa..


  • acertei! que felicidade!!! LETRA "D"

  • COMPREENÇÃO DO TEXTO = O TEXTO FALA O QUE SE PERGUNTA


    INTERPRETAÇÃO DE TEXTO = O QUE ESTÁ IMPLÍCITO NO TEXTO ==> É A CAPACIDADE DO CANDIDATO ADIVINHAR O QUE O FDP ACHOU OU DEIXOU DE ACHAR DO TEXTO, SE CASAR COM O SEU ... BEM, SE NÃO ... FÚ...
  • Confusa.

  • Foda-se, desisto dessa FUNCAB.

  • Gente a banca quer cabeça de Polícia, "olhos de águia" para percepção...

     

     a) a ideia de liberdade da dor cotidiana é atingida, quando se abre mão de sonhos e se começa a viver a realidade imposta pelo trabalho. / Nada a ver, chamando o cara de frustrado, o texto não fala se o cara abriu mão de sonhos ou não.

     

     b)no sonho, o herói ciclista, assim como no cotidiano de trabalho, pode avançarem todas as direções. / Lógico que não pode avançar em todas as direções, ta aí  o CTB pra dizer isso.

     

     c)assim como no sonho, o ciclista, lutando na arena contra a fera dos tempos modernos - o trânsito, consegue vencer e avançar livre./ Ele não estava lutando no sonho, só saiu livre.

     

     d)o sonho, em contraposição à realidade do mundo do trabalho, assume dimensão libertária./ Essa faz um pouco de sentido...

    Enfrenta o sono trim-trim a pé e, na primeira esquina, avança pelo céu na contramão, trim-trim. 

     

     e)a morte é a solução para as injustiças do cotidiano, só através dela, avançando para o céu, o ciclista consegue transgredir as normas./ Sem depressão, a pessoa sonhando que morreu pra poder fazer coisa errada, nada a ver...

     

    Bons estudos!

     

     

  • "FAZ SENTIDO" onde??

  • O engraçado é ver gente que acertou na cagada defendendo esse LIXO.

  • "Na esquina dá com o sinal vermelho e não se perturba - levanta voo bem na cara do guarda crucificado..."

    Letra B menciona: "no sonho, o herói ciclista, assim como no cotidiano de trabalho, pode avançarem (o correto seria "avançar") todas as direções."

    Onde está escrito no texto que o ciclista em questão é um exemplo de cidadão que respeita todas as regras de trânsito? Sendo isso não condizente com o texto, a letra b estaria válida da mesma forma que a letra d.

  • Nosso querido ciclista enfrenta as agruras do dia a dia. O texto descreve como o seu trabalho é duro e perigoso.

    Só que no sonho ele pode ir como quiser =)