SóProvas


ID
1506811
Banca
FCC
Órgão
TRT - 15ª Região (SP)
Ano
2015
Provas
Disciplina
Português
Assuntos

Eu pertenço a uma família de profetas après coup, post factum*, depois do gato morto, ou como melhor nome tenha em holandês. Por isso digo, e juro se necessário for, que toda a história desta lei de 13 de maio estava por mim prevista, tanto que na segunda-feira, antes mesmo dos debates, tratei de alforriar um molecote que tinha, pessoa de seus dezoito anos, mais ou menos. Alforriá-lo era nada; entendi que, perdido por mil, perdido por mil e quinhentos, e dei um jantar.

Neste jantar, a que meus amigos deram o nome de banquete, em falta de outro melhor, reuni umas cinco pessoas, conquanto as notícias dissessem trinta e três (anos de Cristo), no intuito de lhe dar um aspecto simbólico.

No golpe do meio (coup du milieu, mas eu prefiro falar a minha língua), levantei-me eu com a taça de champanha e declarei que acompanhando as ideias pregadas por Cristo, há dezoito séculos, restituía a liberdade ao meu escravo Pancrácio; que entendia que a nação inteira devia acompanhar as mesmas ideias e imitar o meu exemplo; finalmente, que a liberdade era um dom de Deus, que os homens não podiam roubar sem pecado.

Pancrácio, que estava à espreita, entrou na sala, como um furacão, e veio abraçar-me os pés. Um dos meus amigos (creio que é ainda meu sobrinho) pegou de outra taça, e pediu à ilustre assembleia que correspondesse ao ato que acabava de publicar, brindando ao primeiro dos cariocas. Ouvi cabisbaixo; fiz outro discurso agradecendo, e entreguei a carta ao molecote. Todos os lenços comovidos apanharam as lágrimas de admiração. Caí na cadeira e não vi mais nada. De noite, recebi muitos cartões. Creio que estão pintando o meu retrato, e suponho que a óleo.

No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza:
-Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que...
-Oh! meu senhô! fico.
-...Um ordenado pequeno, mas que há de crescer. Tudo cresce neste mundo; tu cresceste imensamente. Quando nasceste, eras um pirralho deste tamanho; hoje estás mais alto que eu. Deixa ver; olha, és mais alto quatro dedos...
-Artura não qué dizê nada, não, senhô...
-Pequeno ordenado, repito, uns seis mil réis; mas é de grão em grão que a galinha enche o seu papo. Tu vales muito mais que uma galinha. Justamente. Pois seis mil réis. No fim de um ano, se andares bem, conta com oito. Oito ou sete.

Pancrácio aceitou tudo; aceitou até um peteleco que lhe dei no dia seguinte, por me não escovar bem as botas; efeitos da liberdade. Mas eu expliquei-lhe que o peteleco, sendo um impulso natural, não podia anular o direito civil adquirido por um título que lhe dei. Ele continuava livre, eu de mau humor; eram dois estados naturais, quase divinos.

Tudo compreendeu o meu bom Pancrácio; daí pra cá, tenho-lhe despedido alguns pontapés, um ou outro puxão de orelhas, e chamo-lhe besta quando lhe não chamo filho do diabo; cousas todas que ele recebe humildemente, e (Deus me perdoe!) creio que até alegre. [...]

*Literalmente, “depois do golpe", “depois do fato". (Adaptado de: ASSIS, Machado de. "Bons dias!", Gazeta de Notícias, 19 de maio de 1888)

Com recurso à subordinação das orações, o 5 o e o 6 o parágrafos estão reescritos corretamente em:

Alternativas
Comentários
  • disse-lhe == passado



    acho que para a letra C ficar correta, o período após dois pontos deveria vir entre aspas



  • Alguém pode me explicar por quê a letra C está errada? Acho que a falta das aspas não justifica, pois a frase está diferente da do texto...

  • gabarito b

    mas... que era livre? e não é mais não? o texto está no presente: tu és livre! alguém poderia explicar?

  • Pedro Teixeira, um erro que encontrei na letra C foi a falta de vírgula depois de "conhecida", principalmente porque tem uma vírgula antes de "".

    Acredito que o ponto e vírgula depois de "livre" também não está correto, mas aí não tenho certeza. Se alguém puder, inclusive, confirmar e explicar os motivos. rs.

  • Acho que o erro da "c" está na conjunção  "ao passo que" dando a ideia de proporção. Alterando o sentido original do texto 

    Pedro Teixeira e Roberta Moura

  • Pessoal, eu também havia marcado letra C, mas acredito que a banca considerou como errada pelo fato da expressão "…com rara franqueza:  és livre…", pois não se inicia frase com letra maiúscula imediatamente após dois-pontos.

  • Tinha que ter um professor pra nós ajudar nessa questão.... 

  • Reesçrevendo: pra nos ajudar nessa questão....

  • Dois pontos não encerram frase. As únicas pontuações capazes de encerrar uma frase no português são ponto final, reticências, exclamação e interrogação. Portanto, depois de dois pontos, o correto é usar letra minúscula.

    Exemplo:

    - Pensei na seguinte maneira de resolver essa situação: comprar um carro novo.

    Há alguma exceção? Sim! Quando a informação depois dos pontos for uma citação entre aspas, esta começará com letra maiúscula.

    No início de citação:

    - Deputado acusa: “O governo não governa.”

    - Já dizia Machado de Assis: “Ao vencedor, as batatas.”

    Se depois dos dois pontos vier um mero desdobramento da frase (e não citação textual) ou uma enumeração, a palavra começará com minúscula:

    - Comerciantes alertam: faltarão brinquedos no Natal.

    - A Prefeitura definiu as prioridades do orçamento: metrô, pavimentação e obras na periferia.

    (Fonte: Manual de Redação O Estado de São Paulo)

  • Na letra B nao deveria ser TERIA casa amiga?

    No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe, com rara franqueza, que era livre e podia ir para onde quisesse; que aqui, no entanto, TERIA casa amiga, já conhecida, além de ter mais um ordenado, um ordenado que...

  • Pessoal, a frase da letra C não é subordinada, como a questão pede. É uma coordenada assindética, esse é o principal erro.

  • A conjunção "ao passo que" não cabe na ideia da construção da frase porque tem sentido de proporção. É uma questão de semântica. A conjunção ideal é a adversativa. Ele quer dizer que.."Você tá livre, (porém/no entanto/entretanto/todavia/contudo..) se quiser ficar, tem casa, ordenado e tal.."  :)

  • "A conjunção ao passo que, tem o mesmo significado de "enquanto" ou "durante o tempo em que". É classificada como uma locução conjuntiva subordinativa proporcional. A função dessa conjunção é expressar a proporcionalidade dos acontecimentos presentes na oração subordinada em relação aos acontecimentos da oração principal.

    Exemplos:

    "Uns ganham muito e fazem pouco, ao passo que outros trabalham muito e recebem o mínimo".

    "A estudante trabalhou muito, ao passo que seus colegas não fizeram quase nada".

    "Ao passo que faço todos os trabalhos de casa, sinto um aumento de rendimento escolar"."

  • Aponto três erros na alternativa "C" para quem não conseguiu enxergar:
    C) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: Tu és livre; por isso, podes ir para onde quiseres, ao passo que aqui tens casa amiga (,) já conhecida (falta uma vírgula aqui) e tens mais um ordenado, um ordenado que.
    1. O primeiro erro é que quando se passa do discurso direto para o discurso indireto, os verbos no presente vão para o passado. (recurso à subordinação uma vez que a conjunção "que" introduziria uma oração subordinada. Exemplo: disse-lhe com rara franqueza que era livre... No caso, sequer utilizou-se do recurso da subordinação, uma vez que não passou-se para o discurso indireto.
    2. A expressão "ao passo que" dá sentido de proporção, e não de oposição, conforme a relação semântica entre as orações que separa.
    3. Falta uma vírgula após o termo intercalado "já conhecida". Ou se usa ambas as vírgulas (antes e depois do termo intercalado curto) ou não se usa nenhuma.
  • 1ª situação: Ele é livre, ou seja isso é uma certeza. Logo as letras D e E são eliminadas.

    2ª situação: é livre  e pode ir pra onde quiser, porém, aqui tens casa...percebe a ideia de oposição.

    Na alternativa A, além de que, traz ideia de adição.

    O erro da letra C está na concordância. Você é livre e pode ir pra onde quiser e não quiseres.

    Logo a alternativa é a letra B. Vejamos:

    Protásio era livre, ou seja, isso é certo.

    no entanto, tinha... ideia de oposição.

    era, podia e quisesse, os verbos concordam entre si.


  • A ) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza, ( deveria ser dois pontos ou travessão ) que és livre, podes ir para onde quiseres, além de que aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que..


    C ) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: Tu és livre; por isso, podes ir para onde quiseres, ao passo que aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que...


    quiser


    D ) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe, com rara franqueza, que seria livre, poderia ir para onde queria, mas que aqui teria casa amiga, já conhecida, além de ter mais um ordenado, um ordenado que...


    quisesse


    E ) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza, que fosse livre e pudesse ir para onde quisesse; aqui, no entanto, teria casa amiga, já conhecida, com que teria mais um ordenado, um ordenado que...

    Poderia

  • Podemos dizer que esta questão exige o conhecimento da transformação de discurso direto para indireto?

  • Eu analisei da seguinte forma: no texto diz: No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe com rara franqueza: -Tu és livre, podes ir para onde quiseres. Aqui tens casa amiga, já conhecida e tens mais um ordenado, um ordenado que...
    ( isso ele falando diretamente , pessoalmente com o Pancracio) ( primeira pessoa)

    Agora o autor contando para " alguem" ( nos leitores como havia dado a noticia da alforia ao Pancracio: LETRA B (terceira pessoa)

    No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe, com rara franqueza, que era livre e podia ir para onde quisesse; que aqui, no entanto, tinha casa amiga, já conhecida, além de ter mais um ordenado, um ordenado que...

    Eu tenho muita dificuldade para explicar mais espero ter ajudado.


  • Felipe Silva, pertinentes, simples e esclarecedoras as suas considerações!!! Parabéns!!!

  • Com relação à alternativa "c", alguns colegas estão defendendo o erro na conjugação do verbo querer.

    Ocorre que na assertiva, quem conjuga tal verbo não é "tu"? 

    Neste caso, o verbo deveria estar conjugado na 2ª pessoa do singular, portanto, a escrita na assertiva estaria correta. 
    Alguém ajuda?
    Grato.
  • "podia ir?" o certo não seria "poderia ir?" 

  • Misericórdia.....a explicação desse professor é PÉSSIMAAAAAA.

  • A questão pede para passar do discurso direto parao indireto.

    ✻ que / se

    Detalhes sobre o discurso indireto:

    ✦ Há subjetividade, pois o narrador é responsável pela enunciação.

    ✦ Apresenta verbo dicendi (disse, argumentou, falou)

    ✦ É feito do ponto de vista do personagem em terceira pessoa.

    ✦ O narrador pode tá em primeira ou em terceira pessoa.

    ✦ Apresenta conjunção integrante (QUE / SE)

    ✦ Todas as frases são declarativas (ponto final)

    ✦ O tempo é passado.

    ★ b) No dia seguinte, chamei o Pancrácio e disse-lhe, com rara franqueza, que era livre e podia ir para onde quisesse; que aqui, no entanto, tinha casa amiga, já conhecida, além de ter mais um ordenado, um ordenado que...